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O Manual do Serial Killer


Por Henrique Saibro


O seu interesse nesse pequeno artigo não é novidade para mim e nem para o Canal. Aliás, não é novidade para a antropologia em geral. O fascínio em assassinatos em série vem de muito tempo. As pessoas, sempre quando possível, mostram-se sedentas por detalhes mórbidos e minúcias macabras. E se a notícia vier acompanhada de imagens? Bom, aí temos um banquete sádico-popular.

Séculos atrás tínhamos jornais ilustrados quando os veículos de comunicação eram quase que monopolizados pela impressão massificada. Leitores se aglomeravam para adquirir, rapidamente, o seu exemplar e poder deleitar-se na narrativa do mais novo assassinato brutal da cidade. Assassinos mais conhecidos chegarem a se tornar anti-heróis e fomentaram o turismo da cidade escolhida para suas tormentas (como Londres de Jack, o Estripador). Hoje, com uma tecnologia mais avançada, temos canais de notícias 24 horas por dia para suprir a mesma necessidade: o encanto por crimes horrendos e verídicos.

Isso quer dizer, então, que todos nós somos um serial killer em potencial? Certamente (e felizmente) não. SCHECHTER, pesquisador da mente de assassinos com mais de 30 anos de experiência, diz que há um mundo de diferenças entre o pensamento e a ação. “Na verdade, uma das características distintivas dos serial killers é precisamente a disposição de cruzar essa linha e transformar suas fantasias distorcidas em apavorante realidade” (2013, p. 11).

Mas, afinal, desde quando existem serial killers? Desde muito tempo. Passa-se a impressão de que é um fenômeno recente, mas não é – talvez porque o termo serial killer nunca foi utilizado durante a maior parte do século XX. Mas assassinatos em série já aconteciam, e muito, pelo Ocidente. Por mais que a autoria não seja unânime, costuma-se dizer que foi Robert Ressler, antigo agente do FBI, em uma conferência britânica, quem teria dado a alcunha de serial killer – e que passou a utilizá-la em todas as suas palestras (SCHECHTER, op. cit, p. 14).

E quais são os pressupostos para que um homicida seja considerado um serial killer? Por mais que pareça simples, a definição está longe de ser unanimidade. Segundo o FBI, seriam “três ou mais eventos separados em três ou mais locais distintos com um período de ‘calmaria’ entre os homicídios” (SCHECHTER, op.cit. p. 16).

Assim, no quesito quantidade, teriam de ocorrer ao menos três homicídios; quanto ao lugar, os assassinatos deveriam ser cometidos em lugares distintos; e em relação ao tempo, o período de calmaria representaria um intervalo entre os crimes que varia de algumas horas a vários anos.

Se você perceber, as duas últimas modalidades (lugar e tempo) servem para diferenciar o assassinato em série do assassinato em massa. O famoso caso do massacre de Realengo, em que Wellington de Oliveira matou a tiros doze crianças, não é um caso de assassinato em série, mas sim em massa. Wellington, portanto, por mais que tenha feito uma chacina, não foi um serial killer.

Todavia, a definição do FBI vem sofrendo diversas críticas, por ser (a) ampla demais, já que se pode aplicar a tipos homicidas que não são, bem dizer, serial killers, como, por exemplo, matadores de aluguel; b) estreita demais, na medida em que delimita o cometimento de delitos “em três ou mais locais distintos”. Ocorre que alguns serial killers não variam os seus ambientes criminosos. É o caso, por exemplo, do “famoso” John Wayne Gacy, “que transformou o porão de sua casa numa câmara privada de torturas” (SCHECHTER, op.cit. p. 16); c) omissa quanto ao ponto comum do caráter psicológico dos assassinos em série: um forte componente de sexualidade depravada.

Sim, isso mesmo. Especialistas definem serial killers como homicidas “depravados ultraviolentos, que obtêm prazer ao submeter suas vítimas a dores extremas e que continuarão a cometer suas atrocidades até que sejam detidos” (SCHECHTER, op. cit. p. 17). Todas essas falhas conceituas são corrigidas pela formulada pelo National Institutes of Justice (NIJ) dos EUA:

Uma série de dois ou mais assassinatos cometidos como eventos separados, geralmente, mas nem sempre, por um criminoso atuando sozinho. Os crimes podem ocorrer durante um período de tempo que varia de horas a anos. Muitas vezes o motivo é o psicológico e o comportamento do criminoso e as provas materiais observadas nas cenas dos crimes refletem nuanças sádicas e sexuais.

Essas são as principais conceituações em voga para o termo serial killer. Vamos ficando por aqui. Nos próximos encontros iremos destrinchar conceitos e histórias verídicas sobre o tema. Estamos antecipando o Halloween. Até mais!


REFERÊNCIAS

SCHECHTER, Harold. Serial Killers: anatomia do mal. Rio de Janeiro: DarkSide Books, 2013.

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Henrique Saibro

Advogado. Mestrando em Ciências Criminais. Especialista em Ciências Penais. Especialista em Compliance.

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