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A atuação do advogado na defesa de réu foragido ou não encontrado

A atuação do advogado na defesa de réu foragido ou não encontrado

Olá amigos, espero que estejam bem.

Esta semana resolvi trazer um tema extremamente relevante para os que militam na área criminal. Trata-se da compreensão acerca do comportamento da defesa no caso em que o réu encontra-se foragido ou não tenha sido localizado.

Primeiro lugar, insta salientar que não existe, no ordenamento jurídico brasileiro, o que alguns denominam de “direito à fuga”. O STJ, por exemplo, ao analisar pedido de relaxamento de prisão preventiva formulado no HC 337.183,

O foragido que contesta a legalidade da ordem de prisão preventiva não tem direito à fuga. “Se há um mandado de prisão expedido por uma autoridade judiciária competente, não há falar em direito à fuga, pois quem decide se uma decisão judicial é legal ou não é o próprio Poder Judiciário”, relatou o ministro Rogerio Schietti Cruz. Nessa esteira, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou Habeas Corpus a um homem acusado de homicídio que teve a prisão preventiva decretada e está foragido desde a época dos crimes

Entendemos que não existe direito à fuga, posto que a cada direito corresponde um dever. Assim, se o indivíduo possuir o direito à fuga, o Estado teria a obrigação de lhe propiciar os meios para atingir seu intento, o que é impensável. 

De outra sorte, aquele que foge de estabelecimento prisional, salvo em caso de risco de morte comprovado, comete falta grave.

E o que acontece se o réu responder a processo penal e, contudo, não for localizado?

Essa pergunta o próprio CPP esclarece:

Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.

Assim, se o réu devidamente citado não comparecer, será declarado revel e, caso não constitua advogado, o processo ficará suspenso, bem como o prazo prescricional (pelo tempo da pena máxima em abstrato atribuída ao caso concreto).

Dito de outra forma, o acusado foragido poderá ser submetido a processo penal perante o juiz singular, que decretará sua “revelia” e nomeará defensor público, caso não tenha defensor constituído, e tenha sido citado ou intimado pessoalmente, nos termos do artigo 367 do CPP:

Art. 367. O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo.

De outra sorte, se nomear advogado, o processo voltará a correr, devendo ser oferecido a resposta a acusação.

Nos casos envolvendo o rito do Tribunal do Júri, seria possível também o julgamento do réu foragido, desde que regularmente intimado pessoalmente, conforme a letra do artigo do CPP, que:

Art. 457. O julgamento não será adiado pelo não comparecimento do acusado solto, do assistente ou do advogado do querelante, que tiver sido regularmente intimado.

E se o réu não comparece à audiência de instrução, deixando de ser interrogado?

Nesse caso, o STJ entende que, por o interrogatório ser o ato processual por meio do qual o réu tem a faculdade de expor a sua versão dos fatos narrados na denúncia, nos termos do art. 185 e seguintes do CPP, não haveria violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, pela não realização do referido ato processual, se o próprio réu – ciente da acusação – empreende fuga do distrito da culpa.

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. NULIDADES. AUSÊNCIA DE INTERROGATÓRIO. RÉU FORAGIDO. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL. ADVOGADO CONSTITUÍDO NOS AUTOS. DIÁRIO DE JUSTIÇA. PRISÃO PREVENTIVA. ART. 312 DO CPP. PERICULUM LIBERTATIS. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. O interrogatório é o ato processual por meio do qual o réu tem a faculdade de expor a sua versão dos fatos narrados na denúncia, nos termos do art. 185 e seguintes do CPP. Não há violação do contraditório e da ampla defesa, pela não realização do referido ato processual, se o próprio réu – ciente da acusação – empreende fuga do distrito da culpa; estava foragido na data designada para o interrogatório e só veio a alegar a ocorrência de nulidade nas alegações finais, logo após a sua captura, quando já encerrada a instrução criminal e já apresentadas as alegações finais do Ministério Público estadual. 2. Como decorrência do disposto no art. 565 do Código de Processo Penal e tendo em vista a proibição de comportamento contraditório da parte (venire contra factum proprium), não se reconhece nulidade a que deu causa a própria parte. Precedentes. 3. Apenas o defensor nomeado tem a prerrogativa de intimação pessoal, enquanto os advogados constituídos, como na hipótese, devem ser intimados via imprensa oficial. 4. Para ser compatível com o Estado Democrático de Direito – o qual se ocupa de proteger tanto a liberdade quanto a segurança e a paz públicas – e com a presunção de não culpabilidade, é necessário que a decretação e a manutenção da prisão cautelar se revistam de caráter excepcional e provisório. A par disso, a decisão judicial deve ser suficientemente motivada, mediante análise da concreta necessidade da cautela, nos termos do art. 282, I e II, c/c o art. 312, todos do Código de Processo Penal. 5. (…). (STJ – RHC: 98263 GO 2018/0115200-9, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 07/08/2018, T6 – SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/08/2018).

Vale frisar que o advogado deverá comparecer à audiência, ainda que seu cliente esteja foragido ou em local não conhecido, podendo participar da oitiva das vítimas, testemunhas, peritos e requerer diligências, além de apresentar alegações finais. Tal trabalho é deveras complexo, tendo em vista que a ausência de contato do defensor com o acusado dificulta a elaboração das teses defensivas. Em todo o caso, o causídico deverá estar atento às provas produzidas nos autos. Deve-se lembrar que, embora não se fale de direito à fuga, o réu terá sempre o direito à voz.

O ilustre Ministro do STJ afirmou que não há direito a fuga “neste caso”.

Eu, porém, diria que NÃO EXISTE “DIREITO À FUGA” em caso nenhum.

Se alguém tivesse o “direito de fugir”, o Estado seria obrigado a lhe propiciar os meios de fuga, pois, a cada direito corresponde um dever.


REFERÊNCIAS

JÚNIOR, Leonardo de Tajaribe R.H. Jr. O réu foragido pode ser levado a júri? Disponível aqui. Acesso em: 02 dez. 2019.

Réu foragido que contesta ordem de prisão não tem direito à fuga. Disponível aqui. Acesso em: 02 dez. 2019.


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Jairo Lima

Advogado Criminalista e Membro do Núcleo de Advocacia Criminal. WhatsApp: (89) 9.9474 4848.

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