A correição parcial e seu cabimento no processo penal
A correição parcial e seu cabimento no processo penal
Olá, amigos! Espero que estejam bem.
Esta semana iremos falar de um mecanismo pouco conhecido pelos operadores do direito. Trata-se da correição parcial.
Inúmeras decisões judiciais – sobretudo interlocutórias – não elencadas nos dispositivos do CPP e que, sem embargo, tem o potencial de prejudicar direitos, instrumentais e materiais, das partes.
É justamente neste cenário que se inclui a possibilidade de manejo da correição parcial como instrumento adequado de impugnação dos erros de procedimento (error in procedendo) cometidos pelo magistrado de primeiro grau.
Esse instrumento está previsto no art. 6º, I, da Lei 5.010/66 (Organização da Justiça Federal).
Art. 6º Ao Conselho da Justiça Federal compete:
I – Conhecer de correição parcial requerida pela parte ou pela Procuradoria da República, no prazo de cinco dias, contra ato ou despacho do Juiz de que não caiba recurso, ou comissão que importe êrro de ofício ou abuso de poder.
Além disso, a correição parcial também é prevista no art. 32, I, da Lei 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) e na legislação de cada Estado, para os casos de competência da justiça comum.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo possui a seguinte previsão, em seu regimento interno:
Art. 830. Tem lugar a correição parcial para a emenda de erro, ou abusos que importarem a inversão tumultuária dos atos e fórmulas da ordem legal do processo civil ou criminal, quando para o caso não houver recurso específico.
Parágrafo único. Entre outros casos, comporta a correição parcial:
I – a decisão que nega seguimento a agravo, ainda que intempestivo, ressalvado o caso de deserção;
II – a decisão de saneamento do processo, sem a prévia apreciação de pedido formal de sua extinção ou de julgamento antecipado da lide.
No tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, a correição parcial é prevista nos artigos 581 e seguintes do Regimento Interno. Vejamos:
DA CORREIÇÃO PARCIAL
Art. 581. Tem lugar a correição parcial, para a emenda de erro ou abusos que importarem na inversão tumultuária dos atos e fórmulas da ordem legal do processo civil ou criminal, quando, para o caso, não houver recurso específico.
Art. 582. A correição parcial será julgada pelas câmaras isoladas, cíveis ou criminais, de acordo com a matéria.
Art. 583. O relator poderá suspender liminarmente a decisão que deu motivo ao pedido correcional, se relevante o fundamento em que se arrima, quando do ato impugnado, se não suspenso, puder resultar a ineficácia da medida.
Inicialmente, cumpre ressaltar que a correição parcial constitui expediente de caráter administrativo, destinado a corrigir ato judicial que, por error in procedendo, venha causar inversão tumultuaria do processo.
Nessa esteira, não se trata propriamente de recurso, vez que não previsto na legislação processual penal pátria, mas de medida administrativa apta a corrigir erros que importarem na inversão tumultuária dos atos e fórmulas da ordem legal do processo. Só é cabível quando não há recurso específico para o ato impugnado.
A correição parcial tem lugar quando ocorrer inversão tumultuária da ordem processual. O termo é ambíguo e impreciso, de modo que é necessário compreender quais são os atos judiciais capazes de gerar uma inversão tumultuária dos atos processuais.
A título exemplificativo podemos citar que há inversão tumultuária da ordem processual no ato do juiz que abre prazo para alegações finais do MP antes da oitiva de alguma testemunha, ou do réu, ou, em casos em que o juiz se não se pronuncia sobre pedidos de diligência, e, ato contínuo, impulsiona a marcha processual de modo que a não manifestação da parte prejudicada poderá ser entendida como preclusão.
Em suma, sempre que o juiz designar ato processual sem decidir questões imprescindíveis anteriores, será o caso de correição parcial, salvo, claro, se houver recurso cabível. Em diversos outros casos também são admitidos a correição parcial, a exemplo da decisão do juiz que não aprecia o pedido de arquivamento do feito formulado pelo MP e remete os autos para polícia civil realizar novas diligências, ou a inversão da ordem de oitiva de testemunhas, entre outros.
A correição parcial não pode ser utilizada para impugnar atos praticados pelas partes, serventuários da justiça ou dos tribunais, mas apenas à correção de atos tumultuários praticados por juízes singulares, sejam eles comissivos ou omissivos, como bem leciona Renato Brasileiro de Lima.
Vale lembrar que os Tribunais Pátrios tem reconhecido a possibilidade de manejo de habeas-corpus, pela defesa, em substituição à correição parcial, em homenagem ao princípio da fungibilidade.
HABEAS CORPUS. JÚRI. MATÉRIA DE CORREIÇÃO PARCIAL. FUNGIBILIDADE. Se o caso trata de evidente inversão tumultuária de atos processuais, não havendo erro grosseiro e tendo sido a ação impetrada no prazo previsto no art. 195, § 2º, do COJE, aplicável o princípio da fungibilidade para conhecer do writ como Correição Parcial. MÉRITO. CONCESSÃO DO PRAZO DO ART. 422 DO CPP EM SIMULTANEIDADE COM DESIGNAÇÃO DA DATA DO JULGAMENTO. AUSÊNCIA DE TEMPO HÁBIL PARA AS DILIGÊNCIAS PRETENDIDAS PELA DEFESA. CASSAÇÃO. INVERSÃO TUMULTUÁRIA VERIFICADA. Não pode o Juízo conceder o prazo previsto no art. 422 do CPP e, de pronto, sem saber o que será requerido (e sem fazer o necessário relatório e saneamento do feito), designar a data de julgamento para poucos dias adiante, em espaço de tempo que claramente não será suficiente para o cumprimento de quaisquer dos atos preparatórios previstos no dispositivo legal. A celeridade processual e a otimização de tempo não podem sacrificar garantias processuais essenciais, como o devido processo legal e a plenitude de defesa. WRIT CONHECIDO COMO CORREIÇÃO PARCIAL. CORREIÇÃO DEFERIDA. UNÂNIME. (Habeas Corpus Nº 70074858036, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Mello Guimarães, Julgado em 26/10/2017). (TJ-RS – HC: 70074858036 RS, Relator: Luiz Mello Guimarães, Data de Julgamento: 26/10/2017, Segunda Câmara Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 30/10/2017)
Ao Ministério Público, contudo, o entendimento firmado é pela impossibilidade do manejo de habeas-corpus substitutivo à correição parcial, dado a possibilidade de causar prejuízos ao réu.
O rito da correição parcial, na maioria dos Estados, é semelhante ao do agravo de instrumento previsto no CPC.
Frise-se que a correição parcial não possui efeito suspensivo, o que não impede, ao nosso ver, a impetração do mandado de segurança visando a concessão de tal efeito, já que a Súmula 604 do STJ veda apenas que o Ministério Público requeira, pela via estreita do mandado de segurança, a atribuição de efeito suspensivo a recurso criminal posto que tal atribuição poderia acarretar enormes prejuízos ao réu, como ter de responder ao processo recluso.
Eis o que diz o enunciado supramencionado:
Súmula 604 do STJ: Mandado de segurança não se presta para atribuir efeito suspensivo a recurso criminal interposto pelo Ministério Público.
Sem embargo dos opositores à medida, era o que tínhamos a acrescentar, sucintamente, sobre este instituto tão importante e pouco explorado na prática forense.
FONTES AUXILIARES
Equipe do Centro de Apoio das Promotorias Criminais, do Júri e de Execuções Penais. Correição parcial. Disponível aqui. Acesso em 31.03.2019.
COSTA, Júlio César Xavier Costa. Correição Parcial e suas peculiaridades. Disponível aqui. Acesso em 14.04.2019.
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