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A liquidez do processo penal: até quando?

A liquidez do processo penal: até quando?

Não é de hoje que o processo penal brasileiro vive uma crise sem precedentes, alinhada com uma motivação genérica que ecoa nas urbes brasileiras através de uma opinião pública manipulada e completamente displicente e sem responsabilidade com a verdade, apenas com a falsa sensação de justiça através da prisão ou a qualquer custo. E isso é apenas a ponta do iceberg.

Na realidade, o processo penal vive um lento e doloroso processo de liquidez nesta crise. Em seu sentimento mais simples, a liquidez a que me refiro é a falta de ponderação com as regras do jogo, as decisões arquitetadas através de uma estrutura social particularizada em grupos seletos e específicos que, automaticamente, definem a opinião pública.

Já decidimos eleições dessa maneira, julgamos hoje constantemente dessa maneira, e o julgar aqui não está atrelado à jurisdição de um juízo, mas sim ao comprometimento que cada sujeito hoje possui em ter o seu próprio processo penal. E, aí sim, se aplica a juízes e promotores que não estão mais compromissados com o processo penal, mas sim com suas vontades e a ânsia pública de condenação.

A crise existencial do inquérito policial e as decisões frágeis e bagunçadas que constroem a nossa conhecida jurisprudência afastam abruptamente qualquer indicio de melhoria tão próximo. Na verdade, nos atenta a dias nebulosos que poderão emergir no futuro próximo.

O direito penal liquido – já uma realidade há muito tempo –, essa fuga das regras do jogo e a inobservância de princípios constitucionais que são diariamente desrespeitados encontra total guarita nessa, digamos, “fase” do processo.

Em singelas palavras, não há observância sequer jurisprudencial em diversos pontos: cada um juiz, turma, colegiado tem decidido determinados temas de acordo com o pensamento e sua livre convicção, restando ao acusado apelar para outras insâancias e, quiçá, conseguir chegar as mãos de julgadores que efetivamente concordem com o que a defesa pugna e que está adstrito a decisões anteriores.

Essa liquidez do processo penal, do direito penal e a inobservância das regras do jogo simplesmente deflagra uma crise que tende a crescer dia após dia pela própria autoconstrução de quem julga. Afinal, ele é quem está com o poder de reformar, condenar ou absolver e somente irá realizar este último ato caso entenda perfeitamente que é cabível, não restando mais dúvida em relação ao processo, pleno e claro desrespeito ao in dubio pro reo.

Por fim, a mudança é necessária, a reforma é imprescindível, mas não do Código Penal, não do Código de Processo Penal apenas, mas sim da forma de estreitamento entre as regras do jogo e as decisões motivadas, entre o que está na lei e o que está na cabeça de quem julga, para que não venhamos continuar sendo vitimas otimistas de uma mudança tão necessária, dando fim à liquidez do processo penal e respeitando as regras do jogo processual.


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