A política brasileira de combate à pirataria: o caso Mega Filmes HD

Por Rodrigo César Picon de Carvalho

Determina a Lei 9610/98 que é direito do autor da obra os direitos morais e patrimoniais de sua obra (art. 22), podendo, dentre outras coisas, retirar de circulação ou manter a obra inédita (art.  24, IV e VI) ou reproduzir, editar ou traduzir a obra, ou permitir que terceiros o façam (art. 29, I, II e IV). A violação a tal direito enseja crime esculpido no art. 184 do Código Penal, com pena de detenção de três meses a um ano, e ação penal privada (art. 186, I, também do Código Penal) – entretanto, caso a violação seja a reprodução total ou parcial da obra, sem autorização e com intenção de lucro direto ou indireto, a pena será de reclusão de dois a quatro anos e a ação será pública incondicionada (§ 1º do art. 184; art. 186, II, ambos do Código Penal).

A violação de direitos autorais é um crime que sempre visualizamos nas ruas – é a venda de CD de música pirata; é a venda de DVD de filmes pirata; é a venda de DVD de jogos pirata; é a gravação não autorizada de filmes ou jogos; é o download ou a disponibilidade de assistir on-line filmes, sem autorização, dentre outros. Recentemente, o caso voltou aos noticiários com a decretação da prisão temporária dos donos do site MegaFilmesHd, acusados de violação de direito autoral com intenção de lucro e formação de organização criminosa. O que mais chocou neste caso, todavia, foi a população, que ficou do lado dos “criminosos” em detrimento da lei, o que comprovou a necessidade de se reanalisar a política estatal de combate à pirataria.

O crime é uma conduta tão grave na sociedade que nenhum outro ramo do Direito (como o Civil e o Administrativo) conseguem resolver – somente o Direito Penal. É uma conduta abominável, inaceitável perante a sociedade. Quando a própria sociedade começa a aceitar a conduta criminosa, é necessário repensar se esta é tão abominável a ponto de permanecer como crime. A pirataria é algo aceito socialmente – muitos até preferem adquirir produtos piratas pelo custo reduzido, eis que não há tributos incidentes no preço. Portanto, não há que se punir criminalmente uma pessoa por uma conduta que a sociedade inteira tolera e incentiva – além de achar que está errada a punição. É o chamado Princípio da Adequação Social.

Ademais, cumpre salientar que, no caso da pirataria, outro ramo do Direito – Civil, Administrativo – conseguem resolver satisfatoriamente o problema. Imaginemos um caso em que o sujeito compra uma joke box e instala em um bar, onde a pessoa coloca uma moeda de 1 real e ouve a música que preferir. No final do dia, o dono da juke box retira o dinheiro que se encontra lá dentro e divide com o dono do bar. Imaginemos também o caso do MegaFilmesHD, em que os donos disponibilazavam o filme gratuitamente na internet e ganhavam nas publicidades que ali continham. O Direito Civil e o Direito Administrativo poderiam facilmente resolver o problema, impondo o pagamento devido dos direitos autorais (com indenizações de dano moral pelo uso indevido, por exemplo) e uma multa como sanção – além da perda, em favor do Estado, dos produtos da conduta. Estariam ambos perfeitamente punidos, não bastando, para puni-los, uma pena de 2 a 4 anos de prisão. É o chamado Princípio da Ultima Ratio.

É necessário, portanto, modificar a política de combate à pirataria. Só prender já está demonstrado cabalmente que não resolverá, de longe, o problema da pirataria. Os produtos piratas estão muito abaixo do preço do produto comum – fora a sensação da população que a culpa é dos impostos, o que instiga ainda mais a compra dos produtos piratas. É uma concorrência desleal entre um e outro. Porém, somente punir prendendo aquele que viola direitos autorais não melhorará o problema. Há no Congresso Nacional uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que tem como função analisar a pirataria no Brasil. Esta, contudo, indicou que o “melhor caminho” era aumentar o rigor da legislação penal, aumentando, primordialmente, a pena para quem comete tal delito – completamente contrario sensu à realidade. É preciso enfrentar a pirataria de outra forma – não utilizando o Direito Penal para tal caminho, ou nunca combateremos efetivamente tal mal.

Rodrigo