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(Acordo de) colaboração premiada: natureza jurídica e natureza probatória

(Acordo de) colaboração premiada: natureza jurídica e natureza probatória

O termo natureza implica na ideia de base, formação, raiz, e, quando precedida ao termo jurídica, importa a tal noção aspectos jurídicos, ou seja, o alicerce, essência, natureza jurídica de determinada categoria, instituto, ramo do Direito.

O instituto da colaboração premiada admite uma natureza jurídica tríplice, isto é, sua essência jurídica possui fundamento em três ramos/elementos distintos do Direito: processual, material e como negócio jurídico.

A natureza jurídica processual, relacionada ao Direito Processual Penal, refere-se à compreensão de que a colaboração premiada é uma técnica especial de investigação, ou seja, um mecanismo, instrumento pelo qual, através dele, permite-se alcançar ou facilitar o alcance do(s) aspecto(s) a que se destinou a colaborar. Por consequência, envolve, não só o agente colaborador, mas igualmente os frutos de sua colaboração.

Já a natureza jurídica material, ligada ao Direito Penal, consiste e abarca os reflexos jurídico-penais que o acordo de colaboração poderá trazer para o acusado-colaborador, quando da dosimetria da pena, podendo este substituir, reduzir ou isentar a pena, alterar o regime prisional de cumprimento da reprimenda, servir de perdão judicial ou até mesmo como uma espécie de imunidade, implicando no não oferecimento da denúncia (SOARES, Renner Araújo, 2016).

Por fim, dentro da esfera da Teoria Geral do Direito Penal e Processual Penal (DUCLERC, Elmir, 2016), tem-se a natureza jurídica de negócio jurídico processual público, cujos elementos de legalidade e legitimidade, quer sejam a existência, validade e eficácia do negócio (SPIRITO, Marco Paulo Denucci Di, 2018), devem ser entendidos sob uma lógica de direito público-penal e não sob a lógica de direito privado. Isso porque há a necessidade de adequação e (re)modulação de tudo que for importado ao Direito Penal lato senso (DUCLERC, Elmir, 2016).

Entretanto, quando se atenta ao acordo de Colaboração Premiada, para além do Instituto, ou, em outras palavras, de seu fruto principal, faz-se necessário apontar a  Natureza Jurídica Probatória, visto que distinta da natureza jurídica em si, pois para o presente artigo é entendida como o modo pelo qual pode-se encarar, e, por conseguinte, valorar o conteúdo do acordo de colaboração premiada, gerando implicações e limitações quando constatado ou preferido tratar-se como prova ou meio de prova.

Ainda, a partir de uma ou de outra, por isso importante seu conhecimento, extrai-se a natureza jurídica obrigacional, condicionada, respectivamente, as obrigações e responsabilidades de fim ou de meio (ROSA, 2016).

Como natureza jurídica probatória de meio, o acordo de colaboração constitui-se em um mecanismo, instrumento, meio de prova, ou seja, o colaborador obriga-se a facilitar a obtenção de provas, a “entrega intacta da informação vendida” (ROSA, 2018), cujo teor contém os atalhos que souber pelos quais a Autoridade Policial ou Ministerial poderá percorrer.

Como meio de obtenção de prova, a obrigação é exclusivamente de meio, ou seja, de facilitar a obtenção e não de obter. Por outro lado, configurando-se como prova, o colaborador resta obrigado a sua produção, já que comprometido com o fim a que se propôs colaborar, sob pena do insucesso implicar no desfazimento do acordo de Colaboração Premiada. Em ambos os casos, é necessário a especificação de qual(is) o(s) inciso(s) do artigo 4º do diploma legal estudado, que se pretende colaborar, de qual forma e onde pretende-se chegar.

Contudo, o Estado tem o dever de confirmar se o meio para obtenção da prova será um meio eficaz, satisfatório, útil, antes de firmar o acordo, pois, uma vez acordado, não pode voltar atrás.

Isso quer dizer que, após a entrega da informação, a qual visava diminuir as dificuldades na obtenção de provas, a obrigação foi cumprida e o colaborador tem seus prêmios assegurados. Ainda, como prova, possui o dever de verificar sua validade, relevância e veracidade, relativa a forma de colaboração acordada, mas sempre com valoração relativa.

Ademais, a Defesa do colaborador que seja atenta as particularidades e peculiaridades inerentes a classificação probatória conseguirá, diante das cláusulas do acordo premiado, identificar quais que se tratam de obrigações de meio ou de fim, de modo que sabe o que pode ser exigido ou não e pelo que, o colaborador, pode ser responsabilizado, caso inadimplidas, de modo coerente com a natureza jurídica probatória estabelecida.

Em outras palavras, consegue-se limitar a exigência estatal para fins em cláusulas de obrigações de fim, e meios em cláusulas de obrigações de meio. Saber o que se está assinando e se comprometendo evita o contragolpe.


REFERÊNCIAS

DUCLERC, Elmir. Introdução aos fundamentos do direito processual penal. Florianópolis: Empório do Direito, 2016.

ROSA, Alexandre Morais da. Guia compacto do processo penal conforme a Teoria dos Jogos. 3. ed. Florianópolis: Emporio do Direito, 2016.

ROSA, Alexandre Morais da. Para entender a delação premiada pela teoria os jogos: táticas e estratégias do negócio jurídico. Florianópolis: Empório Modara, 2018. p. 293.

SOARES, Renner Araújo. Delação Premiada. Âmbito Jurídico, Rio Grande jun 2016. Disponível aqui.

SPIRITO, Marco Paulo Denucci Di. Controle de formação e controle de conteúdo do negócio jurídico processual. In: Revista de Processo, São Paulo. p. 141-172. Acesso em: 10 maio 2018.

Andressa Tomazini

Pós-Graduanda em Direito Penal e Direito Processual Penal. Pesquisadora.

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