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Among Us e a legitimidade do Tribunal do Júri

Among Us e a legitimidade do Tribunal do Júri

Among Us é um jogo online lançado pela empresa InnerSloth em 2018, porém teve seu sucesso ampliado nos últimos meses devido a possibilidade de juntar amigos e se divertir em um ambiente virtual em tempos de isolamento social.

O jogo é bastante simples: trabalhadores devem realizar suas tarefas enquanto um ou mais deles é um “impostor”. O objetivo dos trabalhadores é terminar suas tarefas ou descobrir quem é o impostor para expulsá-lo do jogo. Para isso os jogadores podem chamar reuniões, onde trocam informações sobre os acontecimentos e após votam para decidir se irão expulsar alguém ou não. Uma vitória por maioria simples na votação é o bastante para expulsar um jogador, seja ele impostor ou não.

Mas e o Tribunal do Júri?

O tribunal do júri se caracteriza pelo julgamento dos acusados de terem, em tese, praticado crimes dolosos contra a vida, no qual o réu é julgado por seus pares (pessoas comuns do povo) que, ao final, votam se o acusado é inocente ou culpado, se ele será “expulso” do convívio social ou retornará a sua vida. Uma vitória por maioria simples na votação é o suficiente para inocentar alguém, ou condená-lo há vários anos de prisão

Em ambos os casos, os envolvidos com poder de decisão julgam por íntima convicção, uma vez que não há necessidade de fundamentar o voto, não há necessidade de buscar a verdade defendida no processo, nem há um controle externo analisando os reais motivos que fundamentaram a decisão dos jurados. Os jurados são pessoas da sociedade, de diversas profissões e graus de instrução, sujeitas a serem influenciados pela mídia e suas próprias vivências na hora de chegar a seu veredito, se baseando, muitas vezes, em quem é o réu ao invés de avaliar se o réu realmente cometeu o crime a ele imputado.

Tanto no jogo quanto no júri, personagens que já estão mais habituados ao cenário – réus reincidentes ou jogadores com maior experiência – são mais facilmente condenados, pois a ânsia de punir alguém que já agiu de forma marginal a lei por muitas vezes supera a real análise do caso discutido naquele julgamento.

Não raras vezes, pessoas que teriam a seu favor a dúvida razoável são condenadas por seu histórico, ou condição social, tendo em vista o olho punitivista da sociedade brasileira. A liberdade de julgamento conferida aos jurados deixa o réu na incerteza se a lei penal será devidamente aplicada, uma vez que é defeso aos jurados formarem o livre convencimento sem qualquer restrição.

Aos jurados não é exigido conhecimento processual penal, tampouco fundamentação legal ao condenar ou absolver o réu. Do jurado apenas é exigido que se sente em seu lugar, escute os debates e depois vote, e dos sete jurados, apenas quatro votantes separam o réu de uma condenação ou absolvição, sendo a opinião dos jurados vencidos completamente descartada no momento em que uma maioria de forma. Assim, o direito brasileiro, tal qual fez Pilatos, lava suas mãos e entrega ao povo a decisão de condenar ou absolver aqueles acusados de crimes contra a vida, permitindo que a emoção individual ou coletiva, sobreponha a razão na análise dos fatos.

É necessário avaliar a real capacidade de um tribunal popular em proferir uma decisão com repercussão tão avassaladora para a vida de muitos. No final, resta ao jurado sempre se perguntar:

Há mesmo um impostor entre nós?

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