Por Gabriel Costa Silva. A catastrófica situação do caso Robson (envolvendo o motorista Robson do Nascimento de Oliveira), teve um final feliz. O motorista contratado para trabalhar na Rússia com o jogador de Futebol Fernando, foi preso naquele país em março de 2019, acusado de transportar duas caixas de um remédio chamado Mytedom (cloridrato de metadona). O remédio em questão é lícito no Brasil, todavia, é entorpecente na Rússia.
Caso Robson
Robson afirma seguramente que o medicamento era destinado para o sogro do jogador Fernando, que estava na Rússia e sofre de dores crônicas. O caso teve uma repercussão nacional muito forte, e após intervenção do Governo Brasileiro, Robson, após passar 2 anos preso na Rússia, desembarcou no Brasil no dia 05 de maio de 2021, para tentar um recomeço após todo o transtorno.
Partindo do ponto técnico, tratando-se da legislação brasileira, talvez o caso tivesse outro desfecho.
Hipoteticamente, se um estrangeiro tentasse adentrar no Brasil com uma substancia considerada como entorpecente, e o mesmo não tivesse sapiência da ilicitude, poderíamos adequar a situação jurídica no Erro de Proibição.
No código penal está positivado da seguinte forma:
Art. 21 – O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço.
A doutrina normalmente se divide em duas partes: a primeira em ignorância sobre a lei e a segunda ignorância de ilicitude, sendo, portanto, dois conceitos parecidos, temos além dessas que fazer adequação a consciência da ilicitude em duas formas chamadas de real ou potencial, aplicando-se no direito brasileiro a potencial no caso em questão.
Assim sendo, esse é o ponto crucial do entendimento legislativo, e tem como configuração para a adequação da a espécie contida no entendimento majoritário denominada de Erro Direto, que é concluído como o erro sobre o conteúdo proibitivo da norma, que o agente erra quanto ao caráter proibido de sua conduta, ao supor lícita uma ação ilícita.
É facilmente encontrado em qualquer leitura sobre o assunto o exemplo de um Holandês, que habituado a consumir maconha no seu país de origem (HOLANDA), acredita ser possível utilizar a mesma droga no Brasil, equivocando-se quanto ao caráter proibido da sua conduta.
É exatamente o que aconteceu com o brasileiro que acabou detido no aeroporto em Moscou: ele foi preso, em posse de um medicamente lícito no seu país de origem, que é penalizado no país em que o agente se descolava e seria o seu destinatário final. Sendo acusado posteriormente pela legislação Russa, por ser completamente diferente da aplicada no Brasil, ele foi condenado por tráfico internacional de drogas e contrabando.
Percebe-se que o agente não conhecia a norma completamente e consequentemente não dominava o seu conteúdo. Além disso, ele também não entendia o seu âmbito de incidência.
Invertendo a nacionalidade do agente e o país do fato, o caso poderia ter um desfeche menos dramático, já que temos uma definição bem precisa do fato em questão, sustentada de forma majoritária e de fácil compreensão, como podemos constatar na explicação de Francisco de Assis Toledo:
há erro de proibição quando o agente realiza uma conduta proibida, seja por desconhecer a norma proibitiva, seja por conhecê-la mal, ou seja, por não compreender o seu verdadeiro âmbito de incidência.
É importante frisar que erro de proibição não se confunde com o erro de tipo, porque, se, no erro de tipo, o agente não sabe o que faz, no erro de proibição, ao contrário, ele sabe exatamente o que faz, mas acredita fielmente que age licitamente, sendo, portanto, subdividido em dois modelos: erro de proibição escusável e erro de proibição inescusável, sendo a primeira hipótese aplicada no fato debatido para melhor entendimento.
Nesse sentido, explica Flávio Monteiro de Barros:
Erro invencível ou escusável é o que não emana da culpa do agente. Ainda que empregasse a atenção do “homem médio”, o erro ter-se-ia verificado. Erro vencível ou inescusável é o que emana da culpa do agente. Para evitá-lo bastaria a atenção normal do ‘’homem médio” (Direito Penal – Parte Geral, 2003, p. 202).
Em concordância com os fatos e transferindo o território, vemos que é definido no caso hipotético a ação, como Erro de proibição inevitável ou escusável. O agente não tinha como conhecer a ilicitude do fato em virtude das circunstâncias do caso concreto. Portanto, inexistia a potencial consciência da ilicitude, logo, esse erro exclui a culpabilidade. O agente fica isento de pena.
Para avaliar se o erro de proibição foi escusável ou inescusável são consideradas as características pessoais do agente, tais como idade, grau de instrução, local em que vive e os elementos culturais que permeiam o meio no qual sua personalidade foi formada, e não o critério relativo ao homem médio (CUNHA, 2016).
Conclui-se que, por estar em erro de proibição direto inevitável como vemos de acordo com a doutrina e diante do Código Penal, se o fato tivesse ocorrido no Brasil, o estrangeiro deveria ser isento de pena, o que não aconteceu no fato vivenciado, onde Robson do Nascimento de Oliveira, suportou por um longo período todas as mazelas contidas na pena privativa de liberdade.
Referências
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 270.
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 271.
(CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal: Parte Geral: arts. 1º ao 120. 8. ed. Salvador: Juspodivm, 2020. p. 371-372 e 374).
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 4 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2004.
SATRIANO, Nicolás. G1 Rio, Motorista que ficou preso 2 anos na Rússia após levar remédio para sogro de jogador chega ao Rio. 05/05/2021.
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