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Anseios sociais, clamor social e reformas processuais: é hora de mudar!

Anseios sociais, clamor social e reformas processuais: é hora de mudar!

Desde o advento da Lei 13.105/2015, novo Código de Processo Civil, algumas questões que, a meu ver, tem ou, ao menos deveriam ter reflexos penais, vem me incomodando e me chamando a uma reflexão mais aprofundada.

A nova sistemática do CPC/2015 veio, nitidamente, trazer um novo padrão de processo à sociedade brasileira: mais condensado e mais célere. Tal viés fora justificado na exposição de motivos do NCPC com as seguintes palavras:

Não há fórmulas mágicas. O Código vigente, de 1973, operou satisfatoriamente durante duas décadas. (...) O novo Código de Processo Civil tem o potencial de gerar um processo mais célere, mais justo, porque mais rente às necessidades sociais e muito menos complexo.

Desde que vi essa fala na exposição de motivos tenho me perguntado o porquê de não se buscar, na seara processual penal os mesmos fins perseguidos na seara processual civil, se estamos em exato momento de reformulação da nossa legislação processual penal…

Por óbvio que devemos guardar as devidas proporções no que toca a cada esfera processual e devemos, ainda, observar com cautela as peculiaridades de cada uma das vertentes do processo, pois que os bens e valores ínsitos a cada um deles é bastante diverso, mas seus princípios e suas bases constitucionais são as mesmas; e disso não podemos nos esquecer.

Deveríamos, a meu ver, aproveitar o ensejo para tentar aproximar a reforma processual penal das linhas mestras que conduziram a nova lei processual civil:

Na elaboração deste Anteprojeto de Código de Processo Civil, essa foi uma das linhas principais de trabalho: resolver problemas. Deixar de ver o processo como teoria descomprometida de sua natureza fundamental de método de resolução de conflitos, por meio do qual se realizam valores constitucionais.

É assim que deveria ser! O processo está ai para, sim, garantir os direitos do acusado e proteger os interesses da vítima, mas também e principalmente, para, ao menos, tentar, resolver problemas. E quem disse que resolver problemas não pode se harmonizar com garantir direitos e proteger interesses?

É claro que pode! Não só pode, como deve!

Pensemos um novo processo penal que deve olhar para a sociedade na qual refletirá com vistas a solucionar problemas e resolver contendas, garantindo-se os direitos dos acusados e protegendo-se os interesses das vítimas.

Harmonizar e inovar devem ser as palavras de ordem da nova sistemática processual penal que não pode e não deve perder a oportunidade de oferecer ao sistema brasileiro um produto legal pautado na razoabilidade e na celeridade, atendendo aos anseios sociais que, não podem, de todo, ser sempre relegados a segundo plano, sob o argumento de que o clamor social é iníquo…

Separemos e entendamos a diferença entre anseio social e clamor social: o primeiro parte de um sentimento subjetivo e interno de cada cidadão que se apreende coletivamente nas manifestações individuais cotidianas; é o sentimento que cada indivíduo expressa frente a determinada situação; já o segundo vem de fora e é provocado, manipulado e inflamado – em grande parte pela mídia e também pelo próprio Estado em seu viés opressor – é um “sentimento” construído socialmente e que parte do coletivo manipulado para atingir o indivíduo que o incorpora sem muito bem entendê-lo e que acaba por dele se “apropriar” para fazer parte do todo e, por vezes, por não possuir elementos hábeis a questioná-lo. São conceitos amplamente diversos e que devem ser desmistificados para que não continuemos a rejeitar os anseios sociais como se clamor social fossem.

Os anseios sociais são legítimos e devem ser observados e considerados, especialmente durante a feitura das normas e regras que submeterão todos aqueles que habitam dado território.

Sabemos muito bem em que contexto o atual CPP – que relembre-se, é do ano de 1941 – foi elaborado e “imposto” ao brasileiro, por meio de um decreto-lei! Tal qual aconteceu com o processo civil, sua vigência já cumpriu seu mister… é hora de reformular e repensar o processo penal contemporâneo à luz da moderna sociedade que nele se ampara, dele se socorre e por um novo modelo de processo anseia.

Dayane Fanti Tangerino

Mestre em Direito Penal. Advogada.

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