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CRBC: Comando Revolucionário Brasileiro da Criminalidade


Por Diorgeres de Assis Victorio


7 – Onde quer que o CRBC estiver não poderão existir integrantes do PCC, pois os mesmos, através da ganância, extorsão, covardia, despreparo, incapacidade mental, desrespeito aos visitantes, estupros, de visitantes (sic), guerra dentro de seus próprios domínios, vem colaborando para a vergonhosa caotização do aparato penal do Estado de São Paulo. Portanto, não podemos conviver com esses “lixos”, escórias, animais sem o menor senso de racionalidade. Estes, definitivamente, não podem e não devem conviver com aqueles que têm suas famílias sacrificadas e igualmente condenadas, que lutam contra as dificuldades de nosso País, por nossas liberdades.

16 – O CRBC não aceita ‘ex PCCs’, ‘soldadinhos do inimigo’, e, tampouco, ‘simpatizantes do mesmo’.

18 – Só será permitida a entrada no presídio sentenciados filiados a qualquer outro Comando, que não seja o PCC, ou sentenciados sem afiliação com quem quer que seja. (Estatuto do CRBC)

A facção criminosa (não considero o CRBC como organização criminosa em razão de várias características em comparação ao PCC e ao CV, mas essas comparações serão feitas em um outro artigo, pois esse não é o objetivo do aqui proposto) nasceu na Penitenciária de Guarulhos na Grande São Paulo, sua base inicial era a Penitenciária I de Guarulhos, mas o mesmo já teria estendido seus domínios a Sorocaba e poderíamos dizer que agora o mesmo resume seus territórios na Penitenciária José Parada Neto, de Guarulhos e no Centro de Detenção Provisória (CDP) III de Pinheiros e também na colônia do semiaberto do Belém.

Segundo o próprio estatuto do CRBC o mesmo teria sido criado no ano de 1999, mas para ser mais preciso na data que muitos comemoram o Natal “foi fundado em 25 de dezembro de 99” (Jornal da Tarde, 20 de fevereiro de 2001, pag. 8 A). Possui um estatuto composto por 21 artigos e em seu artigo 9 estabelece que as pessoas convocadas para filiação deverão ter alguns requisitos e os mesmos são mencionados no item 9.1:

“Ter moral, ser guerreiro em todos os sentidos, apoiar todos aqueles que desejam fugir, sem prejudicar a população carcerária. Já no artigo 10 menciona inclusive algumas profissões. 10 – O CRBC, deverá ser, constituído de homens dignos, inteligentes, com bom grau de intelectualidade, tais como médicos, enfermeiras, advogados, enfim profissionais liberais que possam dar-nos sempre a melhor contribuição possível, dentro d e fora da Prisão.”

Também como o PCC faz uso de uma caixinha e também visa resgates:

11 – Os fundos que forem arrecadados por cada membro do CRBC, em liberdade, têm por objetivo, RESGATAR OS SEUS COMANDADOS e, quando o membro do CRBC estiver com problemas, sejam estes quais forem, sendo o (CERTO) deverá ser apoiado.”

Também faz uso da pena capital:

“14 – O CRBC, não dará oportunidades, para o caso de FALHAS ou TRAIÇÕES para com um membro do CRBC. A pena prevista para este caso será a EXECUÇÃO SUMÁRIA”

Apesar de sempre ter trabalhado em Unidades onde eram territórios do PCC, por diversas vezes o Estado aplicando uma pena especial, prevenção especial negativa, visando à neutralização, a eliminação transferia membros do CRBC para presídios do PCC. Várias vezes vi viaturas dentro do Setor de Portaria com presos do CRBC em seu interior, quando chegavam à Unidade e descobriam que estavam em “cadeia do PCC” quase viravam a viatura, pois começavam a balançá-la e diziam que nós teríamos que matá-los pois eles não iriam morrer nas mãos dos vermes (PCC). Outro dia ao chegar à Unidade fui informado que “haviam transferido” mais de 10 presos do CRBC a Unidade. Fui até eles conversar e saber mais de perto dessa política criminógena do Estado. Eu sabia que os presos podiam nos pegar como reféns e fazer uma rebelião e destruir toda a Unidade para chegarem até eles para matá-los.

Quando cheguei à cela da inclusão vi que um preso estava de pé em frente à cela e perguntei ao mesmo porque ele estava ali em pé (não é costumeiro presos ficarem próximos as portas das celas). Ele me disse que era a vez dele de ficar na segurança, porque ele sabia que estava na cadeia do PCC e que já tinha sido alertado pelos próprios presos do PCC através de gritos que ecoavam pela Unidade que corriam risco de morte. O “Vai morrer!” ecoava na cadeia. Ele me disse que o PCC costumava decapitá-los, mas antes os torturavam de diversas formas.

Recordo-me quando o fundador do CRBC esteve na cadeia aonde eu trabalhava. Ele comandava o Setor de Cozinha, “cortava” os presos que trabalhavam no setor, selecionando assim “a dedo” quem o mesmo queria naquele setor. Tomava a frente de tudo naquele setor. Ele apavorava os presos daquele setor, um dia chegou a bater na face de um deles. Esse preso estava de posse de uma faca e não aceitou tal fato, afinal de contas “Em rosto que mamãe alisa e beija, homem algum pode bater e permanecer vivo” (essa é uma frase muito utilizada pelos criminosos).

O líder do CRBC começou a correr em volta das panelas industriais da cozinha e ninguém tentou separar a briga, afinal de contas é regra na cadeia, quando alguém saca uma faca ninguém deve entrar na frente da mesma, pois esse fato pode ser interpretado como a ação de um dissidente (inimigo). Conseguimos com muito diálogo, pois não nos é permitido portar armas dentro das Unidades Prisionais, convencer quem portava a arma branca a não matá-lo.

O líder do CRBC nem ao menos pode mais retornar ao Raio III onde o mesmo habitava, teve que descer a galeria e ser colocado em uma viatura e ser transferido a outra Unidade o mais rápido possível, pois a cadeia toda estava “inflamada”, ele ia ser morto. Depois, quando o mesmo já tinha sido transferido fui questionar os membros do PCC que comandavam a cadeia, porque eles permitiram que o mesmo sendo do CRBC, sendo o fundador e líder, permaneceu tanto tempo cumprindo pena na Unidade e praticando tantas arbitrariedades? Eles me disseram que essas informações foram escondidas dos mesmos.

Estranhei esse fato, mas depois raciocinando com mais calma, e baseado nos estudos que fiz nesses anos no cárcere, concordei com os mesmos. Se alguém contasse que estava sendo “humilhado” no cárcere, os presos iriam exigir que ele fosse “trocar faca” (duelar com estiletes improvisados) sob pena de não ser mais considerado criminoso e não poder mais habitar os pavilhões de convívio, tendo que habitar o regime de seguro (antigo “amarelão da Detenção”) ou até ter que ser transferido a outra Unidade, sendo que nesse caso o mesmo estaria com sua vida no crime condenada. Eis aqui umas pequenas “pinceladas” dessa facção criminosa paulista.

_Colunistas-Diorgeres

Diorgeres de Assis Victorio

Agente Penitenciário. Aluno do Curso Intensivo válido para o Doutorado em Direito Penal da Universidade de Buenos Aires. Penitenciarista. Pesquisador

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