ArtigosDireito Penal

Atiradores em massa: o que sabemos sobre seu comportamento e motivações

Atiradores em massa: o que sabemos sobre seu comportamento e motivações

Um atirador em massa (mass shooter) é um indivíduo que utiliza algum tipo de arma de fogo para assassinar ou tentar assassinar pessoas em ambientes delimitados[1].

Atiradores em massa

Existem várias definições para conceituar a ação deste tipo de atirador e diversos critérios diferentes, o que gera uma certa confusão sobre este tema. Segundo o Departamento Federal de Investigação dos Estados Unidos (FBI), os ataques realizados por esse tipo de agente são classificados como tiroteios em massa (mass shootings) quando causam a morte de pelo menos 4 outras pessoas alvejadas pelo atirador dentro do intervalo de 24 horas [2].

Ainda existe uma literatura escassa sobre esse tipo de ato violento, principalmente no Brasil. Uma grande parte das fontes sobre esse fenômeno é estadunidense, e por isso pode representar esse tipo de crime de uma forma diferente da qual ocorre em território brasileiro. Entretanto, tais fontes ainda são úteis para pesquisarmos o que se sabe a respeito dos atiradores em massa nos dias de hoje.

Não existe um perfil único de atirador e muito menos um algoritmo ou protocolo que possa prever com confiabilidade as ações violentas dos mesmos ou quem irá se tornar um homicida, mas existem estudos identificando características compartilhadas por uma grande parcela dos autores deste tipo de atentado. Sabe-se que são predominantemente homens (94-97%) [2 e 3]. Agem sozinhos na maioria dos casos e possuem histórico de se comportar de forma opressiva ou abusiva (bullying, por exemplo). Além disso, poucos possuem histórico criminal (35% têm condenações penais) [3].

Apesar de muitas pessoas acreditarem que a maior parte dos atiradores tem transtornos mentais, isso não é necessariamente verdade. Não se sabe o histórico psiquiátrico de grande parte dos executores, e dentre os quais se tem conhecimento, apenas 25% possuíam um diagnóstico até o momento do atentado. Entretanto, estima-se que pelo menos 48% deles possuam ideação suicida ou comportamentos com intenções suicidas [3], o que torna a discussão acerca da saúde mental destes indivíduos bastante complexa.

Apesar da maioria deles apresentar traços narcisistas e/ou paranoicos e demonstrar grande ressentimento com certos indivíduos ou grupos, existe grande dificuldade em categorizar isso como algum transtorno mental específico [4]. Existe uma crença popular de que homicidas em massa agem de forma violenta sob a influência de algum tipo de colapso emocional ou crise psicológica momentâneos, porém na maioria dos casos eles demoram uma semana ou mais se preparando para o ato [3].

Por quê matar?

Quanto à motivação dos atos violentos, primeiramente é importante saber que, em sua maioria, os atiradores em massa acreditam que foram injustiçados ou prejudicados de alguma forma. Há um ressentimento que pode ser direcionado a grupos culturais, organizações ou indivíduos, e que posteriormente pode se converter em um ato homicida [5].

Cerca de dois terços dos atiradores tinham algum indivíduo ou grupo específico como alvo [3], e aproximadamente 57% dos atentados vitimaram parceiros românticos, ex-parceiros ou familiares do atirador. Além disso, 73% deles possuíam ligação conhecida com o local atacado, o que é mais um indicador de que suas escolhas não ocorreram arbitrariamente [3].

Associado a esses fatores, ainda pode existir o objetivo de ser reconhecido como uma forma de herói que morreu lutando por uma causa maior que si mesmo. Isso significa que a busca por glória ou notoriedade pode ser uma das motivações para o atirador [5].

Gatilhos comportamentais são muitas vezes utilizados na tentativa de explicar um ato violento, e isso também acontece quando as pessoas pensam sobre atiradores em massa. Foi constatado que eles sofrem, em média, com pelo menos 3 fatores estressores ao longo do ano em que cometem o ataque. Dentre os mesmos, as perturbações mais frequentes envolvem a saúde mental, problemas financeiros e dificuldades relacionadas a trabalho.

Entretanto, ainda não foi demonstrado se os estressores funcionam como gatilhos, motivando o indivíduo a cometer um homicídio em massa diretamente por causa destes fatores. O comportamento violento (assim como os outros comportamentos humanos) é fruto de uma relação extremamente complexa de variáveis, não podendo ser explicado de forma direta elegendo causas específicas [3].

Prevenção e proteção

É muito importante buscar informações sobre a problemática dos tiroteios em massa e de que formas podem ser combatidos para se pensar em um planejamento de segurança. Existem fontes disponíveis que fornecem dados e estratégias de prevenção e combate a este tipo de atentado, como o manual Making prevention a reality, produzido pelo FBI.

Neste são demonstradas formas estratégicas de otimizar planos de segurança e prevenção de ataques violentos, além de analisar, classificar e investigar ameaças [6]. O departamento de segurança nacional americano (Homeland Security) elaborou um manual para respostas aos ataques de atiradores em massa que explica como as pessoas que estão no local do ataque podem aumentar suas chances de sobrevivência durante o atentado [1].

Ainda existem outros guias publicados por agências federais de segurança que podem ser utilizados para compreender as estratégias possíveis para combater atiradores em massa em diversos cenários, como o Campus Attacks, que aborda esta situação especificamente em instituições acadêmicas de ensino superior [7].

Possuir informações sobre atiradores em massa pode ser bastante útil para a população civil, pois os atiradores apresentam uma média de 5 alterações comportamentais em épocas que precedem os atentados. Estas alterações são observáveis e normalmente são percebidas por pessoas próximas, o que incita a discussão sobre a possibilidade de intervenções que dissuadam o atirador antes de cometer o ataque.

As principais mudanças comportamentais envolvem saúde mental, relações interpessoais, vazamento de intenções de cometer o ato, qualidade do pensamento e comunicação, além do desempenho no emprego ou estudos. Também podem ocorrer alterações relacionadas ao aumento de agressividade, interesse exacerbado por armas, aumento no uso de linguagem agressiva nas redes sociais e diversas outras mudanças de comportamento [3].

Neste texto foram expostos alguns dos dados disponíveis acerca do comportamento complexo dos atiradores em massa, assim como algumas fontes que fornecem estratégias de enfrentamento deste problema. É de extrema importância que mais informações sejam recolhidas sobre esse tipo de fenômeno para que a comunidade esteja melhor preparada para prevenir e combater massacres e preservar a vida das pessoas.

Ainda se sabe pouco sobre este tipo de evento violento, por isso a investigação científica se torna essencial para uma melhor compreensão das variáveis que envolvem esse tipo de violência, para que assim possamos reduzi-la.


REFERÊNCIAS

[1] Active Shooter: How to respond – U.S. Department of Homeland Security

[2] Change and stability in offender, behaviours, and incident‐level characteristics of mass public shootings in the United States – Joel A. Capellan, SimonPeter Gomez

[3] A Study of the pre-attack behaviors of active shooters in the United States between 2000 and 2013 Quick reference guide – FBI Behavioral Analysis Unit (BAU)

[4] Investigating the minds of mass killers – The New York Times

[5] Mass shooters are all different. Except for onde thing: Most are men. – The New York Times

[6] Making prevention a reality: Identifying, assessing and managing the threat of targeted attacks – Federal Bureau Of Investigation

[7] Campus Attacks: Targeted Violence Affecting Institutions of Higher Education – Federal Bureau of Investigation


Quer estar por dentro de todos os conteúdos do Canal Ciências Criminais?

Então, siga-nos no Facebook e no Instagram.

Disponibilizamos conteúdos diários para atualizar estudantes, juristas e atores judiciários.

Henrique Britto de Melo

Instrutor de Criminalística e Técnicas de Entrevista. Pós Graduando em Ciências Criminais. Membro da Sociedade Brasileira de Ciências Forenses.

Artigos relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo