A ausência de motivo no crime de homicídio
A ausência de motivo no crime de homicídio
Olá, amigos! Espero que estejam bem.
Esta semana iremos falar sobre um tema polêmico, que intriga muitos operadores do direito: a ausência de motivo qualifica o crime de homicídio? Ou, ainda, existe crime sem motivo? São essas perguntas que iremos responder, de maneira bem sucinta, no presente artigo.
Primeiro lugar, imperioso afirmar que a doutrina e jurisprudência, tem pacificado o entendimento de que a ausência de motivos não qualifica o crime de homicídio como fútil. Isso porque a futilidade (CP, art. 121, § 2º, II) é a motivação de pequena monta, que jamais poderia ser invocada como causa moral nobre para um homicídio (exemplo: matar uma pessoa no carnaval que tenha “pisado” no pé do agente).
Desse modo, não constitui a ausência de motivação o delito previsto no artigo 121, § 2º, II. Nesse sentido, citamos as seguintes decisões:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRIBUNAL DO JURI. PRONÚNCIA. ADMISSÃO DE QUALIFICADORA. MOTIVO FÚTIL. CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO SE EQUIPARA À AUSÊNCIA DE MOTIVO. RESTABELECIMENTO DA QUALIFICADORA. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. 1. A ausência de motivo não caracteriza a qualificadora do inciso II do parágrafo 2º do artigo 121 do Código Penal (por motivo fútil), sob pena de violação ao princípio da reserva legal. 2. Se a instância ordinária, soberana na análise dos fatos e das provas coligidos aos autos, chegou à conclusão de que a qualificadora é manifestamente improcedente, tem-se que a inversão dessa conclusão, para entender-se equivocado o afastamento da qualificadora exigiria, inarredavelmente, o reexame dos contexto fático dos autos, inviável em sede de recurso especial. 3. Agravo regimental improvido. (STJ – AgRg no REsp: 1718055 GO 2018/0004245-2, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 21/08/2018, T6 – SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/08/2018).
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. PRONÚNCIA. QUALIFICADORA. MOTIVO FÚTIL. AFASTAMENTO. INADMISSIBILIDADE. IN DUBIO PRO SOCIETATE. A DÚVIDA ACERCA DA EXISTÊNCIA DA QUALIFICADORA DEVE SER DIRIMIDA PELO TRIBUNAL DO JURI. AUSÊNCIA DE MANIFESTA ILEGALIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. (…). 2. A jurisprudência desta Corte Superior não admite que a ausência de motivo seja considerada motivo fútil, sob pena de se realizar indevida analogia em prejuízo do acusado. Precedente.”(…). (STJ – HC: 369163 SC 2016/0226949-8, Relator: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 21/02/2017, T5 – QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/03/2017)
Pelo exposto, tem-se que é pacifico a não incidência da qualificadora de motivo fútil quando ausente motivo na prática do crime de homicídio. Entretanto, a dúvida surge a respeito de outra qualificadora subjetiva (motivo torpe). É aquele motivo abjeto, repugnante. Várias decisões tem entendido que a ausência de motivo configuraria tal qualificadora. Entretanto, ousamos discordar.
O homicídio praticado sem qualquer motivo (ou mesmo com motivo absolutamente ignorado) é homicídio simples e não qualificado, em homenagem ao Princípio da legalidade estrita.
O Ministro Jorge Mussi, por ocasião do julgamento do HC 152.548/MG, apontou que “se por razões de política criminal o legislador ordinário qualificou a conduta homicida motivada por sentimento insignificante, em respeito até mesmo ao princípio da legalidade estrita que rege o direito penal pátrio (artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal e artigo 1º do Código Penal), nesse tipo não pode ser inserido o agente que pratica tal conduta sem qualquer motivação específica.
Quanto ao segundo questionamento levantado no início deste texto, entendemos não ser possível a existência de crime doloso sem motivo, até porque o dolo, como elemento volitivo, determina a vontade do agente no momento de produzir um resultado. Tal vontade, evidentemente, deve vir acompanhada de um motivo anterior ou atual, seja o motivo justo ou injusto.
Nesse sentido, NUCCI:
(…) é bastante polêmica a possibilidade de equiparar a ausência de motivo ao motivo fútil. Sustentam alguns que praticar o delito sem qualquer motivo evidencia futilidade, com o que não podemos concordar. O crime sempre tem uma motivação, de modo que desconhecer a razão que levou o agente a cometê-lo jamais deveria ser considerado motivo fútil. É possível que o Estado-acusação não descubra qual foi o fator determinante da ação criminosa, o que não significa ausência de motivo. Uma pessoa somente é capaz de cometer um delito sem qualquer fundamento se não for normal, merecendo, nesse caso, uma avaliação psicológica, com possível inimputabilidade ou semi-imputabilidade.(NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 481).
Ou seja, em que pese grandes doutrinadores que acreditam que há crime sem motivos, ousamos discordar, posto que todo crime é dado um motivo, o que ocorre, em verdade, é a não comprovação do motivo.
FONTES AUXILIARES
RÓSSI, et al. Ausência de motivo no crime de homicídio doloso: forma simples ou qualificada. 2016.
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