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Uma breve análise sobre a audiência de custódia

Uma breve análise sobre a audiência de custódia

Esse é mais um texto produzido na Comissão Especial de Estudos de Medidas Alternativas à Prisão, aqui do Canal Ciências Criminais, cuja autoria é de Ana Flávia da Silveira.

A audiência de custódia é uma medida processual que estabelece que o indivíduo, quando preso em flagrante, deve ser apresentado à autoridade judicial competente, dentro do prazo de 24 horas, nos termos do artigo 306, § 1º, do Código de Processo Penal, visando analisar a legalidade do ato, bem como a medida a ser adotada (relaxamento, prisão preventiva ou medidas cautelares diversas da prisão), conforme estabelece o artigo 310 do CPP.

Como mencionado, uma das suas finalidades é cuidar/combater a tortura e os maus tratos que eventualmente possam ocorrer na abordagem policial quando da realização do flagrante.

Assim, com a apresentação do preso à autoridade judiciária, busca-se, principalmente pela sua oitiva e demais elementos dos autos, identificar a ocorrência da prática de ilegalidades no ato prisional, para, assim, adotar as providências cabíveis, seja o relaxamento da prisão, comunicação aos órgãos competentes, dentre outras.

É de se ressaltar a importância do primeiro contato entre o preso e o Juiz, buscando uma proximidade e um olhar mais humano para entender suas condições, saúde, vida financeira, se possui filhos pequenos (questão essencial no caso de presas grávidas), além de outras primordiais para a formação do convencimento do(a) magistrado(a).

Outro ponto importante sobre a implementação da audiência de custódia é o desafogamento do sistema prisional, que, como sabemos, é superlotado, uma vez que no momento da audiência é possível que o magistrado decida a necessidade da prisão e do encaminhamento para o cárcere, influenciando, assim, os índices de presos provisórios e evitando a manutenção da prisão daqueles que não deveriam estar presos.

Em alguns Estados Brasileiros já é possível perceber um resultado positivo quanto a realização da Audiência de custódia, uma vez que impede o preso ser inserido no sistema penitenciário, de modo que o número de presos não se eleva e evita-se prisões desnecessárias.

Porém, em outros Estados, não são feitas as audiências de custódia, por diversos problemas, desde falta de estrutura para recepção do preso, até o desinteresse do Estado na sua realização, fazendo com que, desse modo, o importante instituto da audiência de custódia não surta efeito e a prisão em flagrante continue sendo analisada em desacordo com o Ordenamento Jurídico.

Há relatos de audiências realizadas sem a presença de Defesa Técnica (advogado ou defensor público); em pouquíssimos minutos, impossibilitando a devida análise; além de decisões tomadas sem levar em consideração o caso concreto, banalizando o instituto e demonstrando até mesmo indignação por alguns membros do Judiciário quanto a sua realização.

Entretanto, a audiência de custódia é extremamente vantajosa e ainda percebemos (e sonhamos com) um ponto de esperança para fazer o sistema prisional mais humano e garantista. Esse, inclusive, é um sentimento advindo do próprio projeto, que passava a lúdica impressão de que tal medida (aparentemente) não haveria dificuldades em ser colocada em prática. Porém, a realidade não é tão afável, como já demonstrado.

Ainda, vale se perguntar os motivos para a falta de efetividade da audiência de custódia como um todo, eis que seus resultados positivos são mínimos e pelo fato de que seu objetivo principal (evitar prisões ilegais e desafogar o sistema prisional) não surte os devidos efeitos.

Em primeiro lugar, não é preciso de muito esforço para perceber que a audiência de custódia não passa de um mero devaneio para tentar mascarar um caos que se agrava cada vez mais, que se chama “aumento da população carcerária”.

Quando se fala em audiência de custodia, não devemos apenas nos limitar pela sua ideia central de combater a tortura e aproximação entre juiz e preso. O operador do direito deve se aprofundar ainda mais para perceber a realidade.

O Estado reproduz sua falta de interesse na saturação da população carcerária, superlotação essa que se dá de forma completamente seletiva (assunto para outro momento), tornando o sistema um verdadeiro caos diante da falta de estrutura, de saúde, de direitos humanos, jogando a responsabilidade toda para o colo do direito penal, que, completamente sobrecarregado e em crise de identidade tenta driblar as situações.

O grande problema é que, o sistema é falho, ou seja, a aplicação desse tipo de medida é completamente incompatível com o atual sistema (e com os interesses de quem atua nesse sistema), que seria efetivo se o Brasil adotasse um sistema garantista. Porém, demandaria tempo, reestruturação política e até cultural (e parece que não há interesse para que isso ocorra).

Contudo, busquemos o título quase meramente ilustrativo para justificar a ideia, a legislação brasileira, transparecendo uma certa preocupação com a realidade fática do caos carcerário, busca medidas para tentar parar um sistema que está a 1000 km/h, normatizando regras para prevenir o ingresso ao sistema carcerário criando diversos tipos de garantias para o preso (que ainda não funcionam), para que, assim, possa mostrar a tentativa de oferecer um pouco de proteção aos presos que logo serão esquecidos pelo sistema, tornando-se, assim, “maiores abandonados”.

Pedro Magalhães Ganem

Especialista em Ciências Criminais. Pesquisador.

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