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Busca e apreensão em escritórios de advocacia

Busca e apreensão em escritórios de advocacia

Fruto de uma ilegítima confusão pelo Sistema de Justiça Criminal entre o advogado e o cliente, tem sido cada vez mais frequente, nos últimos tempos, expedições e cumprimentos de mandados de buscas e apreensões em escritórios de advocacia, não raro em desrespeito à forma legal.

Não é que as prerrogativas da defesa impeçam investigações criminais contra advogados, mas, antes, emprestam proteções em face de ilegítimas perseguições ao exercício da profissão.

Mas, afinal, quais os requisitos para a expedição e cumprimento do referido mandado em escritórios de advocacia?

Antes de iniciarmos, importante ressaltar que a Constituição Federal de 1988 insere no artigo 5º, XI, dentre os direitos fundamentais, a privacidade como fundamento da regra geral da inviolabilidade do domicílio para todo cidadão.

Contudo, a regra geral é que, havendo suspeitas de existência de objetos e/ou instrumentos de crimes, a lei autoriza a expedição do referido mandado de busca e apreensão (art. 241, CPP), desde que pela autoridade competente (juiz penal da investigação, art. 243, III, CPP) e, também, que seja pormenorizado e detalhado com os fins da diligência (art. 243, I e II, CPP).

Já para o advogado, além de indícios de prática de crime – frise-se, realizada pelo mesmo, e não por seu cliente –, deve-se acrescer as demais garantias do artigo 7º, II, §6º da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e OAB), consistentes, notadamente, na intimação da OAB com antecedência suficiente para viabilizar o envio de representante, preservando, ainda, os documentos (físicos e digitais) referentes aos clientes.

Assim dispõe o referido artigo 7º, II, §6º:

Art. 7º São direitos do advogado:

(…)

II – a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia;

(…)

§ 6o Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada, expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes.

Daí ser perfeitamente possível a expedição de um mandado de busca e apreensão a ser cumprido em um escritório de advocacia, desde que expedido por autoridade competente (juiz criminal), no bojo de uma investigação criminal em face de advogado que tenha pelo menos indícios de práticas de proibições penais, e que o cumprimento do mandado seja precedido de comunicação à OAB com antecedência hábil para envio de representante para acompanhamento.

Não obstante, o que se tem percebido, diariamente, é uma verdadeira criminalização da defesa, com expedições de mandados de busca e apreensões sem sequer investigação instaurada ou mesmo comunicação à OAB.

Como se não bastasse, não raro, o fundamento desses mandados – desavergonhadamente publicado pela grande mídia – é a curiosidade das autoridades em bisbilhotar fontes de pagamentos dos honorários advocatícios, tal qual se fazia na ditadura militar quando se suspeitava de “ligações comunistas” (sic) do advogado.

Assim, é imprescindível destacar que a inviolabilidade do escritório de advocacia, além de preservar a confidencialidade com o cliente – direito, sobretudo, do cidadão representado –, garante a mesma independência profissional que possui as demais autoridades públicas como delegados de polícia, promotores, procuradores, juízes, ministros etc.

E mais, cabível acrescentar ainda a agravante de que tais funções são públicas, e a advocatícia é privada, de tal sorte que esta merece, ainda, uma maior proteção, não percebida na prática autoritária brasileira que tem devastado, inescrupulosamente, a privacidade do cidadão.

Daí não ser suficiente o eventual (e futuro) reconhecimento, pelos Tribunais, de nulidades provenientes dessas buscas e apreensões, já que insuficiente para reparar os danos causados, como constrangimentos pessoais dos advogados e clientes, bem como sintomas de déficit democrático.

É importante unirmos a classe contra esses abusos e mobilizarmos as instituições de representação da advocacia (OAB, ABRACRIM, ANACRIM, IDDD etc.) para provocar as instituições (como o CNJ e Corregedorias) a tomarem medidas preventivas e talvez melhor capacitação profissional dessas autoridades assediadas pelo “clamor popular” (sic), ilegitimamente manipulado pela grande mídia.

Do contrário, hoje foi com o advogado criminalista; amanhã será no escritório do civilista, ambientalista, tributarista etc. para, por exemplo, fiscalizar os contratos; depois de um tempo, talvez, sem sequer mandado judicial, a receita federal comece a bater na casa de todo brasileiro para confirmar as declarações de I.R. e, assim, terminar de rasgar a privacidade constitucional!


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Núbio Mendes Parreiras

Mestrando em Direito Penal. Especialista em Ciências Penais. Advogado.

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