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“Checks and Balances System” nº 62/2020, do CNJ, denominado como “Recomendação”

“Checks and Balances System” nº 62/2020, do CNJ, denominado como “Recomendação”

Muito se tem escrito sobre as medidas editadas pelo CNJ, por meio da Recomendação nº 62, de 17/03/2020, decorrentes da pandemia do novo coronavírus (COVID-19), que gerou a necessidade de alterações na forma de cumprimento e execução das medidas socioeducativas de internação (incluindo as internações provisórias) e semiliberdade, prisão provisória, prisão definitiva e prisão civil.

Muito mais do que meras recomendações, o CNJ, dentro do sistema de freios e contrapesos, que decorre do artigo 2º, da Constituição Federal (Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário), está sinalizando a hermenêutica necessária diante de uma pandemia que bate às portas de uma estrutura prisional que se materializa num estado inconstitucional de coisas (Referência empregada pelo STF na decisão da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347/D).

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Assembleia das Nações Unidas, pela Resolução 217 A, de 10 de dezembro de 1948, proclama, em seus artigos 3º e 25, o direito à vida, à liberdade, à saúde e à assistência médica.

Na mesma direção, também são as disposições dos artigos 1º, 2º e 11, da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, aprovada na IX Conferência Internacional Americana de Bogotá, em abril de 1948, garantindo cuidados médicos a todo ser humano.

Por sua vez, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, aprovado em 1966 pela ONU e aderido pelo Governo Federal, através do Decreto nº 592, de 06 de junho de 1992, em seus artigos 6º, 7º, 10 e 26, impõe a proteção à vida, à liberdade, à igualdade e à saúde.

O Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, adotado e aberto a assinatura para ratificação e adesão pela Assembleia Geral (Resolução nº 2.200 A), de 16 de dezembro de 1966, a qual entrou em vigor em 23 de março de 1976, determina o direito à saúde, destacando-se as alíneas “c” e “d” do item “2”, do artigo 12, onde consta o dever do Estado quanto a PREVENÇÃO E O TRATAMENTO DAS DOENÇAS EPIDÊMICAS, ENDÊMICAS, PROFISSIONAIS E OUTRAS, BEM COMO A LUTA CONTRA ELAS.

A Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA), reformada pelos Protocolos de Buenos Aires em 1967; de Cartagena das Índias em 1985; de Washington em 1992; e de Manágua em 1993, estabelece, objetivando a paz, o bem-estar de todos e o progresso das civilizações, baseada na moral e na justiça, o propósito de uma intensa cooperação continental para a concretização de princípios voltados à proteção da humanidade. Em seu artigo 34, consta a defesa do potencial humano mediante a extensão e aplicação dos modernos conhecimentos da ciência médica.

Igualmente, o Decreto nº 678, de 06 de novembro de 1992, do Governo Federal, que promulgou a Convenção Americana sobre Direitos HumanosPacto de São José da Costa – de 22 de novembro de 1969, garante os mesmos direitos nos artigos 4º, 5º e 24.

Em harmonia com as normatizações de direito internacional que estabelecem fortes alicerces democráticos, a Constituição Federal de 1988 prevê, dentre os direitos individuais e sociais, a defesa da igualdade de direitos entre todos os cidadãos, garantindo a todos o respeito à dignidade da pessoa humana, à vida, à integridade física e moral e à saúde, com a proibição de tratamento desumano ou degradante, destacando-se o artigo 1º, II; o artigo 5º, III e XLIX; o artigo 6º e o artigo 196, que juntos formam um sólido arcabouço protetivo da saúde de todos, sem qualquer distinção.

A legislação infraconstitucional brasileira, representada pela Lei De Execução Penal (Lei nº 7.210/84), ratifica o direito da assistência à saúde dos presos provisórios e definitivos, através do artigo 11; artigo 14; e artigo 41, VII.

A Resolução nº 14, de 11 de novembro de 1994, editada pelo Presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), que estabelece as Regras Mínimas Para O Tratamento Do Preso No Brasil, contém, em seu Capítulo VII, denominado “Dos Serviços de Saúde e Assistência Sanitária”, regras específicas sobre a matéria, em seus artigo 15 usque 19. 

Inquestionável o direito à saúde dos enclausurados, bem como que o sistema penal não foi devidamente estruturado pelo Poder Executivo. O Brasil tem, como regra, um aparato prisional caótico por falta de investimentos voltados a efetivar as regras de execução penal e do ECA, como também o SUS não tem estrutura para combater o ingresso da pandemia nas unidades prisionais.

O mérito da Recomendação nº 62/2020 está em constituir-se de um verdadeiro sistema de freios e contrapesos, já que o Poder Executivo não tem a capacidade estrutural necessária para manter os aprisionados/apreendidos em segurança diante da crise mundial criada pelo novo coronavírus (COVID-19).

Em caráter nítido de excepcionalidade imposto pela pandemia, o CNJ mostra que o direito à vida e à saúde dos privados da liberdade são os bens jurídicos que devem prevalecer, ainda que o cumprimento das medidas socioeducativas e as prisões necessitem de adequações impostas pelo Poder Judiciário.


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Dévon Defaci

Advogado criminalista

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