O caso Moro-Dallagnol e o clamor dos punitivistas por garantias
O caso Moro/Dallagnol e o clamor dos punitivistas por garantias
Os operadores jurídicos do Direito Penal podem ser divididos em duas categorias muito genéricas: os punitivistas e os garantistas. Em termos também muito genéricos, podemos definir os punitivistas como aqueles que clamam pela ampliação do Direito Penal: penas mais duras, tipos penais mais abrangentes e variados, ainda que alguns direitos sejam desrespeitados. A necessidade da punição se sobrepõe aos direitos dos acusados. Já os garantistas clamam pelo respeito máximo aos direitos do acusado, ainda que algumas condenações se percam no caminho.
Como advogado criminalista, me alinho ao movimento garantista. O respeito aos direitos do acusado sempre me pareceu uma luta justa e necessária contra a sede punitivista. Sempre pensei que eu poderia estar no banco dos réus, sob uma falsa acusação, sendo condenado sem provas e etc. Qualquer um pode se sentar no banco dos réus.
Todos merecem o julgamento por um juiz imparcial, o direito ao contraditório e ampla defesa, etc. São direitos básicos que são muitas vezes interpretados como “meras irregularidades” que não são suficientes para desfazer a sagrada condenação do réu.
Me parece, porém, que esse exercício de alteridade não é feito pela turma punitivsta. Parece que ergueram um muro para dividir a sociedade: de um lado a sociedade do bem e do outro a sociedade irresponsável (como já comentaram em um dos meus artigos). Nessa constante guerra entre os dois lados, a sociedade do bem pode fazer de tudo para esmagar a sociedade irresponsável. Vale tudo para condenar.
Neste domingo (08/06/2019), o meu exercício meramente retórico (todos podem se sentar no banco dos réus) ganhou um exemplo real e, ao mesmo tempo, surreal. Sérgio Moro e Deltan Dallagnol, os paladinos da justiça e da imparcialidade, são expostos por meio do vazamento de conversas do aplicativo Telegram.
Nas conversas, fica clara que a atuação jurídica do ex-magistrado foi extremamente parcial e violou frontalmente o sistema acusatório que a nossa Constituição adota (apesar do CPP ter ficado para trás nisso).
Em poucas situações, é possível perceber de forma tão nítida algo muito básico: a sociedade não é dividida, a luta por garantias é também uma luta pela democracia. Absolutamente qualquer um pode ser acusado de algo, mesmo os acusadores e julgadores.
A incoerência nos argumentos em favor do procurador e do magistrado com a trajetória profissional de ambos é gritante: Invasão criminosa, invasão de privacidade, origem ilícita das provas, parcialidade do site The Intercept. Revoltadíssimos, clamam pelos direitos que negam para o outro lado da sociedade.
Onde está essa revolta, quando a polícia invade residências sem mandado? Ou quando um grampo ilegal é feito, gerando condenações e escrachamento público? E quando o depoimento do policial é considerado prova absoluta e irrefutável?
Mas não se preocupem, apesar de serem consideradas as suas maiores inimigas, as garantias processuais também valem para os punitivistas.
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