Os clubes de futebol na Lei de Lavagem de Dinheiro
Alguns processos de lavagem de dinheiro muitas vezes são dotados de extrema complexidade e sofisticação, o que pode dificultar ainda mais a identificação de um esquema de lavagem de dinheiro pelas autoridades competentes (Polícia, Ministério Público, Unidades de Inteligência Financeira etc.).
Nesse contexto é que são criadas as políticas de combate à lavagem de dinheiro, em que há a cooperação entre o setor público e o privado (BADARÓ e BOTTINI, 2013, p. 35), a fim de que a identificação de condutas suspeitas de lavagem seja facilitada.
O Brasil, especialmente, seguindo a linha da comunidade internacional, é signatário de diversos instrumentos internacionais relacionados ao combate à lavagem de capitais, como as Convenções de Palermo, Viena e Mérida (BADARÓ e BOTTINI, 2013, p. 37), e com isso, assumiu no plano internacional o dever de adotar políticas preventivas à lavagem no âmbito nacional.
Um sistema de prevenção à lavagem, conforme destaca Sérgio Fernando Moro (2010, p. 19)
(...) é fundado na imposição a entidades privadas da adoção e políticas internas que previnam sua utilização para lavagem de dinheiro. Tal política pode ser sintetizada com a obrigação da entidade privada de conhecer seu cliente. Conhecendo o cliente, a entidade privada estará preparada para prevenir a utilização de sua estrutura para a lavagem de dinheiro.
Com isso, a Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei n.° 9.613/98), no seu art. 9°, traz o rol de atividades consideradas sensíveis à lavagem, ou seja, as atividades econômicas com maior possibilidade de serem utilizadas em um esquema de branqueamento de capitais.
Dentre elas, o inciso XV, após as alterações trazidas pela lei n.° 12.683/12, passou a prever também as “pessoas físicas ou jurídicas que atuem na promoção, intermediação, comercialização, agenciamento ou negociação de direitos de transferência de atletas, artistas ou feiras, exposições ou eventos similares”.
Nesse contexto, pode-se dizer que os clubes de futebol estão inseridos nessa categoria esportiva e, portanto, estão sujeitos aos deveres de manutenção de registro dos clientes (prática do “conheça seu cliente”) e de comunicação de atividades suspeitas, conforme artigos 10 e 11 da mesma lei.
Nesse ponto, entendo acertada a posição do legislador ao colocar no rol de atividades sensíveis à lavagem, aquelas relacionadas à comercialização, agenciamento ou transferência de atletas; isso porque, é de conhecimento público que grandes quantias em dinheiro são movimentadas no mercado futebolístico, principalmente com as transferências internacionais de atletas, o que, por consequência, pode ser uma área chamativa para um esquema de lavagem de dinheiro.
Como melhor especificado por Callegari e Weber (2014, p. 38 e 39) com fundamento no relatório do Grupo de Ação Financeira Internacional (FATF/GAFI), por ser difícil precisar o preço da transação de um jogador, por exemplo, uma técnica de superavaliação de atletas pode ser aplicada para que o superfaturamento lave o capital ilícito.
Além disso, muitos clubes de futebol com dificuldades financeiras acabam ficando mais vulneráveis ao aceitarem investimentos de fundos duvidosos, simplesmente pelo fato de fazerem menos exigências dos investidores, por necessitarem de apoio financeiro.
Deste modo, tem-se que os clubes de futebol também estão sujeitos às obrigações impostas pela lei de lavagem (art. 10 e 11 da Lei n.° 9.613/98), dentre elas:
- a manutenção de cadastro atualizado de clientes, bem como o registro de transações em moeda nacional ou estrangeira, títulos e valores mobiliários;
- a manutenção de cadastro próprio junto ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF);
- adotar políticas, procedimentos e controles internos, que possibilitem a identificação de operações com indícios do cometimento do crime de lavagem; e
- a comunicação ao COAF de atividades suspeitas de lavagem.
Tratam-se de medidas que podem ser atendidas mediante um bom programa de cumprimento de regras a ser implantado dentro dos clubes brasileiros; e que, a meu ver, contribuirão para a boa imagem dos clubes e de sua gestão, bem como para uma maior transparência dentro das operações realizadas no setor futebolístico.
REFERÊNCIAS
BADARÓ, Gustavo Henrique; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Lavagem de Dinheiro: aspectos penais e processuais penais. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
CALLEGARI, André Luis; WEBER, Ariel Barazzetti. Lavagem de Dinheiro. São Paulo: Atlas, 2014.
MORO, Sergio Fernando. Crime de lavagem de dinheiro. São Paulo : Saraiva, 2010.