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Colegas advogados, deixem a esfera criminal para quem é realmente criminalista!

De um tempo para cá, venho observando que alguns advogados que não são criminalistas tentam, uma vez ou outra, aventurar-se no mundo do direito criminal. Vejo como um ato bem arriscado, beirando à irresponsabilidade, caso a imersão seja abrupta e sem um aprendizado anterior.

Quantas vezes já não vi uma Queixa-crime sem conduta individualizada, sem a tipificação correta, não obedecendo ao artigo 44 do Código de Processo Penal?

Ontem dei uma entrevista para a TV do Superior Tribunal de Justiça e me esforcei ao máximo para falar em uma linguagem simples da diferença entre estelionato e furto mediante fraude na adulteração de medidor de energia e sobre a brilhante tese levantada pela Defesa e acatada pelos ministros em relação à extinção da punibilidade de furto mediante fraude à concessionária de serviço público pelo pagamento do débito antes do oferecimento da denúncia em analogia ao que acontece com os crimes tributários.

Revisei semana retrasada o Habeas Corpus e suas inúmeras facetas e aplicações em Tribunais Superiores.

Estou me preparando já tem 1 mês para um Júri. Mesmo no automático, a cabeça continua girando e pensando.

Estou revisando bastante jurisprudência, pois decidi ser professor e percebi o quanto existe ainda para se aprender. O aprendizado é constante e em todos os turnos do dia.

Delito transeunte, delito de tendência interna transcendente, delitos plurisubjetivos, delitos plurisubsistentes, teoria monista temperada no concurso de pessoas, requisitos para a aplicação do princípio da insignificância, causas diversas de extinção da punibilidade, o que é uma causa de aumento de pena, o que é uma agravante, concausas relativamente independentes, erros de tipo, erros de proibição, suspensão condicional do processo, suspensão condicional da pena, tipicidade gera uma presunção de ilicitude e inverte relativamente o ônus da prova para a defesa, Defesa deve sempre falar por último nos autos, como instruir seu cliente no interrogatório, como questionar as testemunhas, quando saber ficar em silêncio, como fazer uma boa sustentação oral, como atender bem o cliente e a família do cliente, o que pode levar para o cliente que está preso, o que fazer em uma audiência de custódia, como lidar com o Ministério Público, quando cabe RESE, o que é ROC, quando impetrar um HC substituto de recurso especial, quando utilizar a reclamação, o que é um partícipe e como saber utilizar tal instituto, teoria da consunção, princípio da imitatio veri em crimes de falsidade, furto de uso, como desconstituir a qualificadora da surpresa em um crime de homicídio, como atrasar um processo visando à prescrição, como calcular uma prescrição em concreto, como se dá a progressão de regime, em que casos instruir a confissão visando a uma redução da pena, o que é ação penal subsidiária da pública, requisitos para a legítima defesa, bis in idem, prisão preventiva para garantir ordem pública pode ser decretada com base no modus operandi do crime ou com fundamento na gravidade abstrata do delito? O que é o excesso de linguagem na pronúncia. E a Teoria da cegueira deliberada. Crimes hediondos e suas repercussões práticas. Quando se consuma o furto?

Será que fui claro da dificuldade que é advogar em direito criminal?

Não digo isso para me vangloriar ou dizer o quanto é necessário trabalhar. Mas digo isso para mostrar que é necessária muita dedicação para se assumir uma defesa criminal. Os institutos são inúmeros e possuem especificidades cobertas que apenas os advogados criminalistas conseguem perceber.

Estamos lidando com a liberdade de pessoas. Não é qualquer bem a ser defendido. O sujeito que for preso sofrerá as principais restrições da sua vida: o convívio com sua família, com amigos, o direito de labutar em seu local habitual de trabalho, um ato inesperado em suas finanças, etc.

Por tudo isso, digo em alto e bom tom: caros advogados aventureiros, os Doutores não são bem vindos. E digo isso não apenas para o bem da sociedade, mas, inclusive, para seu próprio bem. Seus custos serão altíssimos para a compreensão de institutos bem difíceis, a frustração de um trabalho mal feito é desolador e lidar com cliente que é Réu pode colocar sua própria segurança em risco.

Inclusive, às vezes, vejo que um colega que não é advogado criminalista me liga para perguntar dúvidas sobre o processo que ele decidiu patrocinar. Infelizmente, muitas vezes, não posso ajudar. A um, porque surgirão inúmeras outras dúvidas, a dois, porque corre o risco de ele falar para o cliente que foi o Dr. Ivan Morais quem disse aquilo, algo que, na verdade, o colega pode ter entendido de modo equivocado.

Por tudo isso, colegas advogados, deixem o Direito Criminal para advogados criminalistas e amigos criminalistas, sintam-se à vontade para compartilhar esse artigo na timeline de vocês, pois acredito que faz bem ratificar tal lição:  deixem a esfera criminal para quem é advogado criminalista.


P.s.: andei um pouco afastado, pois estou em fase de criação de um canal para lecionar algumas lições de Direito Criminal. Acompanhem no instagram: @profivanmorais. Forte abraço!

Ivan Morais Ribeiro

Advogado. Especialista em Ciências Criminais. Membro da Comissão de Direito Constitucional da OAB/DF.

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