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O comportamento da vítima na mensuração da culpabilidade criminosa

O comportamento da vítima na mensuração da culpabilidade criminosa

A individualização da pena mediante sua fixação fomenta-se a teor objetivo em diversos aparatos normativos do ordenamento jurídico pátrio.

No entanto, embora se finque entre os artigos e dispositivos do Código Penal, a compreensão desse instituto pauta-se mais intensamente em elementos subjetivos, principalmente quando se tem em vista a fase primária do método trifásico de fixação da pena, reverenciada pela procedimentalidade adotada no artigo 59 do Código Penal Brasileiro.

A norma materializada por esse dispositivo elenca critérios que demarcam diversas esferas do crime, não somente em suas perspectivas fáticas, mas também circunstanciais, e além dessas, aquelas que podemos denominar por subjetivo-individuais, que alcançam não somente a pessoa do delinquente, mas também a pessoa atingida pela prática criminosa, o ofendido ou a vítima.

Nisto, pois, no campo normativo, o art. 59 preceitua em seu caput elementos que podem compor e integrar o contexto criminal, que em um primeiro momento, desemboca na concreta fixação da pena. Dentre os enumerados, menciona-se o comportamento da vítima como preceito influenciador para a realização da tarefa de cominar a pena, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime.

Na atividade de fixação da pena, em sua primeira fase, considera-se hodiernamente como um dos elementos a serem analisados, a própria vítima, referindo-se especificamente ao seu comportamento como fator que prepondera na realização dessa mensuração.

Guilherme de Sousa NUCCI (2015) conceitua esse comportamento como o modo de agir da vítima que pode contribuir para levar o agente à prática do crime. Com a devida venia, não deveria se mencionar em definição uma relação de contributo da vítima para com o criminoso, visto que a contribuição para a realização do crime se dá na prática em concurso entre agentes mutuamente ou simultaneamente delinquentes.

Assim, o comportamento da vítima deve ser visto, por vezes, como fator influenciador e não como real e efetivo contributo, pois caso a análise da vítima no contexto do crime fuja desses parâmetros, pode ela incorrer em culpabilidade, que originariamente ou em regra, não lhe pertence.  

Decerto, a culpabilidade da vítima, em outras vias de análise, pode se constituir no caso de partir dela a injusta provocação, caso em que ensejará a absolvição do réu.

O mesmo ocorre em caso de “falsa vítima”. Ainda assim, faz-se salutar que se avalie a ocasional atitude imprudente da vítima parcialmente culpável para a proporcionalidade da pena e sua justa mensuração em prol de seu destinatário.

Deve-se analisar a questão da culpabilidade a partir dos dois polos do contexto criminoso, sem que nenhuma dessas análises resulte em atribuições exorbitantes, de maneira que não haja sobrecarga para qualquer dos lados, tanto para que não se incorra na estigmatização da vítima, e também para que o dimensionamento da pena destinada ao agente autor do crime, em seu quantum, não seja exacerbada no momento de sua fixação.

Destaque-se que a pureza da norma não é suficiente para condicionar a análise da vítima no contexto criminoso. Eis, assim, o proveito da Vitimologia como campo de potenciais estudos para a análise do contexto criminoso, na definição do alcance e do limite de culpabilidade do próprio autor da conduta desvirtuada, de forma a sopesar o comportamento da vítima e sua conduta, não como contributo para a prática criminosa do agente, como muitos doutrinadores e estudiosos descrevem, mas como influenciador por si só.

É necessário, portanto, que o comportamento do ofendido, ao ser interpretado, seja analisado tomando-se por base conjunto de fatores e de fontes, não apenas aquelas de cunho positivo ou principiológico comumente utilizados, mas também da Vitimologia figurada na Criminologia.

A atividade de fixação da pena, mais que sabidamente, não é um exercício matemático por comportar números nos preceitos secundários de cada tipo penal, mas sim uma prática que requer uma apuração ampla dos mais diversos fatores, sejam eles fáticos ou circunstanciais, ou mesmo que tenham laços com outros campos científicos, a exemplo da Vitimologia, pois como acreditava Mendelsohn, é esta última um novo caminho biopsicossocial a ser explorado principalmente pelo Direito Penal, pela Criminologia e pela Psiquiatria.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

JESCHECK, Hans-Heinrich; WEIGEND, Thomas. Tratado de derecho penal – Parte genera. Trad. Miguel Olmedo Cardenet. Granada: Comare, 2002;

FERNANDES, Valter; FERNANES, Newton. Criminologia Integrada. 4. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012;

NUCCI, Guilherme de Souza. Individualização da Pena. 7. Ed. Rio de Janeiro Forense, 2015.

Juliana Silva de Carvalho

Estudante de Direito da Universidade Federal do Ceará

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