Contrafação: tutela penal dos direitos autorais
Por Coriolano Camargo e Cristina Sleiman
Escrever sobre Direitos Autorais é um desafio na sociedade digital, pois de um lado temos quem lute pela liberdade e compartilhamento irrestrito de todo e qualquer conteúdo e de outro temos os autores que querem proteger seus direitos.
Nem todo autor objetiva fins financeiros com suas obras, mas é certo que todo autor preza pela sua integridade e indicação de autoria. Mas não podemos esquecer que muitas vezes se trata de sua fonte de renda para subsistência.
Temos alguns cenários, pois infração ao direito de autor não se limita ao plágio ( ainda que por sua definição simplista de usar texto de outrem como se fosse próprio) ou ao uso sem autorização de obras intelectuais em trabalhos ou publicidades, mas também a cópias e distribuição de filmes, jogos, músicas, etc, sem a devida autorização do detentor dos direitos patrimoniais.
Historicamente o uso não autorizado de obras alheias existe desde os primórdios da civilização, pois embora não estivesse expressamente em lei existia uma condenação pela opinião pública, ocorrendo o desprezo pela comunidade.
Na antiguidade, citando o Direito Romano ( SOUZA 2003), entende-se pela derivação da palavra latina plagium, originada do grego plágios que por sua vez era utilizada para a venda fraudulenta de escravos ou roubo de uma pessoa que era propriedade de outra (servo ou escravo)[1].
Segundo Clovis Beviláqua[2], um dos mais antigos documentos de repressão à contrafação foi a ordenança de Nurenberg de 1963 ( Alemanha), independente de o autor gozar de privilégios, seguida por decisão do Senado de Frankfurt ( 1660).
No Brasil a contrafação (reprodução não autorizada) é tutelada desde o primeiro Código Penal brasileiro.
O Decreto 5.244/2004 dispõe sobre a composição e funcionamento do Conselho Nacional de Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual, e dá outras providências. Define em seu artigo primeiro, parágrafo único o que se entende por pirataria:
Entende-se por pirataria, para os fins deste Decreto, a violação aos direitos autorais de que tratam as Leis no. 9.609 e 9.610, ambas de 19 de fevereiro de 1998.
Portanto, a violação à Lei de Software e à Lei de Direitos Autorais, no sentido de cópias e distribuição não autorizada caracteriza a pirataria, conforme previsto no respectivo Decreto.
Considerando que o Direito do Autor tutela a possibilidade que o individuo tem de dispor sobre sua obra do intelecto, portanto, controlar o uso e exploração de sua obra, incluindo reprodução, edição, comercialização, entre outros, pode-se dizer que autor é o ser humano, pessoa física quem cria a obra, não podendo recair sobre a pessoa jurídica este título, mas tão somente o de detentor dos direitos patrimoniais.
O Direito de Autor divide-se em Direito Moral e Direito Patrimonial, sendo que no primeiro caso, trata-se dos direitos ligados à sua personalidade como, por exemplo, o de ter seu nome ou pseudônimo na obra, no segundo trata-se do direito de dispor e comercializar a obra que por sua vez pode ser cedido a outrem incluindo pessoa jurídica, mediante pagamento ou não.
Art. 24. São direitos morais do autor:
I – o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;
II – o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra;
III – o de conservar a obra inédita;
IV – o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;
V – o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada;
VI – o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem;
VII – o de ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se encontre legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meio de processo fotográfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservar sua memória, de forma que cause o menor inconveniente possível a seu detentor, que, em todo caso, será indenizado de qualquer dano ou prejuízo que lhe seja causado.
§ 1º Por morte do autor, transmitem-se a seus sucessores os direitos a que se referem os incisos I a IV.
§ 2º Compete ao Estado a defesa da integridade e autoria da obra caída em domínio público.
§ 3º Nos casos dos incisos V e VI, ressalvam-se as prévias indenizações a terceiros, quando couberem.
Já o direito patrimonial:
Art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica.
Tendo em vista o preceito constitucional de que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal, mister se faz a tipificação em lei dos atos que afrontem e violem os direitos autorais.
As violações ao Direito de Autor podem ser ilícitos cíveis ou criminais. A própria Lei de Direitos Autorais (LDA) traz em seu corpo as sanções cíveis, sendo que no Código Penal foi mantido a norma penal em branco, cuja necessita de um texto legal extrapenal que a complemente[3]. Portanto, somente será possível saber se houve violação ou não aos direitos de autorais mediante especificação da LDA :
Art. 184. Violar direitos de autor e os que lhe são conexos:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.
§ 1º Se a violação consistir em reprodução total ou parcial, com intuito de lucro direto ou indireto, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem os represente:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 2º Na mesma pena do § 1º incorre quem, com o intuito de lucro direto ou indireto, distribui, vende, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta, tem em depósito, original ou cópia de obra intelectual ou fonograma reproduzido com violação do direito de autor, do direito de artista intérprete ou executante ou do direito do produtor de fonograma, ou, ainda, aluga original ou cópia de obra intelectual ou fonograma, sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente.
§3º Se a violação consistir no oferecimento ao público, mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário realizar a seleção da obra ou produção para recebê-la em um tempo e lugar previamente determinados por quem formula a demanda, com intuito de lucro, direto ou indireto, sem autorização expressa, conforme o caso, do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor de fonograma, ou de quem os represente:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 4º O disposto nos §§ 1o, 2o e 3o não se aplica quando se tratar de exceção ou limitação ao direito de autor ou os que lhe são conexos, em conformidade com o previsto na Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, nem a cópia de obra intelectual ou fonograma, em um só exemplar, para uso privado do copista, sem intuito de lucro direto ou indireto.
Não se pode esquecer que a proteção não se limita apenas ao direito de autor, mas também aos que lhe são conexos, como por exemplo, o interprete.
A tipificação está na utilização de obra alheia sem o consentimento de quem é devido, ou seja, do autor ou detentor de direitos autorais caso o autor tenha lhe cedido.
Para caracterização de ilícito penal não há necessidade de que o ato tenha sido com fins lucrativos, ou seja, visando lucro, mas este detalhe ensejará mudança na pena, conforme preceitua o artigo transcrito anteriormente.
Portanto, poderemos nos aprofundar em artigos futuros, mas o intuito neste momento é conscientizar os usuário de tecnologia que para configuração da infração de direitos de autor, basta seu uso sem consentimento, não sendo a mera publicação em mídias digitais, uma autorização tácita. Para uso, edição, etc, será necessário entrar em contato e pedir autorização.
Para a questão de pirataria é muito importante trabalhar a conscientização da população, bem como trabalhar valores, direitos e deveres, pois muitos usuários “pecam” por falta de conhecimento e/ou negligência, embora sempre exista aquele que faz por vontade própria sabendo das possíveis consequências, mas acreditando que não serão pegos.
[1] Apud PIMENTA, Eduardo e PIMENTA, Rui Caldas– Dos Crimes Contra Propriedade Intelectual – 2ª Ed. Revisada, Editora Revista dos Tribunais – 2005.
[2] Apud LEITE, Eduardo Lycurgo. Plágio e Outros Estudos em Direito de Autor. Editora Lumen Juris. 2009.
[3] Idem 1.