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Convencimento e persuasão no Tribunal do Júri

Convencimento e persuasão no Tribunal do Júri

Ao estudar convencimento ou persuasão, deve-se perceber que a matéria prescinde a atuação dos profissionais de Direito. A necessidade do convencimento e de transmitir adequadamente o conteúdo faz parte da vida do advogado e, claro, das pessoas em geral (a persuasão está presente diariamente nas relações sociais, na política, no namoro, na negociação, no marketing e, claro, nas tomadas de decisão).

Entender seus aspectos e elementos que influenciam os julgadores pode ser a diferença, durante o julgamento ou um processo, de o acusado ser absolvido ou condenado.

Existem diversas pesquisas que estudam os mecanismos mentais envolvidos na tomada de decisão, bem como sobre fatos que podem influenciar os jurados, como: a atratividade, a credibilidade, a forma de falar, de se postar, os tipos de argumentos, mecanismos de neutralização de argumentos contrários, dentre outros.

Contudo, me proponho a analisar a matéria a partir de dois recortes temáticos: (1) o fato de que falar por último é uma desvantagem pelo aspecto cognitivo e (2) a janela de abertura no início da sustentação.

1. Desvantagem de falar por último: “efeito de primazia” ou “efeito âncora”

Conforme algumas pesquisas científicas demonstram há algum tempo (veja, por exemplo, o estudo clássico de Englich et al em 2005), em um processo dialético, como no tribunal do júri, aquele que fala primeiro leva vantagem, pois quando o jurado toma uma decisão, mesmo que precária, dois efeitos ocorrem inconscientemente:

(a) Primeiramente o julgador passa a buscar elementos que corroborem com a sua decisão prévia. Então ele se lembra dos depoimentos, do que leu no processo no decorrer do julgamento, na expressão do acusado, dentre outros. Fatos que são buscados no intuito de confirmar seu ponto de vista.

(b) Em segundo lugar ocorre a tendência de refutar todos os argumentos e elementos que sejam contrários a essa decisão. Isso deriva pelo fato de que ninguém quer entrar em “dissonância cognitiva”, isto é, pensar que sua própria decisão estava errada.

No ordenamento jurídico brasileiro (e, na verdade, em praticamente todos os ordenamentos jurídicos do mundo), o promotor fala antes que a defesa, o que faz com que, normalmente, os jurados façam julgamentos prévios logo quando da apresentação da acusação. 

Sendo assim, em um julgamento, a defesa não apenas precisa convencer os jurados no decorrer do seu tempo de fala, como também precisa desconstruir a íntima deliberação anterior.

Considerando o procedimento adotado pelo júri brasileiro, são dois efeitos difíceis de se mitigar. Uma alternativa é a defesa fazer um esforço para apresentar a sua tese e buscar convencer os jurados antes mesmo dos debates. Assim como muitos advogados já o fazem, o ideal seria desenvolver perguntas para as testemunhas e para o acusado de forma a concatenar logicamente suas teses defensivas, deixando claro qual é a tese, bem como apresentando os elementos de prova que a confirma.

2. A janela de oportunidade

Algumas pesquisas demonstram que o mesmo interlocutor consegue manter a atenção focada do receptor (plateia, jurados, alunos) por um período que varia entre 20 e 40 minutos.

Indo além, outros estudos indicam que os primeiros minutos de uma apresentação no julgamento (entre 2 e 5 minutos) são “janelas de oportunidade”. Nos Estados Unidos ocorrem nos conhecidos opening statements. Estudos bem sedimentados desde a década de 80 trabalham com o tema.

Trata-se de um período curto em que os jurados percebem as primeiras impressões, estão mais focados e mais propensos a entender alguns argumentos.

No ritual do tribunal do júri, no início da sustentação ocorrem normalmente os cumprimentos de praxe, o que faz com que não se utilize esse tempo para manifestar premissas sobre a tese defensiva. Sabe-se que os cumprimentos são importantes, até mesmo para baixar a adrenalina para sustentar. Entretanto, pelo aspecto neurocientífico da persuasão, é mais interessante utilizar esse primeiro momento para impactar os jurados.

Dessa forma, a dica é para apresentar uma história que envolva os jurados – um caso similar com a mesma tese defensiva, por exemplo –, de modo com que esses primeiros minutos aqueles sejam impelidos a pensar sobre o que foi explicitado. Logo após, inicia-se o ritual do cumprimento normalmente, salientando a importância de cada um dos envolvidos no julgamento. Todavia, enquanto os cumprimentos estiverem sendo declamados, os jurados estarão refletindo sobre o relato dito no início.


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Rodrigo Faucz

Professor do Programa de Mestrado em Psicologia Forense (UTP) e de Processo Penal da FAE Centro Universitário. Doutor em Neurociências pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre em Direitos Fundamentais e Democracia. Pesquisa a formação da convicção de julgadores e processos básicos de memória a partir das Neurociências. Advogado criminalista.

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