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A ausência de decisão sobre a conversão do flagrante em prisão preventiva

A ausência de decisão sobre a conversão do flagrante em prisão preventiva

Com a alteração promovida pela Lei nº 12.403/11 sabe-se que o entendimento de que o flagrante prende por si só foi afastado, na medida em que impôs ao juízo singular, após concluído o auto de prisão em flagrante pela autoridade policial, a adoção de uma das hipóteses descritas no artigo 310 do Código de Processo Penal.

Ou seja, o magistrado no momento do recebimento do auto de prisão flagrante deverá relaxar a prisão em caso de ilegalidade ou converter a prisão em preventiva ou conceder liberdade provisória, com ou sem fiança:

Art. 310.  Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:

I – relaxar a prisão ilegal; ou

II – converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou

III – conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.

Ocorre que alguns magistrados diante da legalidade do flagrante apenas homologam o auto sem decidir sobre a conversão da prisão, deixando a pessoa “presa em flagrante” até que o Ministério Público se manifeste sobre a segregação para aí decretar ou não a prisão, porém até lá o flagrado seguirá preso qualquer decreto prisional para tal.

Entretanto, como já mencionado, somente o auto de prisão em flagrante não prende, sendo absolutamente indispensável decisão fundamentada da autoridade judicial a respeito da situação de liberdade ou não do flagrado, restando clara a impossibilidade de manter o agente preso sem decisão sobre a conversão da prisão em preventiva, pois em evidente afronta ao artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal.

Em algumas oportunidades já se manifestou o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em casos de ausência de decisão sobre a conversão do flagrante em preventiva. Vejamos:


HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. PORTE DE ARMA. LIBERDADE CONCEDIDA. Paciente preso em 29 de maio de 2018, na posse, em tese, de 180g de maconha, 1 revólver calibre 38 e munições. Prisão que ocorreu no dia 29 de maio de 2018, às 16h. Auto de prisão em flagrante homologado apenas em 30 de maio, tendo sido data vista ao Ministério Público, sem ter sido decretada a prisão preventiva. Paciente preso desde 29 de maio de 2018 sem decreto de prisão preventiva, em desconformidade ao texto expresso do artigo 310 do Código de Processo Penal. Auto de prisão em flagrante que, embora homologado, não prende por si só, sendo absolutamente indispensável decisão fundamentada da autoridade judicial competente. Ausência de decisão fundamentada de autoridade judicial competente decretando a prisão preventiva que torna a prisão ilegal. Parecer do Ministério Público pela concessão da ordem. ORDEM CONCEDIDA. LIMINAR RATIFICADA (Habeas Corpus Nº 70077898807, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Diogenes Vicente Hassan Ribeiro, Julgado em 20/06/2018)


HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. DECISÃO QUE HOMOLOGA AUTO DE FLAGRANTE E DEIXA DE DECIDIR SOBRE A CONVERSÃO DA PRISÃO EM PREVENTIVA, ABRINDO VISTA AO MINISTÉRIO PÚBLICO. PACIENTE PRESO HÁ SETE DIAS SEM DECISÃO SOBRE A CONVERSÃO DA PRISÃO EM PREVENTIVA. IMPOSSIBILIDADE. RELAXAMENTO QUE SE IMPÕE. LIMINAR QUE VAI CONFIRMADA, COM APOIO MINISTERIAL NESTA INSTÂNCIA. Ordem concedida (Habeas Corpus Nº 70072606403, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Batista Marques Tovo, Julgado em 08/03/2017).


HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. AUSÊNCIA DA CONVERSÃO EM PRISÃO PREVENTIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. O artigo 310 do CPP, com a nova redação conferida pela Lei 12.403/2011, determina que a prisão em flagrante seja convertida em prisão preventiva, na hipótese de não relaxamento do flagrante e quando não for o caso de liberdade provisória, com ou sem fiança. Reconfirmado o término da autonomia da prisão em flagrante. A prisão em flagrante não deve prender por si só. Ilegalidade manifesta. Concederam a ordem (Habeas Corpus Nº 70044259612, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francesco Conti, Julgado em 18/08/2011).


Assim, quando o juízo ao examinar o auto de prisão em flagrante omitir-se em apreciar a necessidade da prisão para conceder liberdade provisória ao flagrado ou decretar-lhe a custódia preventiva e apenas limitar-se a declarar a legalidade do flagrante e homologá-lo, o juízo age em desacordo com lei, de maneira que torna ilegal a custódia.

Portanto, diante de ausência de decretação para a segregação cautelar, implicando em manifesta ilegalidade da prisão, deve-se buscar através de Habeas Corpus medida de urgência para ser concedida imediatamente liberdade e cessar o quanto antes o constrangimento ilegal que está sendo imposto à pessoa presa sem decreto prisional.

Ana Luíza Teixeira Nazário

Especialista em Ciências Penais. Advogada criminalista.

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