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Dark Number: a verdade perdida nas sombras

Dark Number: a verdade perdida nas sombras

A assim chamada Teoria da Associação Diferencial é resultado do gênio criador do renomado sociólogo estadunidense Edwin Hardin Sutherland (1883-1950). Tal teoria sociológica da Criminologia se refere à análise da formação do comportamento criminoso, tendo como referência apenas o aspecto social, desconsiderando os motivos que possam ter levado o indivíduo a cometer crimes.

Nesse contexto, Sutherland concebeu as chamadas “cifras criminais”, expressão usada para definir aqueles crimes executados por determinados tipos de agentes criminosos que não são computados nas estatísticas governamentais, em razão da falta de comunicação às autoridades responsáveis ou que, mesmo quando comunicadas, não obedeceram os ritos exigíveis para consequente responsabilização dos criminosos.

Divididas em cores classificatórias que levam em consideração as circunstâncias do crime, a(s) vítima(s) ou o(s) autor(es), as cifras criminais têm o condão de organizar e sistematizar as ocorrências delituosas a partir desses parâmetros preconcebidos. Em seu bojo, destaca-se a chamada “cifra negra” ou “dark number”.

Essa cifra pode ser considerada a base de todas as demais, já que seu conceito se relaciona aos crimes que não são registrados, ficando fora do radar estatístico e, por via de consequência, resultando em impunidade para os infratores. Seu conceito aproxima-se muito da própria definição de cifras criminais e por isso, acaba por servir de alicerce doutrinário para todas as demais cifras. Isto posto, torna-se oportuno trazer para esta análise a lição esclarecedora do professor, pesquisador, escritor e brilhante advogado Juarez Cirino dos SANTOS (2006, p. 13): 

… A cifra negra representa a diferença entre aparência (conhecimento oficial) e a realidade (volume total) da criminalidade convencional, constituída por fatos criminosos não identificados, não denunciados ou não investigados (por desinteresse da polícia, nos crimes sem vítima, ou por interesse da polícia, sobre pressão do poder econômico e político), além de limitações técnicas e materiais dos órgãos de controle social.”

Sigamos em frente então.

Dado o exposto, não podemos perder de vista que a notitia criminis deve chegar à autoridade policial para que ela possa promover a investigação criminal correspondente, visando reunir provas para municiar o Ministério Público.

Dark Number

Cumprida essa etapa, o Parquet poderá diante de tudo o que for levantado e com norte na lei, denunciar ou não o investigado. Nesse diapasão, temos que a investigação policial deve ser promovida com eficiência, isenção e rigor sob pena de responsabilização dos órgãos de segurança pública por terem contribuído de forma indireta para a impunidade dos infratores. Essa impunidade é justamente o nefasto resultado da cifra negra.

Considerando todas essas informações, resta dizer que algumas medidas urgentes devem ser tomadas para lançar luz a esses crimes que permanecem escondidos nas sombras da cegueira estatística.

Não há como trabalharmos nós, operadores do Direito, de forma científica diante de um quadro que nos mostra uma paisagem que não existe, estamos trabalhando muita das vezes entorpecidos por uma espécie de “canto das sereias” e nossa embarcação corre grande risco de naufragar. Somos “Davis” enfrentando um Golias de proporções imensuráveis, desconhecemos o inimigo contra o qual estamos lutando e dessa forma, estaremos fadados a perder a batalha.

O aperfeiçoamento dos mecanismos de captura de informações concernentes aos crimes potencialmente passíveis de investigação, o aprimoramento das investigações policiais e investimentos estatais direcionados de forma inteligente ao preparo técnico dos atores envolvidos no processo de apuração criminal poderá romper com todo esse viés ilusório que as estatísticas tortas nos trouxe até os dias atuais. 

A história tem nos ensinado que no âmbito da justiça, informações interpretadas de forma equivocada – sobretudo as que se referem a investigações criminais – podem levar ao caos.

Tenho pra mim que a ausência delas também.


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