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Diante da dor dos outros

Diante da dor dos outros

Susan Sontag nos brindou com texto assim intitulado, a partir do qual retoma sua contribuição estética analisando fotografias de guerra.

A problemática aproximada é a seguinte: o que sentimos quando olhamos aquelas fotografias, por exemplo, do holocausto? Judeus nus ou uniformizados, magérrimos esqueléticos, enfileirados no campo de concentração, sob olhar desolado, inanimado.

dor judeus
Judeus no campo de concentração

O monstro moral que se torna quem com essas fotografias não sofre, não sente repugnância, não luta para extinguir esse fenômeno, não milita na causa… (cf. Virginia Woolf), dada toda nossa condição humana, resulta de uma inércia política que pode parecer desumana, porém, é absolutamente humana e natural. Nada é mais humano e natural do que estar inerte diante da dor dos outros.

A rigor, imagens de corpos, tortura, cadáveres, suscitam certa curiosidade ou “interesse lascivo”. Diz Sontag: não é a curiosidade que faz o trânsito ficar mais lento na cena de um acidente, e sim a imagem que ele, acidente, tem a oferecer.

São as imagens, expressas ou mentais, que nos fazem ler/ver o noticiário criminal nos jornais, programas, filmes e séries que tratam da morte ou do crime de um modo geral. Pois o fato sem imagem é nulo perante a curiosidade vendável: mais vale a ópera que a música; o filme que a trilha sonora.

Todavia, o principal aspecto dessa catarse está inserido na dinâmica de regozijo sobre a dor dos outros.

Simplesmente: não sou eu! Isso não é comigo, é com o outro!

E sendo com o outro, todos os meus sofrimentos se reduzem ou se anulam, pois eu não estou e guerra, eu não levei um tiro nem fui roubado, eu não estou sangrando!

O espetáculo do horror, na minha TV ou no meu smartphone, está, afinal, longe de mim.

André Peixoto de Souza

Doutor em Direito. Professor. Advogado.

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