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Direito Penal e criminalização de condutas capazes de lesionar bens jurídicos

Direito Penal e criminalização de condutas capazes de lesionar bens jurídicos

Prima facie, há que se destacar que o Direito Penal é de suma importância para existência do controle social, visto que, ao mencionar controle social, um dos elementos que o compreende é a existência de sanções legais e/ou sociais. Tal controle é de grande valia para a sociedade, vez que a função primordial é a garantia de pressuposição de modelos e normas sociais.

Partindo da concretização do controle social realizado por normas legais, é imperioso a compreensão de que o controle penal visa a responsabilizar penalmente fatos que insurgem risco próprio ou alheio. 

Em que pese tal afirmação, há que se destacar que o Direito Penal somente atua quando os demais ramos do direito não são suficientes para a proteção dos bens jurídicos, ou seja, é a ultima ratio. O Direito Penal possui caráter subsidiário e fragmentário, sendo certo que sua intervenção somente se concretiza quando o bem jurídico tutelado possui relevância jurídica, por força do princípio da intervenção mínima.

Uma forma de verificar se o bem jurídico possui tamanha relevância jurídica é partir das reais exigências da vida social, bem como de seu valor pecuniário.

Frisa-se que os bens jurídicos penais não precisam estar expressamente descritos no texto constitucional, entretanto, é inconteste que os referidos bens jurídicos devem estar em perfeita sintonia com o previsto na Carta Magna.

O doutrinador Rogério Greco, define sobre a seleção dos bens jurídicos penais, in verbis:

Sendo a finalidade do Direito Penal a proteção dos bens essenciais ao convívio em sociedade, deverá o legislador fazer a sua seleção. Embora esse critério de escolha de bens fundamentais não seja completamente seguro, pois que nele há forte conotação subjetiva, natural da pessoa humana encarregada de levar a efeito tal seleção, podemos afirmar que a primeira fonte de pesquisa encontra-se na Constituição Federal. (GRECO, 2017, p. 36)

Devemos nos rememorar que a Constituição Federal guarnece uma série de valores de que o Direito Penal não poderia “remar contra a corrente”, servindo estes de fundamento e direção para o legislador. Neste ponto, trata-se de mera política criminal, onde a vontade do legislador impera, ou seja, através de política criminal se institui normas punitivas.

Como é possível precisar se determinado bem possui relevância jurídica? Ora, há uma pluralidade de situações econômicas, sendo que, ao compararmos um veículo popular propriedade de um milionário, possivelmente a res furtiva será ínfima ao comparado a seu patrimônio. Será que merecia atenção do Direito Penal?

Noutro giro, há que se sustentar quais são os requisitos para a verificação do princípio da insignificância, sendo eles: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressiva lesão jurídica provocada.

O doutrinador André Estefam e Victor Eduardo Rios Gonçalves, define o conceito do princípio da insignificância ou da bagatela, in verbis:

O Direito Penal, num ambiente jurídico fundado na dignidade da pessoa humana, em que a pena criminal não constitui instrumento de dominação política ou submissão cega ao poder estatal, mas um meio para a salvaguarda dos valores constitucionais expressos ou implícitos, não deve criminalizar comportamentos que produzam lesões insignificantes aos bens juridicamente tutelados. Donde se conclui que condutas causadoras de danos ou perigos ínfimos aos bens penalmente protegidos são consideradas (materialmente) atípicas. (ESTEFAM e GONÇALVES. 2012, p. 99)

Posto isto, ao verificarmos os requisitos para aplicação do princípio da insignificância, concatenado à situação hipotética acima, se não fosse pela reprovabilidade do comportamento, imediatamente seria possível a aplicação do princípio da insignificância, reafirmando, assim, a importância do controle social que pressupõe a existência de modelos e normas sociais.

No tocante à relevância jurídica, esta possui função imprescindível no ordenamento jurídico pátrio, a saber, a limitação do ius puniendi. Derradeiro, desde a instauração do Estado Democrático de Direito, ser repudiado todo ato autoritário com ares de Direito Penal Máximo, ao arrepio da Carta Magna.

É cediço no ordenamento jurídico pátrio que o legislador em momento algum deve tipificar condutas que, em sua forma mais gravosa, não intente contra bens jurídicos, visto que, em caso contrário, estaria a violar princípios basilares que traçam limites na atuação estatal.

Nesta feita, não se está aqui discutindo a necessidade ou desnecessidade de criação de novos tipos penais, mas, sim, que o legislador, ao editar as normas, intentou pela criação de normas genéricas e abstratas, visando, assim, a uma pluralidade de condutas, a serem abarcadas em consonância com os avanços tecnológicos atrelado aos avanços da criminalidade.

Mister destacar que, embora haja diversos tipos penais incriminadores, é notório que a maioria da população carcerária está detida em virtude de delitos mais comuns, tais como: receptação, furto, roubo, tráfico, homicídio, etc., ou seja, a criação de mais tipos penais, não iria solucionar a problemática da insegurança que nos rodeia.

Não obstante, na labuta da advocacia criminal, há que se ir em busca da reafirmação do Direito, principalmente em busca da reafirmação da instauração do Estado Democrático de Direito, uma vez que fora inserido no centro do ordenamento jurídico a dignidade da pessoa humana, sendo esta uma forma de reafirmar sua existência.

Posto isto, com os avanços tecnológicos e da criminalidade, está a se exigir de nós, operadores do Direito, a releitura das normas genéricas e abstratas formuladas pelo legislador, buscando o real sentido do dispositivo legal.


REFERÊNCIAS

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral, volume 1. – 19. Ed. – Niterói/RJ: Impetus, 2017.

ESTEFAM, André. GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito penal esquematizado: parte geral. – São Paulo/SP : Saraiva, 2012.


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