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Emendatio libelli: entenda como funciona

Emendatio libelli: entenda como funciona

A melhor forma de compreender as questões teóricas é analisando os casos práticos e no texto de hoje veremos um pouco sobre a emendatio libelli.

Emendatio libelli, de forma bem simples, é a possibilidade de o juiz mudar o crime que consta classificado na denúncia.

Por exemplo, o acusado, denunciado pela prática do crime do artigo 14 da Lei 10.826/03, é condenado no artigo 12 da mesma Lei.

Mas não é nada arbitrário. O juiz não pode mudar o crime assim do nada.

Vejamos o que diz o texto legal:

Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave.

Assim, segundo o CPP, caso a denúncia narre um fato, mas indique um outro crime, diferente daquele correspondente ao fato narrado, o juiz poderá adequar o crime classificado aos fatos.

Segundo NUCCI, em seu Código de Processo Penal Comentado (2014):

a reforma trazida pela Lei 11.719/2008 tornou bem claro não poder o magistrado, ao promover a denominada emendatio libelli, modificar qualquer fato descrito na peça acusatória. Cabe-lhe atribuir nova definição jurídica ao fato, mas este é imutável, sob o prisma do julgador. São ofensivas à regra da correlação entre acusação e sentença as alterações pertinentes ao elemento subjetivo (transformação do crime de doloso para culposo ou vice-versa), as que disserem respeito ao momento consumativo (transformação de crime consumado para tentado ou vice versa), bem como as que fizerem incluir fatos não conhecidos da defesa, ainda que possam parecer irrelevantes, como a mudança do endereço onde o delito ocorreu.

Um exemplo de caso possível de aplicar a emendatio libelli: a peça acusatória afirma que o acusado possuía uma arma de fogo de uso permitido no interior da sua residência, em desacordo com a legislação.

Todavia, ao final da denúncia, consta classificado como o crime praticado aquele tipificado no artigo 14 da Lei 10.826/03.

Como cediço, possuir arma de fogo dentro de casa em desacordo com a legislação é praticar o crime tipificado no artigo 12 da Lei 10.826/03, relativo à posse ilegal de arma de fogo, e não o crime do artigo 14 da mesma Lei, referente ao porte ilegal de arma de fogo.

Assim, em regra, na sentença, o juiz aplicará a emendatio e sentenciará o réu pelo crime do artigo 12, pois, como dito, estava narrado na denúncia a posse ilegal de arma de fogo.

Perceba que não houve modificação dos fatos, apenas adequação deles ao tipo penal.

Nesse caso, inclusive, com a emendatio, caberá a proposta de suspensão condicional do processo (artigo 89 da Lei 9.099/95), desde que o acusado preencha os requisitos legais para tanto, pois o crime tipificado no artigo 12 da Lei 10.826/03 tem uma pena de detenção, de 01 a 04 anos, cabendo portanto, ao menos na teoria, a proposta da suspensão.

Importante destacar que essa possibilidade de o magistrado alterar o crime classificado na denúncia se dá pelo fato de que o acusado se defende dos fatos e não do crime que consta classificado ao final da peça acusatória, por isso não há necessidade de aditamento por parte do Ministério Público.

BADARÓ afirma que:

o juiz não pode condenar o acusado, mudando as circunstâncias instrumentais, modais, temporais ou espaciais de execução do delito, sem dar-lhe a oportunidade de se defender da prática de um delito diverso daquele imputado inicialmente, toda vez que tal mudança seja relevante em face da tese defensiva, causando surpresa ao imputado.

Deve ficar claro que não se trata de mudança dos fatos e, consequentemente, do crime, mas de adequação do crime aos fatos narrados.

Em se tratando de nova definição jurídica do fato, mudamos a análise para o instituto da mutatio libelli, disposto no artigo 384 do CPP:

Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente.

Só que, para evitar um texto muito longo, deixarei a mutatio para outra análise.

Por fim, apenas de modo a fixar o tema, para a aplicação da emendatio libelli é necessário que o crime que consta classificado ao final na denúncia não corresponda aos fatos narrados, tratando-se, portanto, de uma adequação do crime aos fatos, sem modificá-los.

Um grande abraço e até a próxima semana!

Pedro Magalhães Ganem

Especialista em Ciências Criminais. Pesquisador.

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