Afinal, o que é o “Estado de Júri”?

Afinal, o que é o Estado de Júri?

O Tribunal do Júri é mais ou menos assim: ame-o ou deixe-o. Não existe e não pode existir o meio termo. Isso porque o tempo no plenário é 100% de intensidade. E engana-se quem pensa que essa intensidade se inicia com a abertura da sessão declarada pelo Juiz Presidente. Aos apaixonados pelo Júri, esse “estado” começa bem antes da hora designada para o início da Sessão.

A preparação para o Plenário sempre deve ser atenta e minuciosa. O advogado deve conhecer cada página, cada documento, cada perícia, cada vida envolvida no processo. Não é costumeiro o mesmo advogado atuar desde a fase investigatória até o plenário, mas independente disso, a responsabilidade de pensar a cada etapa em uma estratégia, deve ser a mesma: visar o Plenário do Júri. Afinal, é lá que o processo e a(s) vida(s) serão decididas.

Pois bem, durante o pré-júri, o Advogado conhece e estuda todos os cantos do processo. Até que chega a véspera do julgamento e junto com ela, o Estado de Júri, segundo Evandro Lins e Silva. Sempre ouvimos nossos professores e nossos ídolos advogados, falarem sobre esse estado, mas nunca entendemos muito bem do que se tratava. Até sentirmos na pele.

O Estado de Júri, pensamos que não é definível por uma palavra, emoção ou sentimento, mas sim é uma mistura de tudo isso e mais um pouco. É aquele frio na barriga, aquela tensão, aquela sede de se fazer justiça. É uma ânsia que não cabe no peito. É ter o coração acelerado e as mãos suando sem parar.

É ver a noite chegando, o tempo passando depressa e o sono distante. É ter insônia. É não desgrudar dos autos. É não desligar o pensamento. É não pensar em outra coisa. E se finalmente pegamos no sono, lá vem o inconsciente e nos faz sonhar com… o plenário do júri!!

Toca o despertador! Hora de levantar. Hora de lavar o rosto. Hora de se olhar no espelho e dizer: é hoje!! Material todo reunido: cópia do processo, canetas, marca textos, postites, blocos de anotações, livros doutrinários e legislação. Pega a beca. Pega o chimarrão (aqui no Rio Grande do Sul, não pode faltar). Por último, um batom vermelho e um salto alto (pois sim, lugar de mulher é em plenário ou onde ela quiser estar). Rumo ao Júri.

E o coração? Segue acelerado. E as mãos? Seguem suando. A Defesa toma posse da bancada. Importante ressaltar que, desde o momento em que se pisa no plenário, os Jurados já estarão observando a postura e comportamento defensivo, lembrando que o Júri é um conjunto de ações e qualquer ato ou gesto pode fazer a diferença.

Então, é chegada a hora. Jurados presentes, sessão aberta. Acerta a respiração. Começa a “peleia”. Aos poucos, a ansiedade que antes dominava o corpo todo vai perdendo lugar pra racionalidade, que vem vindo através da concentração. O foco é único. Toda a atenção precisa estar voltada a tudo o que acontece no júri: fala da acusação, comportamento dos jurados e condução dos trabalhos. E o café faz parte do jogo.

Gostamos muito de citar em nossos Júris o sociólogo Zygmunt Bauman. Na obra Vidas Desperdiçadas, em determinado trecho, ele fala assim:

Lição número 1: os dias importam tanto quanto e nada mais que a satisfação que se pode extrair deles. O prêmio que você pode esperar, de forma realística, e trabalhar por obter é um hoje diferente, não um amanhã melhor. O futuro está além do seu alcance (e, nesse sentido, do alcance de qualquer um), de modo que você deve parar de ficar olhando para o pote de ouro no fim do arco-íris.

Por experiência própria (era segredo e agora todos sabem), às vésperas dos primeiros julgamentos que participamos, não soubemos lidar muito bem com este estado que muda repentinamente todo o corpo e domina as emoções, porque é de verdade, isso existe e é muito forte.

Não fosse o remédio receitado, o Júri do outro dia não sairia por ausência da defesa!! Porém, tudo passa e Júri após Júri vamos aprendendo a lidar com as situações mais adversas dos processos e de si mesmas, já que a experiência vai ajudando e controlando as emoções.

É como disse Bauman: é preciso dar o melhor de si no hoje, viver o hoje e esperar o resultado (que é o futuro), ciente de que se fez tudo que poderia ter feito, da melhor forma possível.

É claro que queremos sempre uma absolvição, que pensamos ser o ápice num processo criminal, quando mais envolto de Tribunal do Júri. Porém, considerando que cada caso é um caso, às vezes a luta por tirar uma qualificadora ou desclassificar um delito deve ser comemorado tanto quanto uma absolvição.

O importante é ser justo e leal durante toda a defesa. Por isso, o Tribunal do Júri é um lugar somente para apaixonados. Se a entrega for de corpo e alma, senhores, podem ter certeza, a justiça foi/será feita!! Missão cumprida. Até o próximo Estado de Júri.