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Estamos inaugurando a Criminologia Animal, você vem?

Estamos inaugurando a Criminologia Animal, você vem?

Por Gisele K. Scheffer e Renato S. Pulz

A recente Lei Federal nº 14.064 de 2020, apelidada de lei Sansão, que aumentou a pena do crime de maus-tratos aos animais quando cometido contra cães e gatos, apesar de bem-vinda pela sociedade não deixou de receber críticas e provocar calorosos debates. Evidenciou a relevância que o tema proteção animal ganhou na sociedade, pois é resultado de um fenômeno sociocultural e político.

Em razão disso, a sequência de textos sobre o assunto tem por escopo discutir a necessidade de uma criminologia específica, que estude as particularidades do crime envolvendo a relação peculiar entre o ser humano e os outros animais, ou seja, uma criminologia animal.

A Criminologia é uma ciência empírica, interdisciplinar, de método próprio indutivo, que tem por objeto estudar o crime, o criminoso, a vítima e o controle social. Tem por função compreender conhecer cientificamente o fenômeno do crime, indicar um diagnóstico, produzir conhecimento capaz de prevenir o delito e intervir no criminoso (SUMARIVA, 2014).

O crime é um fenômeno humano, social, cultural, complexo e multifatorial e a Criminologia tem um conceito diferente daquele do Direito Penal; logo não basta uma conduta contrariar o dispositivo legal, pois ela considera um conceito mais amplo. Segundo Fontes e Hoffman (2020), para ser um crime para a criminologia a conduta deve atender a alguns elementos constitutivos:

  • incidência massiva na população: reiteração na sociedade;
  • incidência aflitiva: produção de dor à vítima e à sociedade;
  • persistência espaço-temporal: prática ao longo de um território por um período de tempo; e
  • consenso sobre sua etiologia e técnicas de intervenção.

Ao analisarmos o crime de maus-tratos aos animais podemos concluir que, além de atender aos requisitos do Direito Penal, também preenche os requisitos da Criminologia. O crime de maus-tratos aos animais tem ocorrência massiva na sociedade, pois os animais estão presentes na maioria dos lares e interagem com os seres humanos em várias atividades desde sempre na história das civilizações.

A incidência aflitiva é percebida nas relações de afeto dos seres humanos com os animais e com o sofrimento dos tutores, em uma nova configuração familiar já bem descrita e reconhecida (BARRETO, 2011; FARACO e SEMINOTTI, 2004), inclusive com decisões judiciais em varas de família. Sobre o sofrimento dos animais como vítimas das ações humanas, não há mais dúvidas.

A ciência do bem-estar animal e o reconhecimento de que os animais são seres sencientes exigem uma nova postura em relação à proteção jurídica. Ressalta-se o PL 27/2018, conhecido como PL Animais Não São Coisas, que prevê a mudança do status jurídico dos animais no ordenamento jurídico nacional, conferindo uma natureza jurídica sui generis, o que já ocorreu nos estados de Santa Catarina, Paraíba e Rio Grande do Sul e em outros países como Áustria (1988), Alemanha (1990), Suíça (2003), França (2015) e Portugal (2017). Também a conduta de maltratar animais ocorre em todos os lugares e regiões do país e do mundo, além de ser uma prática que acompanha o homem em sua história, assim como a de outros crimes violentos (HARARI, 2018; THOMAS, 2010).

Continua…


REFERÊNCIAS

BARRETO, A.V.P. A saúde e a nova configuração familiar. Clínica Veterinária, n. 90, 2011, p. 12-13.

FARACO, Célia.; SEMINOTTI, N. A relação homem animal e a prática veterinária. Rev. Conselho Fed. Med. Vet., n. 32, 2004, p. 57-61.

FONTES, E.; HOFFMANN, H. Criminologia.  Salvador: Editora Justpodivm, 2020.

HARARI, Y.N. Uma Breve História da Humanidade. Porto Alegre: L&PM, 2018.

SUMARIVA, Paulo. Criminologia: teoria e prática. Niterói: Impetus, 2014.

THOMAS, Keith. O homem e o mundo natural. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p. 21-69.


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Gisele Kronhardt Scheffer

Mestre em Direito Animal. Especialista em Farmacologia. Médica Veterinária.

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