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Exame de provas em habeas corpus

Exame de provas em habeas corpus

É bastante comum a afirmação de que, em sede de habeas corpus, veda-se a valoração de provas, ou ainda que o writ não é o espaço próprio para o aprofundamento na análise de fatos. Ainda que do ponto de vista dogmático a conclusão seja correta, é necessário dizer que a simples verificação de provas, no âmbito do habeas corpus, é possível e, em determinados casos, até mesmo necessária. Explica-se.

Exame de provas

É que há uma diferença bastante grande entre a análise e a valoração das provas.

Como se sabe, valorar provas significa atribuir valor, ou seja, cotejar provas a fim de se identificar quais, no caso concreto, terão maior valor para fins de fundamentação fática da decisão judicial. Segundo afirma Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha,

A avaliação da prova é um ato eminentemente pessoal do juiz, somente seu, mediante o qual, examinando, pesando a estimando os elementos oferecidos pelas partes, chega a uma conclusão sobre o alegado. (ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 78)

Fenômeno diverso consiste na simples análise e verificação de provas existentes, a fim de evidenciar que um determinado fato é absolutamente incontroverso, vale dizer, que todo o acervo probatório aponta em um sentido unitário e induvidoso.

Nessas casos, a hipótese não é de valoração de provas, mas da existência de prova pré constituída dos fatos alegados. Nesses casos, a impetração deve ser conhecida e os elementos de prova devem ser analisados, a fim de se verificar o conteúdo e a veracidade das afirmações contidas no writ, de modo a se concluir pelo seu acerto ou desacerto. Aqui, não se cuida de valoração, mas de simples verificação da prova.

No contexto, Aury Lopes Junior afirma o seguinte:

Questão bastante relevante em sede de HC é a ‘impossibilidade de dilação probatória’, argumento usado de forma recorrente pelos tribunais para não conhecer do writ que exija ampla discussão probatória. Esse argumento tem sido, inclusive, distorcido de modo a ser um dos principais filtros obstaculizadores de conhecimento do HC nos tribunais brasileiros. Até certo ponto, o argumento está correto, pois se trata de uma ação de cognição sumária, que não permite dilação ou ampla discussão probatória. Mas, por outro lado, não se pode confundir dilação probatória com análise da prova (pré-constituída). A sumarização da cognição impede que se pretenda produzir prova em sede de habeas corpus ou mesmo obter uma decisão que exija a mesma profundidade da cognição do processo de conhecimento (ou seja, aquela necessária para se alcançar a sentença de mérito). (LOPES JUNIOR, Aury. Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 1363-1364)

Também na jurisprudência existem precedentes em sentido análogo:

1. Determina a norma (constitucional e infraconstitucional) que se conceda habeas corpus sempre que alguém esteja sofrendo ou se ache ameaçado de sofrer violência ou coação; trata-se de dar proteção à liberdade de ir, ficar e vir, liberdade induvidosamente possível em todo o seu alcance. 2. Assim, não procedem censuras a que nele se faça exame de provas. Quando fundado, por exemplo, na alegação de falta de justa causa, impõe-se sejam as provas verificadas. O que se veda em habeas corpus, semelhantemente ao que acontece no recurso especial, é (…) a operação mental de conta, peso e medida dos elementos de convicção. (STJ – HC 119.354, Rel. Min. Nilson Naves, DJe 31.5.2010)


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Bruno Milanez

Doutor e Mestre em Direito Processual Penal. Professor. Advogado.

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