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Entenda como funciona a execução da pena de multa

A pena de multa é uma espécie de sanção penal, que possui natureza patrimonial e que, na grande maioria das vezes, é cominada no preceito secundário da norma penal (pena cominada) de forma isolada ou cumulada com a pena de prisão (pena corporal).

A Constituição Federal prevê no art. 5º, inciso XLVI, “c”,  que a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos.

Tal pena consiste no pagamento de determinado valor em dinheiro em favor do Fundo Penitenciário Nacional, fundo esse que foi instituído pela Lei Complementar nº 79/1994 para os fins de custear o sistema de cumprimento de pena no país.

Os Estados membros podem instituir, mediante a edição de legislação própria e específica, fundo estadual para a gestão das multas criminais aplicadas pela Justiça Criminal Estadual.

O Fundo Estadual foi criado na grande maioria dos Estados membros da Federação a exemplo dos Estados de São Paulo (Lei Estadual nº 9.171/1995), Paraná (Lei Estadual nº 17.140/2012), Goiás (Lei Estadual nº 17.616/2012) e Minas Gerais (Lei Estadual nº 11.402, de 14 de janeiro de 1994).

1) CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO DA PENA DE MULTA

A fixação da pena de multa pode ocorrer como sanção principal, alternativa ou cumulativa com a pena corporal (prisão), podendo, também, ser aplicada como substituição à pena de prisão.

Segundo o disposto do art. 49 do Código Penal, a tarifação do quantum obedecerá o critério do dia-multa. Vejamos o disposto no Código Penal:

Art. 49 - A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.
§1º - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário.
§2º - O valor da multa será atualizado, quando da execução, pelos índices de correção monetária.

Com a leitura do disposto do art. 49 do Código Penal, conclui-se que o magistrado deve passar por duas etapas para se chegar ao quantum devido a título de pena de multa: a) primeiramente se fixa o número de dias-multa e b) depois arbitra-se o valor do dia-multa.

Analisando o disposto do art. 49 do Código Penal, temos que a fixação do número de dias-multa não poderá ser inferior a 10 (dez) e nem superior a 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.

Há divergência doutrinária e jurisprudencial acerca da possibilidade do juiz levar em consideração, na primeira etapa do método de fixação dessa pena, a culpabilidade do réu. Vigora no Superior Tribunal de Justiça a tese de que o número de dias-multa deverá levar em conta a culpabilidade do réu, consoante o disposto do art. 59 do Código Penal (STJ – RESP 1099342/PR).

Já, quando do arbitramento do valor do dia-multa, o magistrado deve compreendê-lo entre os limites de 1/30 (um trigésimo) e 5 (cinco) vezes o valor do maior salário-mínimo vigente no tempo do fato. Nesse momento o juiz também deverá observar a situação econômica do condenado.

O juiz poderá aumentar até o triplo do valor total aferido se verificar que tal é ineficaz para a repressão e prevenção do delito diante da situação econômica do réu, face o disposto do art. 60, §1º, do Código Penal.

Assim, se o crime for cometido neste ano de 2017, levando em consideração o atual valor do salário-mínimo vigente de R$ 937,00 (Decreto 8.948/2016) o magistrado poderá fixar o piso de 10 (dias-multa) vezes 1/30 de 937,00 valor que totaliza R$ 312,33 e o teto de 360 (dias-multa) vezes 5 vezes R$ 937,00 vezes 3, valor que totaliza o montante de R$ 5.059.800,00.

Cumpre ressaltar que quando se tratar de delito praticado contra o sistema financeiro nacional (art. 33 da Lei 7.492/1986); contra a propriedade imaterial (art. 197 da Lei 9.279/1996) e contra a Lei de Drogas (art. 43 da Lei 11.343/2006), o magistrado poderá elevar o valor dessa pena até o décuplo do máximo previsto.

2) PAGAMENTO DA MULTA

O pagamento voluntário poder se feito pelo condenado no prazo de 10 (dez) dias contados do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Esse prazo começa a fluir, a bem do devido processo legal, a partir da intimação (notificação) do apenado para realizar tal ato.

O magistrado poderá, de acordo com as circunstâncias, a requerimento do condenado, permitir que o pagamento seja realizado em parcelas mensais, iguais e sucessivas, ouvindo o Ministério Público previamente à decisão.

A cobrança dessa pena poderá ser realizada por meio do desconto em folha de pagamento caso o condenado esteja em liberdade e exercendo trabalho devidamente registrado, desde que o valor não atinja os recursos indispensáveis ao sustento do devedor e de seus familiares, segundo os ditames do princípio da menor onerosidade e o da preservação do patrimônio mínimo como corolário da dignidade da pessoa humana.

Essa situação poderá ocorrer: a) quando a pena de multa foi aplicada isoladamente; b) quando aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos; c) quando o condenado à pena privativa de liberdade obtiver o direito de suspensão condicional da pena; d) quando o condenado já cumpriu integralmente a pena privativa de liberdade aplicada; e) quando o condenado for beneficiado com o livramento condicional.

Vejamos o que giza o Código Penal:

Art. 50 - A multa deve ser paga dentro de 10 (dez) dias depois de transitada em julgado a sentença. A requerimento do condenado e conforme as circunstâncias, o juiz pode permitir que o pagamento se realize em parcelas mensais.
§1º - A cobrança da multa pode efetuar-se mediante desconto no vencimento ou salário do condenado quando: a) aplicada isoladamente; b) aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos; c) concedida a suspensão condicional da pena.
§2º - O desconto não deve incidir sobre os recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família.

O art. 168, I, da LEP dispõe que o limite máximo de desconto será o de ¼ e o mínimo de 1/10 da remuneração auferida pelo condenado.

3) ISENÇÃO DA PENA DE MULTA DIANTE DAS CONDIÇÕES ECONÔMICAS DO CONDENADO

Hodiernamente se discute sobre a possibilidade de o juiz da execução penal isentar o condenado do pagamento da pena de multa que lhe foi imposta diante da precariedade de sua condição financeira. O entendimento prevalecente na doutrina e na jurisprudência é o de que não é possível a isenção fundada na situação econômica precária do réu por ausência de previsão legal, consoando decidiu o Superior Tribunal de Justiça no RESP 722561/RS.

4) EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA

Ocorrerá a execução dessa pena quando o condenado, embora notificado para efetuar o pagamento voluntário da pena de multa imposta, não o realiza no prazo de 10 dias.

A execução será coercitiva.

O art. 51 do Código Penal, após a alteração dada pela Lei nº 9.268/1996, passou a considerar que transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive, no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição.

É, portanto, vedado converter a pena de multa em pena privativa de liberdade.

Quanto ao procedimento e legitimidade para deflagrar o processo de cobrança (execução) da pena de multa, os tribunais superiores tem asseverado que a multa criminal deve ser executada por meio da adoção dos procedimentos próprios da execução fiscal no juízo da Vara de Fazenda Pública e compete às Procuradorias da União (AGU) ou dos Estados (AGEs) promoverem sua cobrança.

5) SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA MULTA

O art. 52 do Código Penal reza que é suspensa a execução da pena de multa, se sobrevém ao condenado doença mental.

6) MULTA DE VALOR REDUZIDO 

Quando o valor da pena de multa aplicada for pequeno há posicionamento doutrinário, minoritário, no sentido de que não se deve promover sua cobrança judicial. Esse posicionamento não coaduna com o que vem decidindo as cortes superiores que consideram a pena de multa espécie de sanção penal e, por isso, deve ser adimplida pelo condenado.

7) PRESCRIÇÃO DA PENA DE MULTA

Quanto à prescrição dessa modalidade de pena, é necessário diferenciar a prescrição da pretensão punitiva da prescrição da pretensão executória, ambas incidentes à espécie punitiva.

Relativamente à prescrição da pretensão punitiva (hipótese em que a sanção pecuniária ainda não transitou em julgado para ambas as partes), é pacífica a aplicação do art. 114 do Código Penal. Nesse caso, incidem as causas impeditivas e interruptivas inseridas nos arts. 116, I e II, e 117, I a IV, do mesmo diploma. Dispõe o art. 114 do CP:

Art. 114. A prescrição da pena de multa ocorrerá:
I – em dois anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada;
II – no mesmo prazo estabelecido para a prescrição da pena privativa de liberdade, quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada.

Por outro, tratando-se da prescrição da pretensão executória (hipótese em que a sentença penal condenatória já transitou em julgado para o Ministério Público ou para o querelante e também para a defesa), há dois posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais sobre prazo prescricional:

Primeiro: É de cinco anos, já que a L. 9.268/1996, alterando o art. 51 do Código Penal, estabeleceu que a pena de multa, para fins de execução, fosse considerada dívida de valor.

Segundo: A pena de multa prescreve em dois anos se for a única aplicada. Caso, porém, seja imposta conjuntamente com pena privativa de liberdade, a prescrição ocorrerá no mesmo prazo desta última, diante do que dispõe o art. 118 do Código Penal, segundo o qual as penas mais leves prescrevem com as mais graves.

Cumpre ressaltar que, na hipótese da prescrição da pretensão executória, as causas suspensivas e interruptivas são as estipuladas pela L. 6.830/1980, nos termos do art. 51 do CP.

Rodrigo Murad do Prado

Doutorando em Direito Penal pela Universidad de Buenos Aires. Mestre em Direito. Criminólogo. Defensor Público.

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