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STJ: exigência de contemporaneidade não se aplica a medidas cautelares reais

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a exigência de contemporaneidade não se aplica a medidas cautelares reais, sendo exigível apenas no que se refere às medidas constritivas da liberdade.

A decisão (HC 624.608/CE) teve como relator o ministro Reynaldo Soares da Fonseca.

Exigência de contemporaneidade em medidas cautelares

PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. 1. MANDAMUS SUBSTITUTIVO DO RECURSO PRÓPRIO. DESVIRTUAMENTO DE GARANTIA CONSTITUCIONAL. 2. BUSCA E APREENSÃO. ALEGADA AUSÊNCIA DE CONTEMPORANEIDADE. ART. 315, § 1º, DO CPP. NÃO APLICAÇÃO. LOCALIZAÇÃO TOPOGRÁFICA NO CPP. 3. INSTITUTO QUE DIZ RESPEITO A MEDIDAS CAUTELARES PESSOAIS. CONTEMPORANEIDADE DO PERICULUM LIBERTATIS. 4. BUSCA E APREENSÃO. MEDIDA CAUTELAR REAL. MEIO DE OBTENÇÃO DE PROVA. REQUISITOS PRÓPRIOS. DESNECESSIDADE DE CONTEMPORANEIDADE. 5. LAPSO ENTRE FATOS E COLHEITA DE PROVAS. POSSIBILIDADE DE DESAPARECIMENTO DE VESTÍGIOS. SITUAÇÃO BENÉFICA AO RÉU. 6. EXIGÊNCIA DE CONTEMPORANEIDADE. INVIABILIZAÇÃO DE INVESTIGAÇÕES. PRÁTICA CRIMINOSA QUE OCORRE, EM REGRA, NA CLANDESTINIDADE. 7. PRAZO PARA PRODUÇÃO DE PROVAS. LAPSO PRESCRICIONAL. 8. DECRETO DE BUSCA E APREENSÃO. FUNDAMENTO APENAS EM DECLARAÇÕES DE COLABORADORES. INIDONEIDADE. ART. 4º, § 16, LEI 12.850/2013. 9. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. DESNECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS. DECRETO NULO. 10. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO PARA ANULAR A BUSCA E APREENSÃO.

[…]

2. O § 1º do art. 315 do Código de Processo Penal, incluído pela Lei n. 13.964/2019, encontra-se localizado no Capítulo III, intitulado “Da Prisão Preventiva”, inserido no Título IX do Código de Processo Penal, denominado “Da Prisão, Das Medidas Cautelares e Da Liberdade Provisória”, estando enumerados dentro do mesmo Título, no Capítulo V, as “outras medidas cautelares”. Nesse contexto, a contemporaneidade exigida pelo dispositivo indicado pelo impetrante se refere às medidas constritivas da liberdade, seja a própria prisão preventiva ou as medidas cautelares diversas enumeradas no art. 319 do Código de Processo Penal.

3. Não bastasse a questão topográfica, não se pode descurar que a contemporaneidade guarda estreita relação com as medidas cautelares de natureza pessoal, uma vez que o motivo que determina a restrição da liberdade de uma pessoa deve ser contemporâneo à medida constritiva, sob pena de não mais se justificar. De fato, mister ficar demonstrado o perigo atual gerado pelo estado de liberdade do imputado, conforme disposto no art. 312 do Código de Processo Penal.

4. A busca e apreensão é medida cautelar real e não pessoal, tem natureza jurídica de meio de obtenção de prova e se encontra disciplinada no Capítulo XI do Título VII, intitulado “Da Prova”. No referido capítulo, constam requisitos próprios da referida diligência, dentre os quais não se verifica a necessidade de contemporaneidade. Nesse sentido: RHC 119.225/SP, Rel. Ministro LEOPOLDO DE ARRUDA RAPOSO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PE), QUINTA TURMA, julgado em 19/11/2019, DJe 26/11/2019.

5. Quanto mais distante a prática delitiva for da produção da prova, mais chances se tem de eventuais vestígios terem desaparecido, situação que, em verdade, beneficia o investigado. Nesse contexto, não faz sentido agregar às medidas cautelares reais o requisito da contemporaneidade.

– A contemporaneidade de riscos, de outro lado, não é requisito para a produção probatória. Mesmo passado o tempo, sempre poderá o magistrado determinar a produção de provas pertinentes aos fatos, mesmo sendo elas invasivas da intimidade – fundamentadamente (HC 480.092/DF, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 03/03/2020, DJe 10/03/2020.

6. Considerar que as diligências investigatórias dependem da efetiva demonstração da contemporaneidade com a prática criminosa impossibilitaria inúmeras investigações, uma vez que, em regra, os crimes são cometidos de forma clandestina, acreditando-se na sua não descoberta e na consequente impunidade.

7. Não se pode descurar, ademais, que o prazo previsto para se elucidar uma infração penal guarda relação com a prescrição.

Portanto, enquanto o crime investigado não estiver prescrito, são cabíveis todos os meios de produção de prova, desde que devidamente motivada sua necessidade, não havendo se falar, portanto, em contemporaneidade de medida cautelar não pessoal.

[…]

10. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, para para anular o decreto de busca e apreensão, bem como as provas dele derivadas, em virtude de sua deficiente fundamentação, sem prejuízo de que seja novamente decretada a medida, em observância ao regramento legal.

(HC 624.608/CE, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 02/02/2021, DJe 04/02/2021)

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Pedro Ganem

Redator do Canal Ciências Criminais

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