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STJ: fraude na licitação para fins de contratação de serviço não está abrangida pelo art. 96 da Lei 8.666/93

STJ: fraude na licitação para fins de contratação de serviço não está abrangida pelo art. 96 da Lei 8.666/93

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a fraude na licitação para fins de contratação de serviço não está abrangida pelo tipo penal previsto no art. 96 da Lei n. 8.666/1993, uma vez que apresenta hipóteses estreitas de penalidade, não podendo haver interpretação extensiva em prejuízo do réu, à luz do princípio penal da taxatividade.

A decisão (HC 485791/SP) teve como relator o ministro

Fraude na licitação

Ementa do HC 485791/SP:

PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. 1. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. 2. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. EXCEPCIONALIDADE PRESENTE. 3. ART. 90 DA LEI N. 8.666/1993. PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. FRAUDE AO CARÁTER COMPETITIVO. AUSÊNCIA DE DESCRIÇÃO DA FRAUDE. CARÁTER COMPETITIVO PRESERVADO. NARRATIVA DE FATOS POSTERIORES AO CONTRATO. 4. DESCRIÇÃO DE IRREGULARIDADES. NARRATIVA QUE NÃO REVELA, POR SI SÓ, A PRÁTICA DE CRIMES. 5. ART. 96, V, DA LEI N. 8.666/1993. FRAUDE NA AQUISIÇÃO DE BENS OU MERCADORIAS. IMPUTAÇÃO DE FRAUDE PARA CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS. CONDUTA NÃO ABRANGIDA. PRINCÍPIO DA TAXATIVIDADE PENAL. 6. ART. 1º, III, DO DL 201/1967. DESVIO DE VERBA PÚBLICA. PAGAMENTO DE CONTRATO SUPERFATURADO. DOLO ESPECÍFICO NÃO DESCRITO. 7. ELEMENTARES DOS TIPOS PENAIS NÃO NARRADAS. DENÚNCIA DEFICIENTE. PREJUÍZO À AMPLA DEFESA. 8. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL POR INÉPCIA DA DENÚNCIA. 1. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade. 2. O trancamento da ação penal somente é possível na via estreita do habeas corpus em caráter excepcional, quando se comprovar, de plano, a inépcia da denúncia, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito. 3. Para configurar o tipo do art. 90 da Lei n. 8.666/1993, necessário ficar demonstrada a quebra do caráter competitivo entre os licitantes interessados em contratar, ocasionada pelo mero ajuste, combinação ou outro expediente apto a frustrar ou fraudar o procedimento licitatório. Da leitura da denúncia, não se observa em que consistiria eventual fraude perpetrada pelos pacientes, ainda que em concurso, com o objetivo de frustrar o caráter competitivo do procedimento licitatório, uma vez que a licitação, na modalidade concorrência pública, efetivamente ocorreu, participando dela 5 concorrentes. Ademais, não se verifica eventual ajuste prévio entre as concorrentes para frustrar o caráter competitivo da licitação, constando da inicial acusatória apenas fatos posteriores à contratação, os quais não indicam qualquer irregularidade prévia à própria licitação, mas meras conjecturas, que não podem subsidiar uma imputação penal. 4. Relevante assentar que os tipos penais trazidos na Lei de Licitações não têm a finalidade de criminalizar o mero descumprimento de formalidades, mas sim o descumprimento com a intenção de violar os princípios cardeais da administração pública. Com efeito, “irregularidades pontuais são inerentes à burocracia estatal e não devem, por si só, gerar criminalização de condutas, se não projetam ofensa consistente tipicidade material _ ao bem jurídico tutelado, no caso, ao procedimento licitatório”. (Inq 3962/DF, rel. Min ROSA WEBER, julgamento em 20/2/2018). 5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no mesmo sentido de que “o art. 96 da Lei n. 8.666/1993 apresenta hipóteses estreitas de penalidade, entre as quais não se encontra a fraude na licitação para fins de contratação de serviços. O tipo penal deveria prever expressamente a conduta de contratação de serviços fraudulentos para que fosse possível a condenação do réu, uma vez que o Direito Penal deve obediência ao princípio da taxatividade, não podendo haver interpretação extensiva em prejuízo do réu” (REsp n. 1.571.527/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 6/10/2016, DJe 25/10/2016). 6. Prevalece no Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido de que é indispensável estar devidamente descrito o dolo específico de acarretar prejuízo ao erário, para ficar configurado o crime do art. 1º, inciso III, do Decreto-Lei n. 201/1967. Contudo, não há descrição do dolo específico do ex-prefeito nem do secretário de obras de desviar ou aplicar indevidamente rendas ou verbas públicas, mas mera afirmação de superfaturamento e de indícios de favorecimento, os quais nem ao menos são descritos na inicial acusatória. 7. A denúncia, apesar de narrar diversas irregularidades, é deficiente, não descrevendo todos os elementos necessários à responsabilização penal dos pacientes. Com efeito, embora o réu se defenda dos fatos e não da capitulação legal a ele atribuída pelo Ministério Público, mister a adequada compreensão da imputação, com a descrição de todos os elementos do tipo penal, sob pena de a defesa ter que se defender de conduta que nem ao menos preenche adequadamente a tipicidade penal. Anoto que não se está a afirmar que as condutas imputadas são atípicas, mas sim que o Ministério Público não se desincumbiu de narrar todos as elementares do tipos penais, o que dificulta, sobremaneira, a ampla defesa. 8. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, para trancar a Ação Penal n. 0003267-38.2012.4.03.0000, haja vista a inépcia da inicial acusatória, sem prejuízo de oferecimento de nova denúncia, em obediência à lei processual. Encontrando-se os demais codenunciados na mesma situação processual dos pacientes, estendo a eles os efeitos da presente decisão, nos termos do art. 580 do Código de Processo Penal. (HC 485.791/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 07/05/2019, DJe 20/05/2019)

Precedentes no mesmo sentido:

  • REsp 1407255/SC, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 21/08/2018, DJe 29/08/2018
  • REsp 1571527/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 25/10/2016

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