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A decisão de Gilmar Mendes sobre as conduções coercitivas

Em decisões liminares nas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 395 e 444, o Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, vedou o uso de conduções coercitivas de investigados para interrogatório.

Na avaliação do Ministro, a condução coercitiva, que teria fundamento no art. 260 do Código de Processo Penal, é incompatível com a Constituição Federal, porque viola a liberdade, ainda que de forma temporária, e a presunção de inocência (art. 5º, incisos LIV e LVII, da CF).

Com precisão, afirma-se que não há obrigação legal de comparecer ao interrogatório, motivo pelo qual o investigado não poderia ser forçado ao comparecimento. Ora, se pode permanecer em silêncio, por que deveria ser levado para o interrogatório contra a sua vontade?

Além disso, questiona-se o efeito surpresa das conduções coercitivas. A lógica do sistema penal é que nada poderia ser coercitivo sem prévia intimação para comparecer voluntariamente ao ato, o que, infelizmente, não tem sido observado, especialmente nas operações midiáticas.

Por derradeiro, o Ministro esclarece que a decisão liminar não invalida atos já realizados. De fato, reconhece que a inadequação é do tratamento dado ao investigado, e não do interrogatório em si.

Entendo que a decisão é tecnicamente excepcional, considerando que a condução coercitiva de investigados não encontra amparo constitucional e, da forma como é executada, viola até mesmo o art. 260 do Código de Processo Penal – que considero não recepcionado pela atual Constituição –, o qual dispõe: “Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença.”

Ora, na prática forense, as autoridades se valem da condução coercitiva com fundamento no art. 260 do CPP, mas violando o mesmo dispositivo legal, haja vista que quase nunca há o preenchimento do requisito “se o acusado não atender à intimação para o interrogatório”.

Um efeito perverso que pode decorrer da proibição das conduções coercitivas para interrogatório é o aumento do número de prisões temporárias com o fundamento de que são imprescindíveis para as investigações. Nesse caso, as autoridades deixariam de praticar uma arbitrariedade de algumas horas (conduções coercitivas) para praticarem arbitrariedades de alguns dias (prisões temporárias).

Salienta-se que, no caso das testemunhas, o art. 218 do Código de Processo Penal dispõe que, “se, regularmente intimada, a testemunha deixar de comparecer sem motivo justificado, o juiz poderá requisitar à autoridade policial a sua apresentação ou determinar seja conduzida por oficial de justiça, que poderá solicitar o auxílio da força pública.”

Evidentemente, em relação às testemunhas não haveria incompatibilidade com a Constituição, pois elas devem comparecer ao ato, principalmente se intimadas para tanto (art. 206 do CPP).

Por esse motivo, as ADPFs não questionam a condução coercitiva de testemunhas. Da mesma forma, também não questionam a condução de investigados ou réus para atos diversos do interrogatório, como o reconhecimento de pessoas.


Foto: Carlos Moura/STF

Evinis Talon

Mestre em Direito. Professor. Advogado.

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