Ideais políticos apontam para posições jurídicas
Por Thiago M. Minagé
Atualmente, vivemos uma enxurrada de notícias de corrupção, desvio de verbas públicas, descrédito do governo, falta de respeito dos governantes e assim por diante, colocando em dúvida a democracia e a forma de governo republicana. Crises como esta me fazem lembrar das tensões e períodos de prosperidade, como nos anos vinte e trinta, que puseram em causa, na Europa e nos EUA, o modelo do liberalismo econômico como válido ou não. Acreditando na assegurada “prosperidade” garantida, os EUA mergulhava na maior e mais grave crise econômica da sua história nos anos trinta, que começou com o crash da Bolsa de Nova Iorque em 1929, junto com a crise europeia, arruinando a todos os americanos e fazendo crescer o desemprego a índices jamais vistos, onde então começaram a questionar o liberalismo político e a democracia parlamentar[1].
Assim, algumas pequenas linhas devem ser escritas sobre o socialismo, que é uma doutrina política e econômica surgida no final do século XVIII e se caracteriza pela ideia de transformação da sociedade através da distribuição equilibrada de riquezas e propriedades, diminuindo a distância entre ricos e pobres. Karl Marx, um dos principais filósofos do movimento, afirmava que o socialismo seria alcançado a partir de uma reforma social, com luta de classes e revolução do proletariado, pois no sistema socialista não deveria haver classes sociais nem propriedade privada. Nesse sentido, todos os bens e propriedades particulares seriam de todas as pessoas e haveria repartição do trabalho comum e dos objetos de consumo, eliminando as diferenças econômicas entre os indivíduos.
Esse tipo de sistema é exatamente o oposto ao capitalismo, que se baseia na propriedade privada dos meios de produção e no mercado liberal, concentrando a riqueza em poucos, sugerindo uma reforma gradual da sociedade capitalista e se demarcando do comunismo, que se apresenta mais radical e defendendo o fim do sistema capitalista e queda da burguesia através de uma revolução armada.
Ocorre que as massas populares, afetadas pelo desemprego e seduzidas pela manipulação midiática, se agitaram revolucionariamente, indo ao ponto de intimidar as classes dominantes, as classes médias, que até então mantinham firme o liberalismo e foram as grandes vítimas da queda do poder de compra, perdendo toda a confiança no Estado burguês.
Nesse contexto, emergiram os nacionalismos, tanto mais exaltados e agressivos quanto os respectivos povos cultivando um sentimento de humilhação mundial, tais como os derrotados da I Guerra, como a Alemanha, e até mesmo os não satisfeitos/frustrados com a vitória, como o caso dos italianos.
Analisando os escritos sobre o tema, percebo que o fascismo nasce no seio do liberalismo e da democracia. No século XX, no término dos anos 20, movimentos ideológicos e políticos conseguem subordinar o individualismo e a liberdade ao Estado. Um Estado totalitário onde, de um lado de sua face, mostra uma versão revolucionária, se identificou com o comunismo e, de outro lado, apresenta uma versão conservadora com o fascismo. À época, surge então Mussolini, que se tornaria o grande percursor do fascismo, fundando uma associação nacionalista e posteriormente transformando-a num partido político.
Na ânsia de encontrar sustentabilidade, o fascismo passa a procurar subsídios técnicos e teóricos que firmassem seus alicerces, buscando encontrar princípios que substituíssem a doutrina Marxista de luta de classes, onde então “gritavam” pela solidariedade social entre as classes e firmavam o nacionalismo como forma de preservar a moralidade, os costumes e a tradição, rejeitando assim de forma veemente a democracia.
Hitler, que foi o fundador do Partido Nacional-Socialista em 1919, surge como verdadeiro salvador, alcançando mais de 14 milhões de votos, assumindo o poder em nome do “povo”, tudo por conta de uma verdadeira crise de identidade vivida à época na Alemanha, formando assim um verdadeiro governo de humilhados e desorientados do pós-guerra.
Nítida a relação entre o fascismo e a crise de identidade de uma nação, seja por vergonha ou humilhação, seja pelo sentimento de revolta que impregna o inconsciente coletivo, de tal forma que impede as pessoas de raciocinarem qual o real objetivo daqueles que almejam derrubar ou alcançar o poder[2].
Muitos se dizem indignados, humilhados, revoltados, inconformados, com escândalos de corrupção envolvendo políticos e empresários, problema este crônico que, desde o início das relações público/privado existe, ao ponto de gritarem por impeachment de um governo legítimo escolhido pela própria população.
Politicos surgem como “salvadores da pátria”, defensores da moral, dos bons costumes, tudo conforme a estratégia política de Hitler e Mussolini, sem comparativos, apenas constatações históricas.
As pessoas esquecem, ou mesmo não sabem que, pela oposição firme ao liberalismo à democracia e ao socialismo que surge o malsinado Estado totalitário fascista. Políticos e os politizados se intitulam reacionários, anti-democratas, contra o liberalismo e principalmente anti-socialistas.
As vontades e direitos individuais, como, por exemplo, a liberdade e a igualdade, tornam-se opositores ao fascismo por contrariarem à coletividade, devendo se subordinarem à supremacia do Estado, pregando assim a supremacia estatal em face do indivíduo, eliminando a oposição e impondo apenas uma forma de pensamento.
Ou seja, antes de criticar um posicionamento jurídico, necessário se faz entender os ideais políticos que forjam o ser que se manifesta, pois aquele que não possui um ideal político é como casa construída na areia: na primeira crítica desaba por falta de estrutura.
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[1] CARVALHO. Pedro Conceição. O FASCISMO E O NAZISMO. CIARI – Centro de Investigação e Análise em Relações Internacionais. www.ciari.org
[2] DE FELICE, Renzo, Breve História do Fascismo, Lisboa, 2005.