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Implicações da Criminologia na discriminação de pessoas com deficiência

Implicações da Criminologia na discriminação de pessoas com deficiência

Ao longo do tempo, desde a origem da Criminologia, não se pôde constatar uma unicidade doutrinária, pois não é observada uma padronização cientifica, já que existem diversas abordagens para adequá-la em um determinado local e período, conforme revelam estudos (PENTEADO FILHO, 2012).

Durante seu percurso histórico a Criminologia passou por vários conflitos teóricos travados por correntes como a Clássica, Positiva e Eclética. Ressalta-se ainda que escolas pertencentes ao mesmo seguimento ideológico distinguia preceitos científicos.

A primeira tinha como objeto de estudo a relação do direito de punir, com os problemas gerados pelo crime e sua punição (BITENCOURT, 2012). Neste sentido, Penteado Filho (2012) destaca a fundamentação da corrente clássica nas teorias utilitaristas, de Rousseau, e direito natural, de Grócio.

Já a segunda corrente baseava-se em princípios iluministas dos fisiocratas como foi exposto por Penteado Filho (2012). A escola positivista tinha como uma de suas características a sistematização de dados dos delitos e delinquentes (BITENCOURT, 2012).

Neste sentido, o contexto das escolas ecléticas apresenta características que possibilitam relacionar distintos paradigmas inerentes à historicidade das pessoas com deficiência e em diversos contextos sociais. Identifica-se no rol de escolas ecléticas a Terza Scuola italiana, a escola moderna alemã ou escola de política criminal, a qual teve com um de seus representantes Von Liszt, que adotava o método descritivo e classificatório que considerava a realidade empírica com nuances naturalistas (BITENCOURT, 2012).

Implicações da Criminologia na discriminação de pessoas com deficiência

O presente texto tem como foco o estudo da tipicidade da discriminação contra PCD (Pessoa com Deficiência). Conforme conceitua Shecaira (2012, p. 36), a Criminologia consiste em uma ciência cujos pilares podem impulsionar a implementação de um paradigma que reconheça as diferenças como fator intrínseco à dinâmica social.

A CDPD (Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência) conceitua discriminação e explicita a não discriminação como princípio. Nessa perspectiva reflete-se: qual a relação da ciência total do Direito Penal e a discriminação de PCD? Para elucidar tal problematização busca-se compreender as implicações provenientes da relação dos pilares da Criminologia com o delito de discriminação deste segmento.

Desprendendo-se de um método específico, descreve-se empiricamente aspectos inerentes à discriminação de PCD, origem, causas e analisa-se o panorama da política criminal relacionada ao delito. O resumo será fundamentado em leis que seguem a perspectiva da CDPD e baseia-se em autores que abordam a corrente criminológica eclética exposta por Franz von Liszt.

Seguindo essa corrente, Molina e Gomes (2002, p. 164-165) consideram que os três pilares do sistema das ciências criminais, inseparáveis e interdependentes são: Criminologia, Política Criminal e Direito Penal.

Partindo da dogmática penal e dos seus requisitos que caracterizam o crime, observa-se a origem da discriminação de PCD na Lei 13.146/2015, em seu artigo 88:

Art. 88. Praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão de sua deficiência:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

A discriminação fazia parte dos costumes sociais de determinadas épocas, por exemplo, o extermínio de pessoas com deficiência na antiguidade (FONSECA, 2000, p. 482). Esse contexto modificou-se através da luta das PCD alcançando-se a tipicidade da discriminação.

Marques (1997, p. 42) destaca que a ótica da dogmática penal fica restrita ao direito positivo. Ao analisar a referida ciência verifica-se sua circunscrição à resolubilidade de conflitos, existindo uma intervenção tardia, pois se limita à aplicação do tipo penal ao caso concreto.

Molina e Gomes (2002, p. 39) acrescentam que a criminologia apoia-se na gênese do crime, pois estuda suas causas empiricamente. Estas decorrem de barreiras sociais, impedindo a fruição dos direitos em igualdade de condições com os demais (BARBOSA, 2017, online).

Seguindo o contexto da escola italiana, a política criminal constitui um instrumento que direciona o combate e a prevenção de delitos (MIRABETE, 2011, p. 14). Corroborando, Baratta (2002, p. 201) acrescenta que a política criminal configura uma estratégia para a transformação social. Esse pilar da Criminologia estabelece uma ferramenta na redução do delito. Assim, a tipicidade de discriminação de PCD impulsiona a efetivação de seus direitos fundamentais.

Constatou-se que a discriminação originou de aspectos relacionados à historicidade das PCD e a tipicidade não é suficiente para extinguir esta violência. Como consequência, faz-se necessária a compreensão de suas causas e políticas direcionadas à prevenção da reincidência do fato delituoso.

Consideram-se vitais estudos criminológicos relativos à discriminação de PCD devido à política minimalista presente no sistema penal brasileiro, o que é evidenciado no artigo 77 do Código Penal (BRASIL, 1940) e na Lei 9.099/95 em seu artigo 76 (BRASIL, 1995). Esse contexto mínimo colabora com a recorrência de atos discriminatórios, obstaculizando a fruição dos direitos humanos nesta perspectiva.


REFERÊNCIAS 

BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal: introdução à sociologia do Direito Penal. 3. Ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002.

BARBOSA, Anderson. ‘Discriminação é a pior violência no mercado de trabalho’, afirma jovem com deficiência. Disponível aqui.

FONSECA, M. – Proteção Jurídica dos Portadores de Deficiência – In: IBAP – Instituto Brasileiro de Advocacia Pública & Editora Esplanada ADCOAS, São Paulo, Dezembro de 2000.

MARQUES, José Frederico. Tratado de Direito Penal, 1ª ed. v. 1. Campinas: Bookseller, 1997.

MIRABETE, Julio Fabbrini. FABBRINI, Renati N. Manual de Direito Penal. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2011.

MOLINA, Antonio García-Pablos de; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia. 4. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Assembléia Geral das Nações Unidas, 6 de dezembro de 2006. Disponível aqui.

SCHECAIRA, Sergio Salomão. Criminologia. São Paulo: Revista dos tribunais, 2012.


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Isabelle Lucena Lavor

Advogada (CE) e Professora

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