Impunidade na violência contra jornalistas atinge recorde HISTÓRICO no Brasil
No início do mês, jornalistas de diversas nacionalidades se reuniram em Washington, EUA, no evento promovido pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH) e pela Unesco para marcar o Dia Internacional para o Fim da Impunidade para Crimes contra Jornalistas, em 2 de novembro. Segundo dado, mais de 1.600 jornalistas foram assassinados nos últimos 30 anos e, como ressaltou Tawfik Jelassi, diretor-geral assistente para Comunicação e Informação da Unesco, “nove em cada dez desses crimes estão, até os dias de hoje, insolúveis, deixando seus perpetradores impunes”.
“Lamento, não posso falar hoje sem pensar nos 21 jornalistas palestinos, nos quatro jornalistas israelenses e no jornalista libanês que foram recentemente mortos só neste mês”, disse Khan. Jelassi disse que em Gaza foi registrada “a pior semana, em termos de violência contra jornalistas, dos últimos dez anos.”
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O representante da Unesco lembrou que a Ucrânia já se aproxima das taxas de homicídio de jornalistas do México, considerado o país mais perigoso para a profissão. A co-fundadora do Laboratório de Jornalismo de Interesse Público na Ucrânia, Nataliya Gumenyuk, disse que desde o início da invasão russa ocorreram mais de 540 crimes contra jornalistas. De um total de 68 jornalistas ucranianos mortos ao longo do conflito, dez foram assassinados no exercício da profissão. Outros 33 jornalistas foram sequestrados e 31 ficaram feridos.
Desde que foi criada em 1997, a Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão, vinculada à CIDH da OEA, registrou o assassinato de 507 jornalistas nas Américas. Parentes de jornalistas assassinados no exercício da profissão prestaram testemunhos aterradores. “Para nós, familiares de jornalistas assassinados ou desaparecidos, fica claro que no México não haverá justiça.”
Impunidade no assassinato de Pedro Palma
Evelien Wijkstra, diretora jurídica da organização não governamental Free Press Unlimited, contou que quatro anos atrás começou, com apoio da Repórteres Sem Fronteiras, um projeto que investigou 17 casos de jornalistas assassinados que acabaram sem solução em 16 países. Um dos casos foi o do jornalista brasileiro Pedro Palma no Rio de Janeiro. Wijkstra comentou que pretende apresentar os achados da investigação, a fim de iniciar a justiça, para o Observatório Nacional de Violência contra Jornalistas e Comunicadores, recém-criado pelo governo Lula no Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Em sua palestra, declarou que um dos principais objetivos do observatório é reconquistar a confiança dos jornalistas e comunicadores no país.
“Nos últimos tempos, o Brasil mergulhou em uma noite muito, muito escura, onde os direitos humanos, a liberdade de imprensa foram combatidos com violência pelo próprio governo. O observatório é uma iniciativa muito recente, muito pequena, mas temos procurado construí-lo com a sociedade civil, com os jornalistas, com os comunicadores, e principalmente para sair do nosso lugar de conforto e ir até os territórios. Não temos respostas exatas, mas acreditamos que começamos da maneira certa, que é compartilhando, trabalhando juntos, entendendo que o observatório não é para nós, é para toda a sociedade e principalmente para que a democracia volte a ser forte no Brasil.”
A Pública participou de uma conversa sobre assédio judicial, na qual este colunista mencionou recentes casos brasileiros, como a abertura de 144 processos contra o jornalista João Paulo Cuenca e processos contra a escritora e advogada Saíle Bárbara Barreto e os jornalistas José Cristian Góes e Amaury Ribeiro Júnior.
Eleições elevam preocupação com segurança dos jornalistas
Irene Khan, relatora na ONU, afirmou que as eleições são pontos críticos, já que as ameaças aos jornalistas aumentam. Foram documentados, nestes períodos eleitorais, 759 ataques individuais contra jornalistas, incluindo cinco assassinatos. O brasileiro Guilherme Canela, chefe do setor de Liberdade de Expressão e Segurança de Jornalistas na Unesco, disse que os “líderes políticos, mas não apenas os líderes políticos, os líderes religiosos, as celebridades, têm o dever, na esfera pública, de deixar claro que jornalistas e o jornalismo são essenciais para nossas democracias”.
“Os nossos dados sugerem que, quando pesquisamos, por exemplo, sobre a violência contra os jornalistas que cobrem os protestos, o discurso público contra os jornalistas está a gerar de fato violência contra eles. Contra as mulheres jornalistas e as mulheres parlamentares. Começa como uma violência online, muitas vezes relacionada com este discurso público contra as mulheres jornalistas ou contra as mulheres parlamentares, neste caso.”
No discurso de abertura do evento, Luis Almagro, secretário-geral da OEA, disse que ações criminais contra jornalistas são a mais ultrajante forma de censura.
‘Viver com medo não é uma opção’
Pedro Vaca, relator especial para a Liberdade de Expressão da CIDH da OEA, ressaltou que hoje há no mundo pessoas exercendo a liberdade de expressão em função do interesse público “em prisão ou perto de serem presas, em um ambiente tão tenso que implica saírem do lugar em que estão”.
“Isso leva a uma reflexão, mais do que sobre o Poder Judiciário, sobre sociedade, estado de direito e liberdade de expressão.”
Jorge Sánchez, o filho do jornalista Cerezo, assassinado no México, disse que o seu pai era indagado se também não tinha medo de morrer na mesma época em que o jornalista Gregorio Jiménez de La Cruz foi morto a tiros.
“Meu pai respondia: ‘Se nós ficarmos calados, as coisas não vão mudar. Se não fizermos nada, a coisa seguirá igual. Viver com medo não é uma opção’.”