Imputação de responsabilidade em órgãos colegiados da empresa
Imputação de responsabilidade em órgãos colegiados da empresa
Na última terça-feira, dia 25 de outubro de 2016, o Grupo de Pesquisa em Direito Penal Econômico e da Empresa da Universidade Pompeu Fabra em Barcelona promoveu o seminário intitulado “Intervención delictiva a través de las decisiones de órganos colegiados de la empresa” ministrado pelo Professor Dr. Albert Estrada, Universidad Autonoma de Madrid.
O foco da exposição foi a responsabilidade dos Conselheiros pelos delitos comissivos praticados em decorrência das decisões colegiadas dos órgãos que compõe. O tema é referente a parte da tese de Doutorado do Professor, recentemente publicada com o título: “Violaciones de secreto empresarial. Un estudio de los ilícitos mercantiles y penales” editora Atelier.
O tema foi abordado sob três aspectos, o problema da determinação de causalidade, a possibilidade da imputação do resultado por conta da relevância de abstenções e votos vencidos e, por fim, a forma de responsabilização, nas linhas de atribuição vertical e horizontal do conselho e de cada conselheiro.
Quanto à relação de causalidade das decisões tomadas além da maioria simples de votos, ou seja, quando excluindo-se um dos votos vencedores e a decisão se mantém, é interessante o destaque de que não se pode aplicar o princípio elementar da relação de causalidade conditio sine qua non.
Isto porque, se a decisão que deu origem a conduta delitiva foi tomada por votação além da maioria simples, excluindo-se o voto de um dos sujeitos o fato continuaria existindo, a decisão deste agente não é condição indispensável à ocorrência do fato. Neste caso, segundo ESTRADA, a teoria aplicável seria a teoria da condição conforme a lei natural, de PUPPE, onde se afere a causalidade concreta e cada voto tem natureza causal para o resultado.
No que se refere ao terceiro ponto analisado, da imputação de resultado ao conselheiro, a análise estaria balizada pelas atribuições do conselho (verticalmente) e pela atribuição de cada conselheiro (horizontalmente). Podendo-se imputar responsabilidade do resultado à decisão do conselho, no plano vertical, qual seria a responsabilização do conselheiro, no plano horizontal, ou seja, dentre seus pares na votação?
Quando a decisão importa em cometimento direto de delito a solução oferecida pela doutrina majoritária é a coautoria entre os conselheiros, porém, se a decisão é apenas ato preparatório de delito a ser praticado por um terceiro executor a situação se mostra mais complexa e deve ser resolvida pela aplicação de institutos de cumplicidade.
Contudo, o tema que despertou maior debate foi o segundo ponto destacado por ESTRADA. Haveria possibilidade de se imputar o resultado delitivo gerado por uma decisão colegiada no âmbito da empresa ao conselheiro que votou de maneira contrária ou se absteve na votação?
Segundo ESTRADA, havendo conhecimento prévio por parte do conselheiro de que seu voto será vencido, de que a decisão resultará na prática delitiva e que sua presença é indispensável à formação do quorum mínimo, ao comparecer à reunião e permitir que a decisão seja tomada, apenas por compor o quorum, o conselheiro poderá ser responsabilizado pelo delito.
A afirmação se sustentaria no fato de que os administradores da empresa (conselho de administração) possuiriam a posição de garante neste caso concreto, o dever de evitar que a empresa seja objeto da prática de crimes. Assim, ao permitir que a decisão ocorra, apenas por sua presença, mesmo que vote de forma contrária ou se abstenha de votar, poderia ser-lhe imputada a responsabilidade por violação de dever. Levantou-se a pergunta: o simples presença para formação do quorum não seria uma conduta neutra?
A posição adotada foi duramente criticada, especialmente, pela aplicação da teoria das condutas neutrais. O fato do conselheiro criar condições para que terceiras pessoas cometam crimes enquadrar-se-ia perfeitamente à descrição de condutas neutras, excluindo responsabilização criminal. Porém, segundo ESTRADA, o caso seria uma exceção à aplicação das causas neutrais justamente pela posição de garante ocupada pelo conselheiro, o que levou a discussão mais além: qual o dever atribuído ao conselheiro, exercer seu papel no colegiado e votar de forma lícita ou evitar a prática de ilícitos pelo conselho?
Aqui me parece que não se pode adotar uma interpretação extensiva da posição de garantidor do conselheiro. Seu papel (atribuição horizontal) limita seu dever a sua atuação dentro do conselho, não pode ser imputado como responsável pela evitação de delitos praticados pela empresa de forma ampla, mesmo porque esta atribuição deverá ser definida dentro da estrutura de divisão de trabalho inerente à complexidade empresarial, incursionando no que seria a atividade de um departamento de compliance.
A delimitação de responsabilidades nos órgãos colegiados é um tema muito amplo e complexo que merece muito aprofundamento teórico e reflexão, especialmente diante do papel central ocupado pela empresa na sociedade.
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