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Da insuficiência da prisão em flagrante

Da insuficiência da prisão em flagrante

O termo flagrante provém do latim flagrare, que significa queimar, arder. É o crime que ainda queima, isto é, que está sendo cometido ou acabou de sê-lo. (CAPEZ, 2012, p. 314).

A prisão em flagrante é a modalidade de prisão mais abrangente que existe. É uma prisão universal, pois possibilita que qualquer do povo, inclusive a vítima, prenda o agente que for encontrado em estado de flagrância.

Nota-se que, ao povo, a possibilidade de realizar a prisão daquele que esteja em flagrante delito é algo facultativo. A depender da situação, realizar a captura do indivíduo que está em flagrante delito é uma conduta arriscada, tendo em vista que o popular não possui conhecimento técnico algum para efetuar a captura; não possui treinamento para efetuar a prisão de quem quer que seja.

Por isso, recomenda-se deixar esse tarefa a cargo daqueles que possuem o dever legal de efetuar a prisão.

Com efeito, apenas a título de curiosidade, cumpre mencionar que o particular que efetua a prisão em flagrante não comete conduta típica, pois sua atuação está amparada pela excludente de ilicitude do exercício regular de um direito, já que o art. 301 do Código de Processo Penal estabelece que qualquer do povo pode prender quem quer que seja, desde que esta pessoa se encontre em flagrante delito.

Por outro lado, a autoridade Policial e qualquer de seus agentes, nas situações em que tenham ciência e condições suficientes para efetuarem a prisão, caso não realizem a referida prisão, respondem criminalmente pela omissão, que nesse caso é penalmente relevante, já que tinham ciência e possibilidade de agir.

As hipóteses de flagrante delito estão previstas nos incisos I, II, III e IV do art. 302 do Código de Processo Penal:

Art. 302.  Considera-se em flagrante delito quem:
I - está cometendo a infração penal;
II - acaba de cometê-la;
III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;
IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

Os dois primeiros incisos são conhecidos pela doutrina majoritária como hipóteses de flagrante próprio. Já os dois últimos são os famigerados quase flagrantes ou flagrantes impróprios. Recebem está nomenclatura porque são considerados mais frágeis, já que o agente delituoso não está mais na cena do crime.

Partindo dessa premissa, iremos analisar a questão da insuficiência e da precariedade da prisão em flagrante no intuito de manter alguém preso, sem que haja uma apreciação da prisão por parte de um juiz competente.

A prisão em flagrante é uma medida cautelar de natureza administrativa, visto que ninguém pode ser mantido preso por conta de um flagrante.

Em outras palavras, essa modalidade de prisão tem por escopo apenas capturar o agente que foi surpreendido praticando uma infração penal. Já a manutenção ou não da custódia do autor do fato depende do magistrado, que, a depender do caso concreto, irá ou não ratificar o flagrante, mantendo ou não o indivíduo preso.

A prisão em flagrante, em sua ideia tradicional, é aquela que pode ser visualizada; é aquela que salta aos olhos. A percepção da conduta delituosa é o que legitima a prisão daquele que está em estado de flagrância.

Assim sendo, após a consumação dessa modalidade de prisão, o preso deve ser submetido ao juiz competente para que ele analise se é caso ou não da manutenção da prisão.

Caso o juiz entenda que estão presentes os requisitos da prisão preventiva, ele deve converter o flagrante em prisão preventiva ou decretar alguma medida cautelar diversa da prisão.

Caso verifique que a prisão padece de alguma ilegalidade, o juiz deve relaxar o flagrante. E, por fim, caso o juiz entenda não estarem presentes os requisitos que autorizam a preventiva, ele deve conceder liberdade provisória com ou sem fiança, a depender do caso.

Nota-se que o indivíduo não pode permanecer preso em razão de um flagrante por tempo indeterminado, pois a prisão em flagrante possui natureza pré-cautelar, não servindo para manter ninguém preso.

A prisão em flagrante é uma medida pré-cautelar, de natureza pessoal, cuja precariedade vem marcada pela possibilidade de ser adotada por particulares ou autoridade policial, e que somente está justificada pela brevidade de sua duração e o imperioso dever de análise judicial em até 24h, nas quais cumprirá ao juiz analisar sua legalidade e decidir sobre a manutenção da prisão (agora como preventiva) ou não (LOPES JR., 2013, p. 52).

Percebe-se que a precariedade da prisão em flagrante advém do fato de ser insuficiente para que alguém permanece preso por tempo indeterminado. Já a natureza pré-cautelar se dá em razão do fato da prisão em flagrante ser um instrumento que possibilita a decretação de uma medida cautelar pessoal.

Sendo assim, é correto afirmar que a prisão em flagrante tem por fim, única e exclusivamente, servir de instrumento para que a prisão preventiva possa ser decretada. É, portanto, uma medida que antecede a prisão preventiva.

Por fim, conclui-se que toda prisão necessita de fundamentação e de análise judicial para que perdure, não se podendo falar em prisão em flagrante por tempo indeterminado, pois o flagrante é uma mera detenção, de natureza precária e pré-cautelar, ou seja, é uma medida insuficiente.

Valendo-se afirmar ainda que é inadmissível, nos dias atuais, a prisão para averiguação ou qualquer outra forma de detenção, no intuito de investigar a prática de um crime, ou simplesmente no intuito de restringir a liberdade do indivíduo, pois a restrição à liberdade só é legal nos casos expressamente previstos em lei.

Pode-se afirmar, portanto, que na verdade o que ocorre é que o indivíduo capturado em flagrante fica detido até que seja encaminhado a um juiz para que o mesmo decida a respeito de sua liberdade.

Em razão do exposto, nota-se que a realização das audiências de custódias, com a apresentação imediata do acusado ao magistrado, é de suma importância, pois se faz necessário que se decida o quanto antes acerca da manutenção ou não da prisão.

O flagrante não tem força suficiente para deixar uma pessoa presa de forma indeterminada, já que possui natureza precária e pré-cautelar.


REFERÊNCIAS

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

LOPES JR, Aury. Prisões Cautelares. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

Daniel Lima

Mestrando em Direito Penal e Ciências Criminais. Especialista em Direito Penal e Processo Penal. Advogado.

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