Internação involuntária do dependente químico e o princípio da dignidade da pessoa humana
Internação involuntária do dependente químico e o princípio da dignidade da pessoa humana
Sabe-se que os esforços empreendidos contra as drogas no Brasil envolvem vários setores da sociedade para conscientizar, tratar, educar e curar os dependentes das drogas lícitas e ilícitas, sendo que estas ainda são objeto de empenho para proibir e reprimir, motivo pelo qual a luta é constante e diária da coletividade e do Estado.
O comprometimento para diminuir os efeitos maléficos das drogas instaladas na sociedade inicia-se desde a educação de nível fundamental até a conscientização de adultos sobre o uso abusivo de entorpecentes lícitos e a proibição e repressão das que são ilícitas.
Não obstante a presença de políticas públicas para evitar e reduzir o número de pessoas usuárias de tóxicos, no Brasil existe milhões de dependentes de drogas e álcool, cujas vidas estão destruídas e torna-se um problema social, pois vivem às margens da sociedade sem direito a uma vida digna e saudável.
É cediço que a orientação e a repressão estatal se tornam insuficientes para se atingir o pleno restabelecimento mental, físico e social dos dependentes de narcóticos quando atingem uma fase de dependência extrema, tornando-se hiper vulneráveis.
A condição de vulnerabilidade que atinge milhares de dependentes químicos no Brasil retira suas capacidades de escolhas, de optar entre permanecer alimentando o vício ou restaurar sua dignidade e saúde mediante tratamento médico adequado.
Diante disso, a recente edição da Lei n. 13.840/2019 é de grande importância, tendo em vista que sua finalidade é justamente suprir essa lacuna social e jurídica para resolver a questão da resistência do dependente em se tratar.
A redação do art. 1º da Lei n. 13.840/2019, assim dispõe: “altera a Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, para tratar do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, definir as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e tratar do financiamento das políticas sobre drogas e dá outras providências.”.
A lei objeto de análise prevê ainda a internação involuntária, na forma do art. 23-A, § 3º, II e § 5º, I ao IV, sendo que o § 6º do mesmo dispositivo legal impõe que só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.
Desse modo, entendo que a nova legislação visou amparar de forma taxativa a possibilidade de internação involuntária do dependente químico, cuja finalidade maior é proporcionar a dignidade da pessoa humana e, consequentemente, garantir o direito à saúde que é dever do Estado mediante processo de desintoxicação e demais resultados porventura obtidos.
Isso porque, considerando o mencionado fato da hiper vulnerabilidade de alguns dependentes químicos e a frágil condição psíquica os impedem de optarem voluntariamente por um tratamento, levando-os a perderem a dignidade como ser humano, pois os mesmos entendem que o sofrimento causado pelo vício e seus efeitos colaterais tornam-se menos dolorosos que o tratamento médico.
A ausência de força psíquica e física para optar pelo tratamento os leva a permanecerem no uso constante das drogas, mesmo que isso custe a perca da vida, família, trabalho e saúde. Logo, o indivíduo também perde a sua autonomia da vontade.
Neste contexto, entendo que a legislação se coaduna com princípios, direitos fundamentais, tais como o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, promoção dos direitos humanos, direito à saúde, à vida (art. 1º, III, 4º, II, 5º, caput, CRFB/88), bem como atende à promoção do bem de todos (art. 3º, IV, CRFB/88).
O sujeito, ao perder sua autonomia da vontade, necessita de intervenção estatal que, no presente caso, somente será admitida como último dos recursos e terá prazo limite, entre outros requisitos.
Importa salientar que a posição adotada a respeito da nova legislação tem como base uma visão social e jurídica da questão, eis que opinião médica e assistencial sobre o assunto compete aos profissionais da área, cuja formação depende de experiência e conhecimento da medicina e assuntos correlatos.
Diante do exposto, entendo que a Lei n. 13.840/2019 está em conformidade com o texto constitucional e visou proporcionar ao cidadão dependente químico o restabelecimento do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, o qual é considerado como pilar do ordenamento jurídico brasileiro e, por consequência, promove a efetividade dos direitos humanos.
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