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Investigação defensiva e a minimização das injustiças

Investigação defensiva e a minimização das injustiças

Em dezembro de 2018 o Conselho Federal da OAB editou o Provimento nº 188/2018, regulamentando a investigação defensiva.

Consiste a investigação defensiva basicamente na atuação ativa da defesa – pública ou privada – nas investigações preliminares, produzindo diretamente as provas de interesse do cidadão representado. Ou seja, “defende-se provando”.

Não obstante o referido provimento, pelo menos desde 1988 já pode ser verificada a existência de regulamentações legais sobre o tema, das quais, embora esparsas e comedidas, possibilitavam certa atuação da defesa.

Para o escopo deste texto, delimita-se como primeiro grande marco a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que trouxe algumas previsões, especialmente as garantias do devido processo legal (art. 5º LIV), do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV), mas também da isonomia (art. 5º, caput; e art. 133), colocando a representação do cidadão pelo advogado em paridade com a acusação pública.

Importante destacar que a garantia do contraditório e da ampla defesa já era assegurada, segundo disposto no artigo 5º, LV, da CRFB/1988, “em processo judicial ou administrativo”, não deixando, portanto, margem a dúvidas acerca da autorização de atuação defensiva mesmo nas investigações preliminares.

Assim, a despeito de majoritárias posições em contrário, se vislumbrava um direito ao contraditório e à ampla defesa, ainda que limitado, nos procedimentos investigatórios.

Além da Constituição, o artigo 7º, XXI, “a”, da Lei Federal 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB), já trazia algumas possibilidades de investigação defensiva, como a possibilidade de apresentação de razões e quesitos pelo advogado.

Por sua vez, o Código de Processo Penal também já previa, no artigo 14, a possibilidade de a defesa requerer diligências à autoridade responsável pela investigação.

Como se observa, antes mesmo desse provimento da OAB, já era possível constatar algumas possibilidades de investigação defensiva, que, muito embora não concedessem autonomia ao advogado, lhe permitia indicar elementos de provas, arrolar testemunhas, apresentar perguntas e quesitos e, inclusive, apresentar razões capazes de influenciar a conclusão da apuração.

Não obstante as citadas regulamentações, percebe-se que estavam muito aquém das possibilidades conferidas à parte acusadora e das exigências decorrentes do contraditório, no sentido de uma verdadeira construção participada da decisão, fato que não atende, a contento, as exigências da lógica do devido processo legal.

Como se não bastasse, a cultura das investigações preliminares no Brasil é de francas imposições de empecilhos à atuação ativa e passiva da defesa, não raro com práticas que inclusive vedam de ciência a provas, em frontal desrespeito à Súmula Vinculante n. 14, fatos que, a depender da estratégia da defesa, ensejariam inclusive um direto recurso de Reclamação ao STF, caso não opte pelo HC.

Muito bem, diante dessa deficiência legal é que se apresenta a proposta do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, visando ao aprimoramento da investigação defensiva brasileira para adequá-la às diretrizes constitucionais.

Com o advento do Provimento nº 188/2018 do CFOAB, a investigação defensiva recebeu uma regulamentação muito mais pormenorizada, inclusive com a especificação dos meios de atuação do advogado, conforme se extrai do seu artigo 3º, que apresenta um leque de possibilidades de produção probatória da defesa, assegurando uma efetiva participação na construção dos provimentos.

Outra disposição que merece destaque é a do art. 4º do Provimento nº 188/2018 do CFOAB, o qual especifica as modalidades de provas passíveis de serem produzidas.

Observa-se que, por meio dessa previsão, a efetiva pormenorização de atividades eminentemente de investigação defensiva, dando à defesa, inclusive, autonomia para a reunião de elementos informativos ou mesmo produção de provas eventualmente irrepetíveis, o que dispensaria, por exemplo, requerimentos à autoridade presidente da investigação pública para expedição de ofícios a instituições requisitando documentos, intimações e colheita de depoimentos, além de outras diligências.

Assim, considerando que a investigação defensiva é um pressuposto do sistema acusatório, previsto da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, referido provimento acaba por melhor regulamentá-la, ratificando a autorização constitucional – sobretudo do contraditório – do advogado produzir, diretamente, elementos informativos e provas irrepetíveis na investigação preliminar.

Não é só!

Uma das principais funções do Direito Processual Penal no Estado Democrático de Direito é a minimização dos ricos de injustiça, de tal sorte que seja exigido que se respeite as garantias fundamentais dos acusados e dos investigados, prevenindo-se erros jurisdicionais.

Não por outro motivo a investigação defensiva se apresenta como um importante instrumento de prevenção de erros jurisdicionais e, por consequência, minimização de injustiças, já que amplia o campo de análise em qualquer das fases da persecução criminal – não se ouvindo apenas um lado do conflito.

Como se não bastasse, a investigação defensiva também garante uma efetiva economia processual, já que não precisaria aguardar a fase judicial para uma participação mais ativa da defesa; pelo contrário, a autonomia defensiva por ela viabilizada desde a fase preliminar pode proporcionar inclusive o arquivamento da investigação, não sendo necessário uma (inútil e agonizante) fase judicial para tanto.

Portanto, constitui a investigação defensiva um importante aliado para a redução das possibilidades de prosseguimento de investigações de inocentes, a ponto de minimizar as injustiças!


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Núbio Mendes Parreiras

Mestrando em Direito Penal. Especialista em Ciências Penais. Advogado.

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