Investigação preliminar: fase pré-processual inquisitória
Falar sobre a lógica inquisitória que permeia a Investigação Preliminar, fase esta que ocorre antes da propositura da Ação Penal, e por isso chamada de pré-processual, é um tanto quanto necessário, antes mesmo de falar sobre processo ou Sistema Processual, até porque, por óbvio, não há processo (ainda).
No entanto, abordar-se-á de modo a (des)construir certos raciocínios perpetuados pelo ensino jurídico brasileiro, deixando para ensaios futuros a conceituação de Sistema, Sistema Processual Penal, Sistema Processual Penal Inquisitivo e Sistema Processual Penal Acusatório, bem como a apresentação de suas características.
Os Sistemas Processuais (Acusatório e Inquisitório) são mistos por si só, isso porque, afastando a (im)possível existência de um Sistema Processual Penal puro, deve-se prevalecer o tratamento e análise da predominância das características de um ou de outro, de modo a “identificar o princípio informador de cada sistema, para então classificá-lo como inquisitório ou acusatório” (LOPES JR, 2016, p. 41).
Assim, o Sistema Inquisitivo é predominantemente ou, em essência, inquisitivo e o Sistema Acusatório é predominantemente ou, em essência, acusatório.
Ainda, conceber a existência um Sistema Processual Penal Misto é, entender que, na fase processual, incorre, a um só tempo, características inquisitivas e acusatórias, ou seja, que os dois Sistemas ali existem, simultaneamente, em caráter predominante, o que é totalmente desarrazoado, “não podendo admitir a coexistência de princípios (no plural) na origem do sistema kantiano, isso porque a compreensão de sistema decorre da existência de um princípio unificador, capaz de derivar a cadeia de significantes dele decorrentes” (ROSA, 2016, p. 149).
Predomina-se um em detrimento do outro.
No entanto, não há como confundir quando, em se tratando da Persecução Criminal, a qual aborda duas fases, a investigativa ou administrativa e a judicial, a coerência na concepção mista, se, no ordenamento jurídico analisado, uma fase for predominantemente inquisitorial e a outra, em sua essência, acusatória.
Dessa forma, Persecuções penais que possuem, em suas fases, a predominância de aspectos de apenas um modelo, seja ele inquisitivo ou acusatório, não será misto, por certo.
Nesse diapasão, como último sustentáculo ao que foi proposto, tem-se que a inquisitoriedade da fase preliminar, não pode ser confundida com a inquisitoriedade (ou não) do processo penal, em separado, bem como análise da persecução penal como um todo deve observância ao estudo em separado das fases que a compõem, sob pena de confundir quando lógico ou ilógico for o emprego do termo “misto”.
A Investigação Preliminar é em essência inquisitória, visto que a produção e valoração das provas estão na mão da autoridade policial, o qual também é responsável pelo indiciamento do sujeito investigado e ausente princípios basilares de natureza acusatória como a ampla defesa e contraditório.
Ademais, a presença de atos autoritários, unilaterais, como a iniciativa probatória do juiz, o indiciamento, a busca da verdade (utópica, para além da capacidade humana, sobrenatural), a qual justifica, em nome dela, práticas antidemocráticas, dissonantes dos direitos humanos e dos deveres estatais, persistentes e presentes na primeira fase da persecução, é que a constituem inquisitória.
A (re)formulação das regras que constituem o jogo investigativo, que disciplinam a fase preliminar, é necessária, constatado que a ausência contribui para a fomentação do autoritarismo (QUEIROZ, 2017, p. 80), bem como a adequação das condutas dos jogadores que atuam nesta partida, é para que se jogue constitucionalmente.
REFERÊNCIAS
LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal. 13. ed. Florianópolis: Saraiva, 2016.
QUEIROZ, David. A permeabilidade do processo penal. Florianópolis: Empório do Direito, 2017.