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Legalização ou liberação das drogas?

Legalização ou liberação das drogas?

É extremamente corriqueiro para quem milita pela legalização das drogas, seja apenas da maconha – a mais comum – ou de todas elas, ouvir que “liberar” as drogas é uma medida radical demais, constituindo um alto risco para a sociedade.

Legalização ou liberação?

Legalização e liberação podem parecer sinônimos. Contudo, no que tange à questão das drogas atualmente ilícitas se faz de suma importância estabelecer algumas distinções.

Há, hoje em dia, uma visão bastante deturpada de qual seria o cenário do dia a dia da sociedade caso a maconha ou todas as drogas fossem legalizadas. Algumas pessoas chegam a pintar um cenário quase que apocalíptico desse evento, como se essa eventual legalização significasse o popular “liberou geral”, em que as pessoas sairiam fumando seus cigarros ou inalando cocaína nas ruas, no trânsito, no ambiente de trabalho, dando e distribuindo baforadas para todos os lados. Não, longe disso. Essa interpretação é incorreta.

Quem prega a legalização das drogas, e o faz de forma responsável, deseja que exista, na verdade, uma regulação e controle de todo o processo referente a essas substâncias, desde a sua produção, passando pelo comércio e chegando até o consumo. Dentro de um marco regulatório legalizado também seria possível instituir impostos que, considerando o tamanho desse mercado no Brasil, permitiria uma arrecadação de bilhões de reais ao ano, podendo ser revertidos em serviços de maior qualidade para a população em geral, como em educação, saúde e na própria segurança pública. 

“Liberadas”, a maconha e as outras drogas ilícitas JÁ estão! Aliás, elas sempre estiveram, pois sendo sua venda monopolizada ao traficante, não é possível fazer qualquer tipo de controle sobre quem está fazendo uso da droga e exatamente o que essa pessoa está consumindo. 

Para seguirmos no exemplo da maconha, estamos falando de uma substância menos inofensiva do que muitos legalistas pregam. A cannabis, se utilizada por adolescentes ou adultos jovens, com o desenvolvimento do cérebro ainda em progresso, pode acarretar em distúrbios neurológicos e psiquiátricos, especialmente se tiverem predisposição genética para tanto. Tomando isso por base, o que é mais racional? Deixarmos toda a venda de uma substância potencialmente lesiva a cargo de traficantes (que só visam lucro) ou buscarmos um meio que garanta um controle mínimo sobre o quê e para quem é vendido? 

Ao indivíduo que visita a “boca de fumo” para adquirir maconha, por exemplo, certamente não é requisitado documento de identidade para comprovar se é maior de 18 anos, nem indagado a respeito de possuir histórico de transtorno mental que possa vir a ser agravado com o uso da droga, ou muito menos garantir que o que está sendo vendido é, de fato, uma substância pura, livre de adições de produtos químicos extremamente perigosos (muitas vezes mais nocivos que a própria droga em si).

Quando se fala em legalização e, consequentemente, em regulação, naturalmente surge a expressão “redução de danos” que, partindo da premissa de que as pessoas vão usar drogas, sendo elas proibidas ou não, oferece uma proposta realista e palpável à questão do abuso de substâncias, que é procurar minimizar o problema, aumentando o controle sobre todo o processo, como já referido.

Além dos mecanismos de controle e regulação já citados, é possível mencionar alguns outros igualmente importantes, como a proibição de propaganda positiva, restrição dos locais permitidos para uso e controle dos preços de venda, como é feito com o tabaco, com resultados expressivos na queda do consumo. Há, também, a possibilidade de se instituir “bafômetros” que identifiquem outras substâncias além do álcool, para evitar que motoristas dirijam sob efeito destas. Essa tecnologia já existe, basta aplicar.

Existem, portanto, meios efetivos para diminuir o impacto do consumo pessoal de drogas que não sejam através da proibição e muito menos de uma “liberação geral”. Estudos apresentados pela ONU (2017, apud SZABÓ; RISSO, 2018, p. 87) apontam que somente cerca de 12% dos usuários desenvolvem algum tipo de relação problemática com alguma droga ao longo da vida. Assim, a pretexto de “proteger” (sem sucesso) essas pessoas de criarem algum tipo de adição, instituiu-se uma proibição que, primeiro, não evita que esses 12% entrem em contato com substâncias perigosas e ainda gera, para todo o resto da população, efeitos extremamente nefastos, como o fortalecimento do crime organizado, a decorrente violência urbana, a corrupção policial e o encarceramento em massa, entre tantos outros. 

É preciso, mais do que nunca, inverter essa lógica. Meios para tanto, existem, e isso não significa “liberar geral”, pelo contrário. 


REFERÊNCIAS

SZABÓ, Ilona; RISSO, Melina. Segurança pública para virar o jogo. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.


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