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Lei 13.245/2016: contraditório e ampla defesa na investigação criminal?


Por Francisco Sannini Neto


Foi publicada no dia 12 de janeiro de 2016 a Lei °13.245/16, que alterou o artigo 7° do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, criando, quase que incontinenti, uma celeuma na doutrina processual penal, uma vez que a inovação legislativa afetou diretamente a fase preliminar de investigação criminal.

Antes de qualquer comentário mais detido sobre o tema, consignamos logo no início desse estudo que a nova lei fortalece o principal instrumento de apuração de infrações penais dentro do nosso ordenamento jurídico: o inquérito policial. Isto, pois, a partir de agora a participação da defesa na fase de investigação ganhou um destaque ainda maior, o que demonstra o compromisso do legislador e do próprio Estado com uma persecução penal inteiramente democrática e pautada pelos princípios e valores constitucionais.

É preciso que se acabe com essa visão reducionista acerca da investigação criminal, sempre tratada como um procedimento inquisitivo, sem qualquer compromisso com os direitos fundamentais das pessoas envolvidas nesta indispensável fase da persecução penal. Por óbvio, não olvidamos o fato de o inquérito policial ser uma peça “dispensável” para a propositura da ação penal. Entretanto, na prática quase a totalidade dos processos são iniciados com base neste procedimento investigativo de polícia judiciária.

Na verdade, defendemos o entendimento de que a investigação criminal preliminar constitui um direito fundamental do indivíduo. É o que chamamos de devida investigação criminal constitucional. Ora, tendo em vista as consequências extremamente deletérias ocasionadas pelo processo, é imprescindível que antes do seu início fique demonstrada a prova da materialidade do crime e os indícios suficientes de autoria contra uma determinada pessoa, sendo que apenas um instrumento devidamente regulamentado por lei e conduzido pelo próprio Estado poderia viabilizar a justa causa necessária ao exercício de uma pretensão acusatória.

Nesse contexto, muito além de um direito individual, a fase preliminar de investigação representa um obstáculo a ser superado pelo Estado antes de ingressar na fase processual com fim de exercer, de maneira legítima, o seu poder-dever de punir, cabendo ao Poder Judiciário realizar essa filtragem com base nos elementos coligidos na investigação criminal e expostos na ação penal cabível.

Justamente por isso, vemos com bons olhos as alterações no Estatuto da OAB, que representa mais um avanço no sentido de reforçar os princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa dentro da investigação criminal, sem que, com isso, ela perca sua essência inquisitiva e sigilosa. Em outras palavras, os mencionados princípios devem ser observados na exata medida em que não prejudiquem a eficácia da investigação, preservando, assim, os direitos do investigado durante toda a persecução penal.

Sob tais premissas, Fauzi Hassan Choukr (2006, p. 08) conclui que

a dignidade da pessoa humana como fundamento maior do sistema implica a formação de um processo banhado pela alteridade, ou seja, pelo respeito à presença do outro na relação jurídica, advindo daí a conclusão de afastar-se deste contexto o chamado modelo inquisitivo de processo, abrindo-se espaço para a edificação do denominado sistema acusatório. Fundamentalmente aí reside o núcleo de expressão que afirma que o réu (ou investigado) é sujeito de direitos na relação processual (ou fora dela, desde já na investigação), e não objeto de manipulação do Estado.

Como bem apreendido por Choukr, o respeito à presença do outro na relação jurídica, no caso, o investigado, é a principal razão de existência da inovação legislativa em comento, viabilizando a participação da defesa dentro de um procedimento que tem o poder de retirar a essência do indivíduo, vale dizer, sua intimidade (na interceptação telefônica), seu patrimônio (nas medidas assecuratórias) e, finalmente, sua liberdade (nas prisões cautelares).

Nas próximas colunas faremos uma análise pormenorizada da Lei.


REFERÊNCIAS

CHOUKR, Fauzi Hassan. Garantias Constitucionais na Investigação Criminal. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

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Francisco S. Neto

Mestre em Direitos Difusos e Coletivos. Delegado.

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