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Caso Liana Friedenbach e Felipe Caffé: vítimas de Champinha

Caso Liana Friedenbach e Felipe Caffé: vítimas de um inimputável

O CRIME

O jovem casal apaixonado, Liana Friedenbach (16 anos) e Felipe Caffé (19 anos), em busca de uma aventura, resolveu viajar para a zona rural da grande São Paulo, mais especificadamente para um sítio localizado no município de Embu-Guaçu, local este conhecido por Felipe, visto que o rapaz havia passado suas férias lá. O que o casal não sabia era que no decorrer da viagem seus caminhos se cruzariam com os de seus assassinos.

Como Liana Friedenbach estava namorando havia poucos meses, a moça temeu que seu pai não autorizasse a viajar com o namorado, razão pela qual lhe contou que no final de semana que estava por vir, viajaria com o grupo de jovens da comunidade israelita para o município de Ilhabela. Já Felipe, avisou sua mãe que iria acampar, mas não mencionou sua companhia, de modo que a mãe do rapaz presumiu que seria com seus amigos.

Dessa forma, no dia 31 de outubro de 2003, sexta-feira, o casal começou sua jornada rumo ao município de Embu-Guaçu. Ao anoitecer, resolveram passar a noite no vão livre do MASP, na Avenida Paulista, de modo que ao raiar do dia, por volta das 05h, caminharam até o terminal rodoviário do Tietê para pegar o ônibus com destino a referida municipalidade.  

Às 9h chegaram em Embu-Guaçu, mas como o sítio que tinham em mente era mais afastado, pegaram outro ônibus, rumo a Santa Rita e ainda andaram por aproximadamente 4km até acharem o local propício para acampar.

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O local que o casal escolheu para acampar (Reprodução)

Enquanto o casal estava caminhando pelo vilarejo, chamaram atenção de toda a comunidade local, pois estavam carregando muitas bagagens, se vestiam de forma mais privilegiada que os moradores dali, além do fato de Liana naturalmente ter chamado atenção por conta de sua beleza. Nesse momento, foram avistados por Roberto Aparecido Alves Cardoso, conhecido por Champinha, e, Paulo Cézar da Silva Marques, vulgo Pernambuco, que seguiam para pescar no lago.

Quando já estavam devidamente alocados em sua barraca, foram surpreendidos por Champinha e Pernambuco, que anunciavam assalto. Ocorre que como não foi achado valor significativo em dinheiro nem bens, resolveram sequestrar os jovens, seguindo para a casa de Antônio Caetano Silva, que serviria de cativeiro.

O cativeiro era um local altamente insalubre e anti-higiênico. A dupla criminosa separou o casal durante o cárcere privado, vez que ficaram em cômodos diferentes da residência. Temendo o que os criminosos poderiam fazer, Liana Friedenbach informou que pertencia a uma família de classe média alta, por isso poderiam pedir uma grande quantia em dinheiro, a título de resgate, desde que os entregassem salvos.

Ainda no primeiro dia do sequestro, isto é, no dia 1 de novembro de 2003, Pernambuco estuprou Liana, enquanto seu namorado permanecia no outro quarto. Dado ao estado de choque e medo que sentia, a jovem não conseguiu reagir.

No dia seguinte, os criminosos chegaram a conclusão de que não seria importante a manutenção de Felipe no sequestro, razão pela qual resolveram executar o garoto. Assim, saíram com os jovens rumo ao matagal do vilarejo, Pernambuco guiando Felipe e Champinha guiando Liana.

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Roberto Aparecido Alves Cardoso, o Champinha (Reprodução)

Em certo momento, Champinha parou a caminhada com Liana e Pernambuco a continuou com Felipe, até que aqueles os perdessem de vista. Pernambuco, com a vítima de mãos atadas, ordenou que ele se ajoelhasse e disparou um tiro, a queima roupa, em sua nuca. Ao ouvir o disparo, Liana perguntou a Champinha o que estava acontecendo, obtendo como resposta a mentira de que o Felipe havia sido liberado.

Felipe Caffé morreu no dia 2 de novembro de 2003.

Após a execução, Pernambuco foge para São Paulo e Liana fica em poder apenas de Champinha. No mesmo dia da morte de seu namorado, ao anoitecer, a jovem é novamente estuprada, dessa vez por Champinha.

Ante a falta de notícias da filha, o pai de Liana, preocupado, ligou para várias de suas amigas pressionando por informações, oportunidade na qual soube que, na verdade, Liana viajou com o namorado para Embu-Guaçu.

Em razão disso, acreditou que o casal poderia ter se perdido na mata e acionou o Comando de Operações Especiais para que encontrassem os desaparecidos, Liana e Felipe. Assim que o COE iniciou as buscas, acharam a barraca e os pertences do casal, inclusive o celular de Liana.

No cativeiro, chegou Antônio Caetano Silva, dono do imóvel, acompanhado de um amigo, Agnaldo Pires. Champinha apresentou Liana como sua namorada e ainda a ofereceu aos comparsas, de modo que Agnaldo Pires teria aceitado a “oferta” e abusado sexualmente da moça.

Enquanto isso, as buscas para achar Liana e Felipe ficavam cada vez mais intensas, mobilizando toda a imprensa nacional. Por vezes o pai de Liana fez apelos nas mídias. Em consequência disso, um grande empresário, comovido com a situação, lhe ofereceu um helicóptero, para que pudessem jogar folhetos com a foto do casal desaparecido, objetivando que todos da região tomassem conhecimento e ajudassem nas buscas, o que fora prontamente aceito.

Ocorre que com o grande alarde, no dia 3 de novembro de 2003, o irmão de Champinha foi ao seu encontro informar que sua mãe estava preocupada com sua ausência em casa e que a polícia estava realizando grandes rondas na região. Ao perceber que seu irmão notou a presença de Liana, Champinha a apresentou como sua namorada.

No dia 5 de novembro de 2003, dada a imensa repercussão do crime e temendo ser descoberto, Champinha decide matar Liana Friedenbach. Para isso, disse à jovem que iria lhe acompanhar até a rodoviária, porque queria libertá-la. 

No trajeto pelo matagal, Champinha, se utilizando de uma faca peixeira, desferiu inúmeros golpes no pescoço, tórax e costas da vítima. O adolescente deixou o local quando teve a certeza de que Liana estava sem vida.

Os corpos de Liana Friedenbach e de Felipe Caffé só foram encontrados pela polícia no dia 10 de novembro de 2003.

No dia 14 de novembro de 2003, Pernambuco, Antônio Caetano, Antônio Matias e Agnaldo Pires foram presos. Champinha, por contar com 16 anos, foi apreendido e encaminhado ao local destinado a jovens infratores.

O Brasil se chocava com a brutalidade do crime e a forma branda que Champinha poderia ser punido, haja vista que, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente, o máximo que poderia acontecer seria ficar internado por três anos. Será que a sociedade se contentaria com essa punição? Foi a partir de então que as discussões acerca da redução da maioridade penal se intensificaram.

AS VÍTIMAS

Liana Bei Friedenbach, nasceu em São Paulo no dia 6 de maio de 1987, pertencia a uma família de classe média alta. Faleceu em 5 de novembro de 2003, em Juquitiba, aos 16 anos, vítima de um assassinato.

Felipe Silva Caffé, nasceu em São Paulo no dia 1 de julho de 1984, pertencia a uma família de classe média. Faleceu em 2 de novembro de 2003, aos 19 anos, vítima de um assassinato.

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O local onde o corpo de Liana foi encontrado (Crédito: Juca Varella / Folha Imagem )

O casal se conheceu na escola e os jovens logo se apaixonaram. Por volta de dois meses de namoro, resolveram viajar, contexto em que foram vítimas de sequestro, sendo, logo em seguida, executados. Liana foi estuprada todos os dias em que a mantiveram no cárcere privado, por vários homens que compunham o grupo de criminosos.

Apesar de terem sido executados em um mesmo contexto, as mortes não ocorreram simultaneamente, haja vista que Felipe fora logo executado, mas Liana Friedenbach ainda permaneceu em poder dos criminosos por mais três dias, de muito sofrimento.

O JULGAMENTO

Em 2006, três dos envolvidos foram julgados pelo Tribunal do Júri e condenados.

Antônio Matias foi condenado a 6 anos de reclusão e 1 ano 9 meses e 15 dias de detenção pelos crimes de cárcere privado, favorecimento pessoal e por ter ocultado da arma do crime.

Agnaldo Pires foi condenado a 47 anos e três meses de reclusão pelo estupro de Liana Friedenbach.

Antônio Caetano foi condenado a 124 anos de reclusão pelos vários estupros que cometeu contra Liana.

Em novembro de 2007, Pernambuco foi levado a Júri e condenado a 110 anos e 18 dias de reclusão por ter cometido homicídio qualificado, estupro e cárcere privado.

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Antônio Caitano Silva, Agnaldo Pires, Paulo César da Silva e Antônio Matias de Barros (Crédito: Gustavo Roth / Folhapress)

Champinha, por se tratar de inimputável pela menoridade na época dos fatos, foi direcionado a julgamento pela Vara da Infância e Juventude e não ao Tribunal do Júri. Fora aplicada medida socioeducativa de três anos de internação, tempo máximo admitido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

Após o cumprimento da medida socioeducativa, não havendo possibilidade de impor outra medida punitiva de caráter penal a Champinha, vez que em no ordenamento jurídico vigora o preceito de que ninguém poderá ser punido mais de uma vez pelo mesmo fato criminoso, a saída que o Ministério Público achou para que ele não saísse da esfera de vigilância do Estado, foi pedir a interdição civil. O pedido fora aceito, pois vinha acompanhado de laudo médico constatando a inaptidão de Champinha ao convívio social.

Assim, até os dias de hoje Champinha vive na Fundação Experimental de Saúde, não mais cumprindo medida socioeducativa ou pena (sanção penal), mas sim em decorrência de interdição civil, por não ser apto a conviver em sociedade sem que seja considerado um risco.

O CASO E AS DISCUSSÕES ACERCA DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

Como já mencionado, o caso Liana Friedenbach e Felipe Caffé despertou inúmeras discussões sobre a redução ou não da maioridade penal para 16 anos.

Os que são a favor da redução apontam como argumentos:

  • Indivíduos de 16 anos já têm o pleno discernimento para responder por seus atos. Ora, se já podem exercer sua cidadania através do voto, de modo que o destino da nação já está sob sua responsabilidade, como não poderiam responder por atos criminosos?;
  • 87% da população é a favor da redução. Se o Estado é democrático, por que não levar em consideração a opinião da maioria?;
  • Sabendo de sua eventual sanção branda, estabelecida pelo ECA, para punir o cometimento de crimes por menores de idade, os adolescentes sentiriam maior vontade de cometer crimes;
  • Nos países desenvolvidos, a maioridade penal é abaixo de 18 anos;
  • As medidas socioeducativas do ECA são muito brandas.

Os que são contra a redução apontam como argumentos:

  • Investir em educação é o remédio para reduzir a criminalidade. Ao invés de investir na construção de presídios para alocação desses indivíduos, por que não educá-los?;
  • O sistema carcerário brasileiro é deficiente e não contribui para a ressocialização do indivíduo; ao contrário, o índice de reincidência é alto;
  • Contribuiria ainda mais para a crise do sistema carcerário que o país já vive, dada a superlotação dos presídios;
  • Estudos de psicologia comprovam que a adolescência é fase de transição e maturação, razão pela qual não se pode dizer que um adolescente possui discernimento na mesma proporção que um adulto;
  • A tendência mundial tem sido estabelecer a maioridade penal em 18 anos. É essa a idade em 61% dos países do mundo;
  • O art. 228, CF, expressamente declara a inimputabilidade dos menores de idade;
  • Majoração das penas previstas no ECA.

Desta forma, é possível notar que há argumentos tanto para redução da maioridade penal quanto para sua manutenção em 18 anos. E você, amigo leitor, qual sua opinião sobre o tema?


REFERÊNCIAS

Caso Liana Friedenbach e Felipe Caffé – História completa. Disponível aqui.

Caso Liana Friedenbach, um dos mais bárbaros da história do País, completa dez anos. Disponível aqui.

Caso Liana Friedenbach e Felipe Caffé. Disponível aqui.

O matador adolescente Champinha e o crime que chocou o Brasil. Disponível aqui.


Para ler mais textos da coluna CRIMES QUE CHOCARAM O MUNDO, clique aqui.

Lana Weruska Silva Castro

Pós-graduanda em Ciências Criminais.

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