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Matar alguém

O tipo penal imperativo (e não exatamente proibitivo) carrega sanção implacável em números bem definidos (embora sua dosagem seja extremamente subjetiva, ainda que a ciência jurídica pretenda a todo tempo carregar definições e critérios de aferição). Temos, no entanto, uma discordância para o comando e a sanção. Pois matar alguém envolve um sem número de possibilidades não só de interpretação do fato (além da norma e do valor, para usar apenas a tridimensionalidade), como da aplicabilidade do fato (e da norma e do valor) ao discurso penal envolto pela própria norma jurídica.

Isso porque matar alguém jamais poderia ser lido de modo objetivo, como quer a regra do art. 121 caput do CP. Matar alguém sempre e sempre traz consigo um grau qualquer de explicação, de justificativa, de exculpação, de eventual excludente ou desclassificação, ou mesmo de agravante e de qualificadora.

Assim, pode-se matar alguém com explícita intenção (todos os elementos componentes do dolo), ou sem intenção – a movimento de negligência, imperícia e/ou imprudência.

Todos os requisitos do homicídio culposo são bem estudados pela ciência jurídica, e conhecidíssimos dos/as leitores/as. Igualmente quanto à sanção respectiva.

Já no homicídio doloso, além do “simples” (cuja nomenclatura sempre soa tão estranha – haveria possibilidade de um homicídio “simples”?), muitos são os aspectos que o qualificam. Estão, como também sabido pelos/as leitores/as, no §2º do notório artigo. É certo que a pena (sanção) também se eleva.

Não bastasse estarmos, desde logo, diante de três critérios de pena – culposo, simples e qualificado –, ainda há o entendimento da diminuição de pena, pelo privilégio (relevante valor moral ou social, violenta emoção após injusta provocação).

Um terço a menos na pena mínima do homicídio simples revela impacto importantíssimo quanto ao regime de cumprimento de pena, por exemplo.

Ou seja: o ordenamento jurídico brasileiro vislumbra homicídio culposo, homicídio simples, homicídio privilegiado, homicídio qualificado.

Não são atos igualados! Matar alguém mediante ato imprudente difere de matar alguém desde que tomado por violenta emoção. Difere de matar alguém à emboscada ou por motivo torpe. Matar alguém por relevante valor moral ou por negligência ou mediante meio cruel ou com perigo comum difere de… matar alguém.

É por essa razão que o comando matar alguém não pode vir separado de alguma – qualquer que seja – contextualização. O tipo “seco” imperativo do art. 121 caput (e respectiva sanção) parece um erro.

Se no famigerado homicídio “simples” a intenção do legislador é atingir única e exclusivamente o dolo, a fim de diferenciar essa intenção da culpa, do privilégio ou das qualificadoras, talvez a melhor redação possa ser:

Matar alguém, intencionalmente, excluídos portanto os critérios da culpa e do privilégio, e sem que esteja(m) presente(s) qualificadora(s) para o crime:

Pena: x. (temos as “nossas questões” quanto à pena de prisão, mas isso fica para outro texto).

André Peixoto de Souza

Doutor em Direito. Professor. Advogado.

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