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Analisando as microexpressões faciais no contexto criminal

Analisando as microexpressões faciais no contexto criminal

Por muito tempo, filmes, livros, séries e histórias retrataram a detecção de mentira como uma habilidade sobrenatural ou algo provindo de extrema tecnologia. Mas na realidade sabemos que nem a leitura de mentes do professor Xavier e nem os polígrafos dos romances policiais existem como são apresentados. Como é feita então a detecção de mentiras? Seja nas vítimas, nos interrogatórios, ou até mesmo no dia a dia?

Paul Ekman e as microexpressões faciais

Uma ferramenta que o Behaviorismo nos proporcionou nas últimas décadas, graças aos trabalhos do professor Paul Ekman, foi a análise de microexpressões faciais. Muito mais eficaz que os polígrafos e mais real que a telepatia. Com seu estudo, Ekman revolucionou de uma vez por todas a ciência por trás da expressão das emoções e da detecção de mentiras.

Inspirado nos trabalhos de Charles Darwin, que além de “A origem das Espécies” também publicou “A expressão das emoções nos homens e nos animais”, o professor buscou estudar como as diferentes emoções apareciam na face humana, como se manifestavam tristeza, raiva, alegria, etc…

Claro que nesse momento você, leitor, deve estar se perguntando, “mas isso não é influenciado pela cultura, pela educação?”. E claro que ele também se perguntou isso, portanto, foi estudar a expressão das emoções em uma tribo africana sem contato com a civilização, e constatou o que hoje a neurociência confirma: algumas emoções são expressadas de forma universal; não dependem de educação, cultura, nem mesmo de sua visão.

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Uma pessoa que nasceu cega terá as mesmas microexpressões de alguém que nasceu com a visão (Crédito: Paul Ekman)

E por que insisto tanto que é mais eficaz que o polígrafo ou qualquer outra técnica de detecção de mentiras? Por um motivo simples: todos os outros são baseados em ansiedade, agitação.

O polígrafo costuma medir a frequência cardíaca (FC), a alteração de temperatura nos tecidos periféricos e a sudorese. Se você já teve ansiedade em algum momento na vida sabe que isso são sinais comuns. Aliás, ninguém se sente completamente confortável em um interrogatório e é por isso que para o polígrafo é como se a pessoa estivesse quase sempre mentindo.

Por outro lado, como já vimos, as expressões faciais são universais e impossíveis de esconder. Por mais que a pessoa se esforce, pode acabar deixando outros sinais mostrando seu verdadeiro estado.

Microexpressões faciais e FACS

Ekman mapeou a face humana e criou o FACS (Facial Action Coding System) que delimita as AU’s (Unidades de Ação) referentes a cada emoção sentida. Essas emoções podem ser captadas por alguém com treinamento para isso, como temos no Brasil o professor Wanderson Castilho, ou através de softwares que reconhecem e quantificam as diferentes emoções.

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Ekman mapeou a face humana e criou o FACS (Crédito: Paul Ekman)

De uma maneira ou de outra, ao saber a emoção sentida pelo interrogado, as perguntas podem tomar diferentes rumos e as respostas podem se tornar mais claras.

Em vez de perguntar se “você matou Judite?” e ter a ansiedade como uma resposta clara e completamente inconclusiva, pode ser perguntado “qual sua opinião quanto a Judite?” e ter como resposta raiva, empatia ou neutralidade, o que dá pistas bem mais claras e precisas de como conduzir o interrogatório.


REFERÊNCIAS

Ekman, P. (1972). Universals and cultural differences in facial expressions of emotion. In J. Cole (Ed.), Nebraska symposium on motivation, 1971. Lincoln: University of Nebraska Press, pp. 207–283.

Ekman, P. (1985). Telling lies: Clues to deceit in the marketplace, marriage, and politics. New York: W. W. Norton.

Ekman, P. (1989). The argument and evidence about universals in facial expressions of emotion. In H. Wagner & A. Manstead (Eds.), Handbook of social psychophysiology (pp. 143– 164). Chichester: John Wiley.

Ekman, P. (1992). Telling lies: Clues to deceit in the marketplace, marriage, and politics. (2nd ed.) New York: W. W. Norton.

Darwin, C. R. 1872. The expression of the emotions in man and animals. London: John Murray. 1st edition.

Castilho, W. (2016). Mentira: Um rosto de muitas faces.

Gabriel Dionisio G. Mata

Especialista em microexpressões faciais pelo Paul Ekman Group (PEG) e hipnólogo pelo Instituto de Hipnose e Programação Neurolinguística (IHPNL). Graduando em medicina pela Universidade Estadual de Londrina (UEL).

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