Mídia sensacionalista no processo criminal
Uma das mais relevantes problemáticas enfrentadas pelo “processo criminal” é a sua midiatização, especialmente quando encontra interlocutores diretos e supostamente (ou sedizentes) comprometidos com os interesses da sociedade.
No homicídio, por exemplo, a condução de inquéritos ou ações (por delegados, promotores, advogados e magistrados) deveria merecer tamanha isenção e discrição de tal maneira a preservar absolutamente todas as possibilidades de garantia ao indiciado/acusado, até o seu término! Do contrário, aquele julgamento prévio – que passa a circular nas ruas, nos bares, nas escolas, nas salas de jantar – é muito capaz de impregnar por completo a mentalidade daqueles sete cidadãos que sentarão no Tribunal, por ocasião do julgamento.
As inverdades “vazadas” por autoridades e partícipes do caso à “mídia” (normalmente sensacionalista, que vive de sangue e, nos intervalos, da venda de colchões, cápsulas de emagrecimento e dentaduras), formam mentalidade! Formam opiniões que… julgam! Essa mídia sensacionalista comete falso testemunho tanto quanto uma testemunha mentirosa, e macula o expediente do processo.
Um delegado ou um promotor que experimenta com gosto o furor da entrevista veiculada e aplaudida, um advogado que, veladamente (ou escancaradamente), se oportuniza com a entrevista para ampliar sua rede de captação de clientela, um magistrado – o que é mais raro – que se deslumbra com as câmeras na pretensão de virar herói, causa(m) o pior mal que pode resultar ao processo penal: a sujeição do indiciado/acusado e a sua rotulação preliminar, a sua estigmatização, marca indelével difícil, senão impossível, de ser apagada, e absolutamente contrária às garantias fundamentais para as quais tanto lutamos e prosseguimos na luta.
Muitas vezes a mentira ou o exagero hermenêutico (as versões) – propagada(o) pela mídia, pela sociedade ou pelas autoridades do processo – formam aquele pré-julgamento útil até mesmo ao ato autoritário de prender e manter preso o [suposto] autor. Nesses casos, é cada vez mais comum, nos Tribunais brasileiros, uma espécie de repetição de decisões pretéritas que seguem insistentemente a falsa premissa originária, adotando-a como “verdade” (ou, o que é pior, como “verdade real”).
E aqui, o desserviço programado pela mídia sensacionalista vendedora de colchões e dentaduras é irresponsável ao ponto de simplesmente esquecer o assunto tão logo outro “crime” desponte nas ruas da cidade e no imaginário popular. O Tribunal repetiu a mentira midiática, esta retirou qualquer responsabilidade sobre os fatos, mas o Tribunal pode seguir repetindo ad infinitum a mentira midiática, adotando-a como (ou convertendo-a em) VERDADE.
Erro ou má-fé? Responsabilidade jornalística ou interesse financeiro? Senso de justiça ou comodismo? Seja como for, e onde for, os atores coadjuvantes da pretensa justiça – autoridades, mídia, sociedade – não têm olhado para o único ator principal que ainda resta nessa cena, e de cujas vontades e esforços depende o seu destino.