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Motivações do homicídio

Motivações do homicídio

Os crimes dolosos contra a vida possuem, a rigor, três motivações, normalmente excludentes entre si: as paixões, o dinheiro e os distúrbios mentais. Não inserimos aqui a letalidade policial, porquanto, em regra, alicerçada no estado de legítima defesa ou estrito cumprimento do dever legal (“confronto armado” como excludente de ilicitude).

Não inserimos, igualmente, o morticínio em guerra, porque fenômeno extremamente peculiar: a intenção de matar advém de uma outra racionalidade distinta de um dolo específico, e é determinada por um comando de Estado.

O mesmo vale para a execução de pena de morte: é o Estado que dá a ordem do morticínio; não há dolo, no sentido estrito utilizado para caracterizar homicídio em nosso ordenamento.

Também não inserimos o homicídio ocorrido em trânsito, que é, a rigor, homicídio culposo. Vale o debate sobre os limites entre a culpa consciente e o dolo eventual, porém, assumir o risco de matar (homicídio por dolo eventual) não se equipara à transparente intenção de matar (homicídio doloso).

Aliás, as mortes em trânsito entram em outra classificação do CID, que não os homicídios: enquanto estes figuram no item “iii” – agressões – do CID-10 (X85-Y09), as mortes no trânsito (de qualquer natureza) figuram no item “i” do mesmo catálogo – acidentes (V01-X59).

Sendo assim, e retomando as motivações tripartites, é visível na história que as paixões humanas inauguram esse fenômeno. Culturalmente, o primeiro homicídio ocorre por ira e inveja (Gn 4, 3-8).

Paixões humanas são as ocorrências no campo das emoções, um dos estados metafísicos implacavelmente inerentes à psique, possibilitadoras de anulação ou minimização da racionalidade.

No campo das paixões é possível inserir fatos como um flagrante ou o desvendamento de adultério, ciúmes, briga ou acirramento de uma discussão, um ato de desespero ou descontrole emocional… e normalmente o ato criminoso cometido por uma emoção incontrolável acaba recebendo alguma benesse punitiva, como é o caso do conceito de privilégio no homicídio (desde que a ação por emoção incontrolável seja uma resposta a atual e injusta agressão da vítima).

O dinheiro, força motriz do crime de homicídio, atualmente aumenta o índice dessa motivação dado um único fator: a questão das drogas.

Tudo o que gira em torno desse ponto – “guerra do tráfico”, tráfico em geral, disputa por pontos de tráfico, cobrança de inadimplemento de usuário, morte de usuário por outras razões, morte (com latrocínio) de terceiros por usuários, execução em geral, demonstração de força política nas facções, desentendimento ou desacerto interno nas facções etc. – é computado como crime decorrente da questão das drogas e, como tal, necessariamente alicerçado na motivação econômica.

Não obstante a pujança dessa razão, soma-se a isso outros elementos de natureza econômica, evidentemente mais raros, como a cobrança de dívidas, apostas, heranças, o homicídio por encomenda etc.

O terceiro fator conduz a uma discussão sobre imputabilidade penal. Embora não valha como regra, a inimputabilidade dos doentes mentais revela tendência para o sistema punitivo. Seja como for, os distúrbios mentais compreendem mais uma possível motivação (ou condução) para os crimes dolosos contra a vida.

Esse texto parece pertencer a obra maior, e merecerá alguma expansão.

André Peixoto de Souza

Doutor em Direito. Professor. Advogado.

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