O Brasil é mesmo um país de impunidade?
O Brasil é mesmo um país de impunidade?
Muito se ouve dizer que no Brasil impera a impunidade. Mas afinal, o Brasil realmente é um país de impunidade? Para responder essa pergunta é necessário refletir: sobre quem recai essa impunidade? De fato, muitos saem impunes pelos crimes cometidos. Mas, se o Brasil fosse um país que não punisse ninguém, como se explicaria a questão da superlotação presidiária?
Ocupamos o terceiro lugar no ranking de países com maior população carcerária do mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos e para a China. Temos aproximadamente 209,3 milhões de habitantes e, até 2017, tínhamos 726 mil presos. Ou seja, em média, 35% dos brasileiros eram presidiários, e o número só vem aumentando desde então.
A pergunta então: é sobre quem recai essa impunidade e por quê? Basta analisarmos com olhar crítico: cada espécie de crime costuma ter uma predominância quanto ao “tipo” de pessoa que os comete (obviamente que não há uma regra geral que diga que tipo de indivíduo comete tal crime e que sempre será dessa forma, bem como não é o intuito estabelecer estereótipos criminais).
Além disso, alguns tipos penais recebem muito mais punição do que outros, como, por exemplo, os crimes de tráfico de drogas ou roubo geram muito mais encarceramentos no nosso país do que os crimes de lavagem de dinheiro ou corrupção passiva.
E, enquanto muitos já estão presos antes mesmo da sentença condenatória, inclusive excedendo o tempo equivalente ao que seria de sua pena se condenados, “travados” na prisão provisória, outros respondem em liberdade, pagam fiança, ou nem chegam a sofrer um processo, por possuir recursos abundantes seja para a contratação de ótimos advogados, ou até mesmo – no pior dos cenários –, para subornar aqueles que deveriam fazer cumprir a lei sem parcialidade.
Não somente isso, mas é evidente que o rapaz da comunidade não irá praticar o delito de corrupção passiva, bem como um político não irá praticar um roubo à mão armada. Afinal, por que para alguns crimes não é aplicada a punição prevista em lei?
Porque são praticados por pessoas que possuem poder e dinheiro o bastante para se manterem onde estão, sem a devida punição, enquanto outros crimes são punidos de fato pois, para os detentores do poder, isso serve como meio de segregação social.
Afinal, quanto mais poder e dinheiro se tem, maiores são as chances de passar impune pelos delitos cometidos, enquanto há, ainda, aqueles que nem se quer cometeram crime algum e estão injustamente presos, sem ter condições de arcar com uma defesa digna e eficiente para tirá-los desta condição.
Existe punição no país, punição esta, aliás, que é muito pesada, onde nossos presídios estão entre os piores do mundo, onde a dignidade humana não é respeitada, onde a pena que se recebe vai muito além da restrição da liberdade… Mas, de outro lado, muitos delitos ficam impunes, as leis são aplicadas de forma “afrouxada” para alguns, deixando de serem aplicadas como deveriam, a depender de quem é o autor do crime.
Há então um desequilíbrio nítido em nosso sistema penal, pois, de um lado, muitos crimes saem impunes ou são aplicadas as leis de forma distinta de como deveriam ser porquanto foram atos cometidos por pessoas de poder e influência, e, de outro lado, há muitos crimes que são punidos e os infratores são esquecidos lá dentro, como se os presídios fossem uma espécie de “depósito de pessoas indesejadas”, distorcendo a razão de existirem tais meios coercitivos, tornando as penas muito piores e desproporcionais em relação aquilo que foi cometido em alguns casos.
Não obstante, há ainda aqueles que, devido a inúmeras circunstâncias, sejam elas erros de homônimos, corrupção, morosidade do Judiciário, etc., estão presos sem terem cometido crime algum, sem previsão de saírem disso, enquanto outros casos, cometidos por pessoas não tão poderosas também passam impune por erro, ou até mesmo descaso de quem deveria fiscalizar isso.
O Brasil é mesmo o país da impunidade?
Então, nenhuma impunidade é justa mas, quando olhamos para a dinâmica do nosso sistema prisional e da falácia que muitas vezes ocorre acerca das penas alternativas, vemos também que nenhuma pena nos moldes do nosso sistema é justa, sempre sendo mais ou menos do que deveria ser, não cumprindo o princípio da proporcionalidade, ferindo o princípio da dignidade humana, etc.
E isso tudo não se dá pela falta de leis, pois temos muitas leis e muitas delas de fato se fariam muito eficazes se realmente fossem aplicadas corretamente. O problema reside justamente na aplicação das leis. A eficácia de uma lei na sociedade depende muito de sua aplicação correta e imparcial, o que, em muitos casos, não ocorre em nosso país.
Daí a discrepância entre as leis e a realidade, entre punição e impunidade.
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