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O combate ao terrorismo na sociedade internacional

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Por Aline Michele Pedron Leves e  Pâmela Copetti Ghisleni


O terrorismo sempre esteve presente na história da humanidade. Todavia, nas últimas décadas, enquanto a sociedade internacional foi evoluindo para o estabelecimento gradativo de uma comunidade de direitos, o terrorismo tornou-se mais evidente enquanto ameaça à paz e à segurança internacional. Nesse sentido, o presente estudo se traduz em uma breve síntese acerca dos aspectos históricos, conceituais e também relativos à atuação do Tribunal Penal Internacional e da Organização das Nações Unidas no combate ao terrorismo na aldeia global.

Fato é que esse fenômeno geralmente decorre dos contrastes culturais, religiosos e políticos que permeiam a sociedade. Frente a essa nova realidade, resta saber como a comunidade internacional irá combater essa forma de violência, cujos autores são desconhecidos e alvos difusos, na busca da construção de uma paz mundial duradoura

Esses atos e atentados que a sociedade internacional tem acompanhado, notadamente a partir século XX, exigem profundas análises para que sejam encontradas as vias de construção da paz e de proteção aos direitos humanos no combate ao terrorismo internacional. Atualmente, houve uma multiplicação de conflitos não só internacionais, mas também internos, gerando situações de violência inesperadas no âmbito mundial. Inúmeras disputas religiosas se espalham por diversos cantos do globo e numerosos crimes são cometidos em nome das religiões. Neste sentido, o fanatismo e o terrorismo caminham, lado a lado, em ações que vitimam milhares de pessoas.

Em vista disso, Norberto Bobbio (2003) afirma que se encontra em evidência na comunidade internacional a existência de uma forma de violência que embora seja mais limitada é bastante cruel, qual seja, o terrorismo, a guerra dos fanáticos ou dos desesperados. A extensão desse fenômeno para os mais diversos lugares do globo nos coloca diante de algo novo, que pode ser traduzido pela não exclusividade do uso da força pública dentro dos Estados singulares.

Pode-se afirmar que o terrorismo consiste na manifestação ulterior, atual da guerra, adaptada aos novos tempos. Ou seja, é a forma pós-moderna da guerra. No entanto, o problema é ainda mais complexo e precisa ser analisado com cuidado. Esse fenômeno é, metaforicamente, a guerra pela devastação material e pelo sofrimento humano que produz. É um dos tipos de guerra possíveis, uma vez que sempre reinou entre nós. Contudo, nas palavras de Luigi Bonanate (2001), o terrorismo é a guerra de quem não pode fazer guerra, isto é, de quem não pode sob pena de ser derrotado. José Cretella Neto (2009, p. 210), procurando incluir todos os elementos que em sua concepção são fundamentais à definição de terrorismo, oferece a seguinte formulação:

“Terrorismo internacional é a atividade ilegal e intencional que consiste na ameaça ou no emprego efetivo de violência física e/ou psicológica extrema e sistemática, generalizada ou não, desenvolvida por grupos ou por indivíduos, apoiados ou não por Estados, consistindo na prática de atos de destruição de propriedades e/ou de pessoas, ou de ameaça constante de empregá-los, em uma seqüencia [sic] imprevisível de ataques dirigidos a grupos de indivíduos aleatoriamente escolhidos, perpetrados em território de Estados cujos governos foram selecionados como inimigos da causa defendida pelos autores, causando inominável sensação de insegurança aos habitantes da sociedade contra a qual são feitas as ameaças ou cometidos os atentados.”

Tal fenômeno esteve associado à Revolução Francesa, no período denominado “era do terror”, aos movimentos anarquistas de fins do século XIX e início do século XX. A preocupação com o terrorismo internacional é, todavia, algo peculiar do século XX. Independentemente da preocupação política ou jurídica em relação ao fenômeno, o estudo busca tecer uma análise crítica, relativamente aos aspectos históricos e conceituais, bem como as possíveis formas de combatê-lo diante da atuação do Tribunal Penal Internacional (TPI) e da Organização das Nações Unidas (ONU).

Relativamente ao TPI, não há tipificação específica do crime de terrorismo nas suas competências, o que causa controvérsias entre os juristas. Apontam-se como causas da sua exclusão do Estatuto de Roma, dentre outras, o fato de que a repressão dos atos terroristas já se encontra regulamentada em tratados de cooperação internacional. Além disso, apesar de suas catastróficas consequências, tal crime não foi considerado suficientemente grave a ponto de integrar o Estatuto. Para Ruiz e Almeida (2005, p. 154), outorgar competência ao Tribunal Penal Internacional para julgamento de atos definidos como terrorismo é pertinente, sobretudo em virtude do caráter de imparcialidade atribuído ao julgamento.

No que diz respeito à ONU, é importante destacar que o terrorismo é, antes de tudo, um ataque frontal aos valores inerentes à Carta das Nações Unidas. Quer dizer, ele se constitui em uma afronta aos direitos humanos, ao próprio direito internacional, à tolerância entre os povos e nações e ao sistema de solução pacífica de controvérsias (BRANT, 2005). Cretella Neto (2008, p. 728) assinala que inicialmente, o fenômeno terrorista era tratado pela organização com “injustificável simpatia e paternalismo, embora se procurasse conter a expansão do fenômeno”, postura que foi sendo progressivamente modificada, no sentido de que hoje a ONU condena totalmente as práticas terroristas sob qualquer pretexto.

Por conseguinte, diante da globalização que conferiu novos contornos à sociedade internacional contemporânea, exige-se da ONU medidas que objetivem minorar o problema do terrorismo e, nesse cenário, é evidente que uma cooperação maior entre os Estados do globo significa mais êxito na resolução desses fenômenos. Não se pode esquecer, contudo, que a ONU não está totalmente independente da influência e dos interesses das grandes potências. Vale assinalar que autores como Roberto Hanania Filho (2007, p. 125) consideram que “a ONU tem sido o principal organismo engajado no combate ao terrorismo internacional”.

Dito isso, fica claro que ambas as instituições, no âmbito de suas atribuições, têm desenvolvido um importante papel no sentido de minimizar e combater ataques terroristas. É evidente que muitos avanços ainda devem ocorrer, mas grandes conquistas já foram galgadas pelo TPI e pela ONU no que diz respeito ao combate ao fenômeno.

Diante desses breves apontamentos, é evidente que muitas controvérsias ainda envolvem o terrorismo, muito embora esse fenômeno tenha estado sempre presente na história da humanidade. Num mundo globalizado, o terrorismo ganha novos contornos, não estando mais vinculado a somente um Estado. Esse neoterrorismo caracteriza-se por ser ainda mais assustador, uma vez que além de poder introduzir-se na sociedade em qualquer momento e em qualquer lugar, seus efeitos irradiam em todo o globo, não se restringindo apenas ao local no qual ocorreram os ataques. Disso resulta que, cada vez mais, organizações e agências internacionais, lado a lado com os Estados, têm mobilizado esforços no sentido de combater os grupos terroristas.

Neste contexto, é evidente e ainda maior a exigência de uma espécie de cooperação internacional de combate ao fenômeno do terrorismo que, basicamente, está tão pouco desenvolvida tanto na teoria como na prática. É possível dizer, então, que as velhas ideias talvez não se adequam mais à realidade emergente do combate ao terrorismo. Convém, ainda, ter em mente que as causas para os atos terroristas envolvem questões subjacentes muitas vezes não tão evidentes nos ataques, como condições sociais, econômicas, religiosas e disputas políticas não resolvidas.

Isto posto, parece claro que o combate mais efetivo e justo ao terrorismo somente pode se dar a partir das normas de direito internacional, respeitando-se sempre as noções inerentes à pessoa humana. Ademais, o combate ao fenômeno exige que se compreenda a sua natureza e as suas motivações, sendo que o primeiro objetivo da guerra contra o terrorismo não consiste no ato de olhar para o ataque e retribuí-lo, mas atentar para o futuro e preveni-lo.

Portanto, é imprescindível a cooperação entre os Estados, com a colaboração de organizações e agências internacionais, tais como a Organização das Nações Unidas e o Tribunal Penal Internacional, não somente no que se refere a um consenso global de terrorismo, mas também para a adoção de políticas mais efetivas de combate ao fenômeno, com vistas à construção de uma paz mundial duradoura na sociedade internacional.


REFERÊNCIAS

BOBBIO, Norberto. O problema da guerra e as vias da paz. São Paulo: UNESP, 2003.

BONANATE, Luigi. A Guerra. São Paulo: Estação Liberdade, 2001.

CRETELLA NETO, José. Em busca da definição que o mundo hesita em elaborar: terrorismo internacional. In: BEDIN, Gilmar Antonio (Org.). Estado de direito, jurisdição universal e terrorismo: levando o direito internacional a sério. Ijuí: Ed. Unijuí, 2009, p. 123-221.

HANANIA FILHO, Roberto. O devido processo legal no congelamento de bens de terroristas: estudo das resoluções do Conselho de Segurança 1267 (1999) e 1373 (2001). In: GOMES, Eduardo; REIS, Tarcísio (Orgs.). Desafios do Direito Internacional no Século XXI. Ijuí: Ed. Unijuí, 2007, p. 123-140.

RUIZ, Fernanda; ALMEIDA, Daniel Freire e. O julgamento de atos de terrorismo pelo Tribunal Penal Internacional. Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos, Bauru, n. 44, p. 139-156, set./dez. 2005. Disponível aqui. Acesso em: 23 ago. 2015.


Aline Michele Pedron Leves – Acadêmica do Curso de Graduação em Direito da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ e Bolsista PIBIC/CNPq do Grupo de Pesquisa: Direitos Humanos, Relações Internacionais e Equidade.

Pâmela Copetti Ghisleni – Bacharel em Direito pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ.


Versão completa do texto disponível no eBook “Ciências Criminais e Direitos Humanos”, disponível aqui.

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